Meu Diário
01/02/2017 10h27
CAPACIDADE DE AMAR

            Percebo que uma certa afinidade moral e harmonia espiritual são essenciais à amizade entre duas pessoas. Uma personalidade amorosa dificilmente pode revelar-se a uma pessoa incapaz de amar. Como Deus é a essência do Amor e com Ele pode ser confundido, para aprimorar o meu conhecimento dEle, todos os dons da minha personalidade deve consagrar-se inteiramente a tal esforço. Uma devoção parcial, com a metade do coração, não aprimorará a minha capacidade de amar.

            Como já tenho essa percepção bem desenvolvida no meu psiquismo, ao descrever essas minhas experiências e sentimentos espirituais, não é para convencer os descrentes, mas para a edificação e satisfação mútua dos que já acreditam.

            Entendo Jesus como o Mestre que o Pai nos enviou para falar sobre Ele, nos ensinar sobre o Amor no qual Ele é a essência. Jesus é o exemplo superior que possuímos dessa capacidade de amar. Nos ensinou que a natureza do Pai pode ser estudada pela revelação das ideias superiores, que o caráter divino é uma representação dos ideais superiores. A própria vida encarnada de Jesus serve como a própria base de revelação de Deus para os homens. Assim, ele nos ensinou que podemos expressar a nossa capacidade de amar por ações caridosas, por símbolos verbais em qualquer tipo de idioma a respeito da natureza divina

            Jesus ensinou que o Pai celestial, cuja fagulha de luz reside em nós, Seus filhos, não é uma personalidade agressiva e vingativa como aparece no Velho Testamento, com o codinome de Deus dos Exércitos. Ele também não requer um mediador, padre, pastor ou qualquer tipo de mentor, para assegurar o seu favorecimento ou o perdão de Pai.

            Este Deus que Jesus ensinou e no qual acredito, não é irado, vingativo ou enraivecido. Porém, por respeito à Justiça, o Seu amor pela retidão não pode evitar que com a mesma intensidade, seja manifestado como ódio ao pecado. Pode parecer uma incoerência, este Deus que acredito ser capaz de amar e odiar, sentimentos contraditórios. É necessário que eu me explique. Deus ama a toda a sua criação, porém deixou um espaço nos seres inteligentes, como nós, humanos, onde Ele decidiu não penetrar. Este espaço cognitivo é o Livre Arbítrio, associado à consciência e instrumentalizado pela vontade. É neste espaço que podemos ser co-criadores com o Pai, que podemos escolher os caminhos por onde seguir, dentre as diversas opções que tenho ao meu alcance. Se por ignorância ou má vontade, escolho seguir caminhos errados, se construo contra as leis da Natureza, do Amor Incondicional, esses erros serão chamados de pecados e não podem ser amados como é amado o que é correto, o que obedece a Lei do Amor. Então, é correto que o Criador tenha um sentimento de ódio por essa ação negativa, nefasta, produzida por sua criatura. Mas isso não quer dizer que Ele passe a odiar a Sua criatura. Ele faz isso com perfeição, ama incondicionalmente a sua criatura, mas odeia o pecado. Ama o pecador, mas odeia o pecado.

            Acontece algo parecido na minha capacidade de amar, na atuação enquanto médico. Trabalho com dependência química e tenho que fazer essa mesma distinção: amar ao alcoólico e odiar ao alcoolismo. O alcoólico por repetidos erros na sua forma de usar as bebidas alcoólicas, termina por se tornar um dependente, um alcoólico. Caso ele não use a bebida alcoólica, a doença do alcoolismo não se manifesta. Então, tenho que usar toda a minha capacidade de amar para conversar com esse alcoólico enquanto sóbrio, para fazer com que sua consciência aceite os argumentos da verdade e evite o primeiro gole, conforme orienta os grupos de Alcoólicos Anônimos. Mas se a pessoa sofre recaída e se apresenta alcoolizada, sob o domínio da doença, então tenho que agir com o máximo rigor contra esse resultado (erro, pecado) que foi criado. Não é que eu esteja atuando com ódio contra o alcoólico, quando oriento aos familiares a não dar nenhum apoio ao seu parente quando este estiver embriagado, que ele sofra as consequências dos seus atos, quer seja na higiene, no trabalho, na justiça. Somente dessa forma, as consequências dos seus atos podem despertá-lo para o erro que está cometendo, uma vez que a minha orientação não seja suficiente.  

            Dentro dessa conjuntura da capacidade de amar, posso dizer que: Deus ama o pecador e odeia o pecado; eu, amo o alcoólico, mas odeio o alcoolismo. O pecado/alcoolismo não é uma pessoa. O amor salva a pessoa; a lei destrói o pecado.

            Mas, se o pecador se identifica completamente com o pecado, tornar-se-ia inteiramente não espiritual na sua natureza humana e caminharia para a sua extinção, incapaz de ser alcançado por minha capacidade de amar enquanto terapeuta.  


Publicado por Sióstio de Lapa em 01/02/2017 às 10h27


Imagem de cabeçalho: Sergiu Bacioiu/flickr