Meu Diário
04/02/2017 03h53
MINISTRO GERAL DA ORDEM

            Nas compilações e florilégios/Compilação de Assis, “Fontes Franciscanas e Clarianas” observei um diálogo, perto do fim da vida encarnada de Francisco de Assis, quando um dos irmãos chega perto dele e faz a seguinte indagação, que gera a explicação sobre quem deverá ser o Ministro Geral da Ordem, na ausência do santo:

            - Pai, tu passarás, e a família que te seguiu ficará abandonada no vale de lágrimas. Indica alguém, se o conheces na Ordem, em quem teu espírito repouse. Ao qual se possa impor com segurança o peso do ministério geral.

            Respondeu São Francisco, revestindo todas as palavras em suspiros:

            - Filho, não vejo ninguém suficientemente capaz de ser comandante de tão variado exército e pastor de tão amplo rebanho. Mas quero descrever para vós um que reluza, como deva ser o pai desta família.

            Disse:

            - Ele deve ser um homem de vida muito austera, de grande discernimento, de reputação louvável. Homem que não tenha amizades particulares para que não cause escândalo ao todo, por amar mais uma parte. Homem que tenha por amigo o empenho da santa oração, que distribua horas certas à sua alma e outras ao rebanho que lhe foi confiado. Pois, bem de manhã, deve colocar antes de tudo os mistérios da missa e com grande devoção recomendar-se a si mesmo e o rebanho à proteção divina. E depois da oração – disse -, coloque-se em público para ser investigado por todos, para responder a todos, para prover a todos com mansidão. Homem que, por preferência de pessoas, não faça a sórdida discriminação, diante de quem não vigore menos o cuidado dos menores e simples do que dos sábios e maiores. Homem que, se lhe foi concedido sobressair pelo dom das letras, traga em seus costumes mais a imagem da piedosa simplicidade e fomente a virtude. Homem que execre o dinheiro, principal corruptor de nossa profissão e perfeição, e que, como cabeça de nossa religião, oferecendo-se aos outros para ser imitado, nunca abuse de bolsa alguma.

            - Deveriam ser-lhe suficientes, para si próprio – disse – o hábito e o caderno, e para os irmãos o estojo de penas e o selo. Não seja ele acumulador de livros nem muito dedicado à leitura, para que não subtraia do ofício o que fornece ao estudo. Homem que console os aflitos, pois que é o último refúgio para os atribulados, para que, se junto dele faltarem os remédios da saúde, não prevaleça nos enfermos a doença do desespero. A fim de dobrar os violentos à mansidão, prosterne-se e modere alguma coisa do seu direito, para lucrar a alma para Cristo. Não feche as entranhas da piedade aos que fugiram da Ordem, - como as ovelhas que pereceram -, sabendo que muito fortes são as tentações que podem impelir a grande queda.

            - Eu gostaria que ele fosse honrado por todos no lugar de Cristo e que fosse provido em tudo com toda a benevolência de Cristo. Mas é necessário que ele não sorria para as honras nem se deleite mais com os favores do que com as injúrias. Se alguma vez precisar de alimento mais forte, tomá-lo-á não às escondidas, mas em lugares públicos, para que os outros possam suportar a vergonha de cuidar de seus corpos fracos; compete-lhe principalmente distinguir as consciências que se escondem e extrair a verdade de veias ocultas, de forma alguma prejudique o aspecto viril da justiça e sinta que tão grande ofício lhe causará mais peso do que honra. E de supérflua mansidão não nasça a moleza, nem de indulgência relaxada a dissolução da disciplina, de modo que seja amado por todos e não menos temido por aqueles que fazem o mal.

            - Eu gostaria que ele tivesse companheiros dotados de honestidade, os quais se apresentassem a si mesmos – juntamente com ele – como exemplo de todas as boas obras; que fossem inflexíveis diante das angústias, e tão convenientemente afáveis, que acolhessem com santa jovialidade a todos os que chegassem. Eis – disse – como deveria ser o Ministro Geral da Ordem.  

Esta declaração de Francisco calou fundo em minha consciência. Assim como ele, eu também tenho a intenção de criar uma família obedecendo a vontade de Deus. Não é semelhante a que ele criou, pois no caso dele, foi a partir do casamento dele com a senhora Pobreza que tudo começou. No meu caso o casamento se deu com o Senhor Amor Incondicional. As característica que ele descreveu, foi em cima do comportamento que ele procurava cumprir, e acredito que ele desenvolveu muito bem suas responsabilidades, mas não via ninguém ao seu redor que fosse capaz de levar adiante essas mesmas atitudes. Eu, particularmente, me considero ainda muito distante de alguns itens e isso me torna um “pastor” ainda muito imperfeito, para as “ovelhas” que giram em torno de mim. Pretendo fazer as correções e considero todas importantes, mas sei que a maior dificuldade que irei encontrar será na acumulação de livros, pois ainda dou grande importância a esse fato, ao estudo sequencial.

Sei que a transformação de Francisco de Assis foi quase de imediata, passou pelo sofrimento da cadeia dentro e fora de casa e por doença física demorada. Tudo isso contribuiu para sua emersão do mundo egoísta para o mundo espiritual. No meu caso a transformação é muito lenta. Há mais de três décadas essa transformação vem lentamente ocorrendo e junto com muitos erros de decisão. Sei que o Pai tolera, pois sabe de minhas dificuldades e de minhas intenções. Essa descrição de como deverá ser um Ministro Geral de uma Ordem Familiar, ajudou-me a diagnosticar com mais segurança os principais erros que devo ajustar. Depende agora da minha atenção e força de vontade. Também, se chegasse a desaparecer hoje, não saberia nem a quem dizer tais características para manter a família nos propósitos do Pai.


Publicado por Sióstio de Lapa em 04/02/2017 às 03h53


Imagem de cabeçalho: Sergiu Bacioiu/flickr