Meu Diário
08/11/2015 00h59
A CERIMÔNIA DO ADEUS

            Este é o título de um livro interessante para o projeto de vida que desenvolvo, baseado na aplicação do Amor Incondicional dentro dos meus mais diversos relacionamentos, principalmente os afetivos. Trata da relação de Simone de Beauvoir e Jean Paul Sartre, que são considerados o casal mais bem sucedido do universo intelectual. Os dois se conheceram ainda jovens e a afinidade intelectual aliada ao desejo sexual, companheirismo e cumplicidade, os tornaram parceiros da vida toda. Sartre morreu aos 75 anos, em 1980, e Simone, seis anos depois, aos 78 anos, talvez por saudade, por viver uma vida agora sem sentido, sem a presença do seu companheiro.

            Ela escreveu “A cerimônia do adeus” para homenagear Sartre. O livro tem duas partes. Na primeira ela comenta os últimos dez anos de convívio com ele, de 1970 a 1980. Na segunda, publica de forma contínua uma série de entrevistas que fez com ele, entre o verão e o outono de 1974. A dedicatória desse livro de Simone é para aqueles “que amaram Sartre, que o amam, que o amarão”. O livro foi publicado em 1981, um ano após a morte do filósofo

            O que interessa mais nesse livro são os momentos em que Sartre fala de Deus, de genialidade, de suas mil e uma amantes, seus amigos e inimigos, da liberdade, de livros, viagens, cidades, política. A entrevista com o filósofo é uma conversa interessante até hoje, instigada pela inteligência e a profunda entrega de Simone, que faz na sua descrição, Sartre desenhar seu mundo e a maneira como ele o via, com toda sua carga de leitura e de vivência da cultura.

            “A cerimônia do adeus” vale pelo testemunho de uma mulher apaixonada, que via o amor como uma coisa burguesa e, por isso, teve de dominar e direcionar seus sentimentos de outro jeito. Mas era amor o que ela sentia. A recíproca talvez fosse verdadeira. Eles seguiam a máxima do existencialismo “se você me ama, não me ame”, com a pretensão de sempre deixar um ao outro livre.

            O pensamento de Sartre chega bem próximo do meu, porém com diferenças marcantes. Primeiro, ele teve mais sorte do que eu tive até agora. Ele encontrou uma companheira que pensava de forma equilibrada com ele, que conseguiu dominar seus sentimentos para se ajustar aos pensamentos dele. Até hoje, nenhuma das minhas diversas companheiras conseguiu essa façanha, apesar de conhecerem os meus pensamentos e tentarem se ajustar a eles.

            O segundo e o mais diferente é a forma de conceituar e praticar o amor. É como se fosse algo nocivo... “Se você me ama, não me ame”. O amor era encarado como uma coisa burguesa, uma algema que prende a liberdade. Nada mais distante do que a minha conceituação do amor, mesmo que se aproxime na qualidade da prática.

            A minha conceituação do Amor Incondicional como o protótipo mais próximo do que devemos entender como amor, se afasta do sentimento que o filósofo tinha do amor, bem mais próximo do amor romântico, aquele que é cheio de grilhões, de correntes, de armadilhas, de exclusivismo.

            Para Sartre, autor do existencialismo, sua máxima pode ser “se você me ama, não me ame”, como forma de garantir a sua liberdade, mas para mim, discípulo do Cristo e praticante do Amor Incondicional, como forma mais profunda de viver a minha existência compartilhada com o próximo, principalmente aquele próximo mais próximo, a minha máxima sempre será: “se você me ama, ame com a mesma intensidade todos aqueles que me amam”. Também assim não perco a minha liberdade.

            Comparando as duas máximas, posso ver aquela defendida por Sartre como um tipo de paradoxo: “se você me ama, não me ame”. Uma premissa anula a outra, pois se eu cumpro a segunda a primeira deixa de existir. O amor deixa de existir. O existencialismo do filósofo se torna vazio de amor. E como ele justifica ter tantas amantes? Relações sem amor? Puro instinto sexual, animal? O filósofo não se degrada tanto se assim funcionar?

            Enquanto, por outro lado, a minha premissa reforça o amor: “se você me ama, ame a quem me ama”. Se a segunda premissa se cumpre, o amor a mim dedicado se torna maior, potencializado por cada pessoa que entra nesse círculo do amor. A minha existência se torna repleta de amor, tanto dirigido a mim como dirigido a toda pessoa que por mim desenvolve amor. Não é uma forma mais rica de viver a existência?   


Publicado por Sióstio de Lapa em 08/11/2015 às 00h59


Imagem de cabeçalho: Sergiu Bacioiu/flickr