Meu Diário
11/05/2014 00h01
AMANTE IMAGINÁRIA

            Terá sido esse o meu erro? Ter negado na realidade um envolvimento romântico, mas permitido na imaginação? Ter desenvolvido uma amante imaginária? Mesmo que dentro da imaginação eu não criasse nenhuma perspectiva de separação da minha esposa, de acabar o meu casamento? Que nem minha esposa, nem minha “amante”, nem ninguém soubesse o que estava sucedendo? Eu poderia ter evitado criar esse mundo imaginário? Quais seriam os argumentos para eu não criar esse mundo imaginário? Eu que era acostumado a criar mundos imaginários na minha infância de menino e adolescente que cresceu sozinho, que brincava sozinho, que criava fantasias de heróis com donzelas, que lutava pela paz e desenvolvia o amor? A minha mente foi bastante adubada pelos heróis das revistas em quadrinhos, Tarzan, Zorro, Durango Kid, Batman, Superman, entre outros. Sentava sozinho na sala da casa da minha avó, com centenas de tampas de garrafas, e construía castelos, exércitos, vilões, mocinhos... E que duelavam na batalha do bem contra o mal... eu que sempre estava ao lado do bem, muitas vezes sozinho para combater muitos adversários.

            A minha mente acostumada com as fantasias de uma criança/adolescente, certamente iria tender a desenvolver uma fantasia com essa situação que mexia muito mais comigo do que as revistas em quadrinhos. Da mesma forma que eu encarnava nos heróis e procurava lutar pela justiça, pelo bem e muitas vezes pelo amor, agora eu estava motivado a imaginar uma situação na qual eu mesmo era o protagonista da história e que iria ao encontro de uma jovem carente de afeto e que precisava tanto dos meus carinhos. Eu ia ao seu encontro encarnando a fantasia desse cavaleiro do bem que iria levar afeto a uma pessoa necessitada e que ao mesmo tempo essa pessoa oferecia seus carinhos também para mim e que seriam muito bem recebidos. O encontro era realizado sem culpas, pois não havia intenção da minha parte ou da parte dela de prejudicar quem quer que fosse. A intenção era trocarmos carinhos um com o outro de forma descontraída, honesta e com toda a intimidade que nossos corpos desejassem.

            Então, esses pensamentos e sentimentos evoluíam até a interação dos corpos no ato sexual. Nesse ponto eu trazia a experiência imaginativa à realidade com o ato da masturbação. Ficava satisfeito com o prazer recebido e os pensamentos ficavam mais atenuados, eu voltava a minha vida normal. Não havia consequências disso sobre o meu comportamento com a minha esposa, continuava a lhe amar do mesmo jeito. O que acontecia é que a motivação sexual agora era dividida e o desejo por G. era muito mais intenso. Mas elas não conseguiam perceber a diferença, somente se soubesse o que estava acontecendo nos meus pensamentos é que poderiam perceber pequenas diferenças que com certeza deveriam existir, com relação a minha aproximação de G. e o distanciamento de E. Mas a nível de realidade tudo continuava bloqueado por meus princípios originais.  

            Esta era uma situação confortável para mim. Arranjei uma “amante” que nenhuma consequência tinha na minha vida social, ética e moral. Será? No campo consciencial eu não estaria cometendo um delito ético e moral? Seria realmente permitido eu pensar assim? Eu tinha direito a ter essa “amante imaginária”?

            É muito fácil dizer esquece!... Poderia mudar o pensamento para outras situações, sublimar com alguma coisa. Poderia ter entrado em algumas das muitas igrejas que frequentei e amarrar meus desejos e sentimentos ao pé de algum altar. Eu poderia me envolver mais ainda com o trabalho com a esperança de sufocar com a responsabilidade laborativa os pensamentos e sentimentos que quisessem surgir associados a esses desejos. Eu poderia ter mergulhado na poesia, nos textos literários como de fato comecei a fazer, mas não resolveu.

            O meu racional entrava em ação e dizia que eu já estava “amarrado” na vida real e ainda queria ficar “amarrado” na vida imaginária? Que tipo de ser humano era eu para viver assim amarrado? Um bruto, um animal irracional? Eu não estava pensando nesse momento? Por que não continuava a pensar para encontrar uma solução para o problema sem ter que ficar “amarrado”?

            E o meu racional continuava a trabalhar febrilmente, era como se recusasse que eu ficasse numa situação bitolada, sem liberdade de agir, preso a preconceitos que eu não aceitava ou que até não os reconhecesse como tal. Mas o meu senso de justiça era forte, mesmo que tolerasse tudo acontecer no mundo imaginário, não aceitaria que acontecesse no mundo real. Meu racional sabia disso e tinha que encontrar argumentos para justificar dentro da ética e da moral os meus desejos dentro da realidade. Mesmo que conscientemente não fosse assim que eu pensasse naquela época, que existia essa batalha dentro da minha consciência, hoje eu fazendo essa avaliação distante no tempo, acredito que tenha sido assim.

            Continuava com minha amante imaginária e ao invés de desenvolver culpa ou forma de sublimar, eu procurava os argumentos racionais, éticos e morais para trazê-la à realidade. 


Publicado por Sióstio de Lapa em 11/05/2014 às 00h01


Imagem de cabeçalho: Sergiu Bacioiu/flickr