Os fariseus vieram perguntar a Jesus para pô-lo à prova: “É permitido a um homem rejeitar sua mulher por um motivo qualquer?” Respondeu-lhes Jesus: “Não lestes que o Criador, no começo, fez o homem e a mulher e disse: por isso o homem deixará seu pai e sua mãe e se unirá à sua mulher; e os dois formarão uma só carne? Assim já não são dois, mas uma só carne. Portanto, não separe o homem o que Deus uniu.” Disseram-lhe eles: “Por que, então, Moisés ordenou dar um documento de divórcio à mulher, ao rejeitá-la?” Jesus respondeu-lhes: “É por causa da dureza de vossos corações que Moisés havia tolerado o repúdio das mulheres; mas no começo não foi assim. Ora, eu vos declaro que todo aquele que rejeita a sua mulher, exceto no caso de matrimônio falso, e desposa outra, comete adultério. E aquele que desposa uma mulher rejeitada, comete também adultério.” Seus discípulos disseram-lhe: “Se tal é a condição do homem a respeito da mulher, é melhor não se casar!” Respondeu Ele: “Nem todos são capazes de compreender o sentido dessa palavra, mas somente àqueles a quem foi dado. Porque há eunucos que o são desde o ventre de suas mães, há eunucos tornados tais pelas mãos dos homens e há eunucos que a si mesmo se fizeram eunucos por amor ao Reino dos Céus. Quem puder compreender, compreenda.”
Esse ensinamento de Jesus é para mim de grande profundidade e que Ele não tinha como explicar tudo, pela mentalidade da época. A questão do homem se unir e formar com a mulher uma só carne, que já não são dois, mas uma só carne, que não deve separar o homem o que Deus assim uniu, é emblemático para a formação da família universal e consequentemente, da construção do Reino de Deus! Porém deve ser quebrado os preconceitos que vigora na sociedade em torno da família nuclear.
Quando o homem e a mulher se atraem mutuamente seguindo as leis da Natureza através dos instintos biológicos, e chegam a intimidade sexual, formam assim uma só carne durante a explosão transformadora do orgasmo. Tudo isso segue a lei de Deus escrita na Natureza. O homem tornado uno com a mulher com a qual fez a injunção carnal, pode voltar a se sentir atraído da mesma maneira por outra mulher, assim como a mulher por outro homem. Caso não haja nenhum impedimento ético que leve prejuízo a uma das partes, nova relação sexual pode ser viabilizada com no parceiro(a). A outra que ficou de fora desse novo envolvimento, não deve ficar desolada e com sentimento de abandono, pois esse não é o caso. Deve, sim, se sentir feliz por saber que o seu companheiro, carne de sua carne, encontrou nova forma de satisfação, de se sentir feliz. Dessa forma a família perde sua característica de nuclearidade, de exclusividade, de ciúme e se amplia cada vez mais no sentido da família universal, da construção do Reino de Deus. Cada um dos parceiros tem certeza que jamais será abandonada pelo seu parceiro original, pelo contrário, se sentirá cada vez mais fortalecida, pois cada nova parceira que seu companheiro arranja, é uma irmã que ela adquire e que todos poderão funcionar na base da mútua ajuda, do lema dos mosqueteiros: um por todos e todos por um.
Jesus ensinava que “Se teu irmão tiver pecado contra ti, vai e repreende-o entre ti e ele somente; se te ouvir, terás ganho o teu irmão. Se não te escutar, toma contigo uma ou duas pessoas, a fim de que toda a questão se resolva pela decisão de duas ou três testemunhas. Se recusa ouvi-los, dize-o a Igreja. E se recusar ouvir também a Igreja, seja ele para ti como um pagão e um publicano. Em verdade vos digo: tudo que ligardes sobre a terra será ligado no céu, e tudo o que desligardes sobre a terra será também desligado no céu. Digo-vos ainda isto: se dois de vós se unirem sobre a terra para pedir, seja o que for, o conseguirão de meu Pai que está nos céus. Porque onde dois ou três estão reunidos em meu nome, aí estou eu no meio deles.”
Essa lição mostra que somos responsáveis uns pelos outros, com o cuidado que devemos ter em advertir em particular quando algo não foi feito correto. Mas essa lição é muito difícil para mim. A tendência que sinto é de ficar afastado quando percebo que pecam contra mim. Fico no silêncio, mas a minha alma vai se distanciando...
Jesus deixa bem claro que não é assim que devo proceder. Se o irmão pecar contra mim, devo repreendê-lo em particular. Esse primeiro passo eu tenho que aprender, talvez eu tenha que dividir essa lição com mais alguém, mostrando minha deficiência e ressaltando que estou conversando assim para o aprendizado mútuo.
Por exemplo, no trabalho da comunidade da Praia do Meio, falei com o pipoqueiro que trabalha em frente do Shopping do Artesanato para ele se engajar em nossas atividades. Citei as pessoas que estavam a frente desse trabalho, e para a minha surpresa, a pessoa mais envolvida no trabalho e mais espiritualizada, foi acusada de ser prepotente e autoritário. Percebi assim, que de acordo com esse relato, o meu companheiro da Associação de Moradores cometeu um pecado contra esse senhor. De acordo com a lição evangélica, o pipoqueiro era quem devia chamar meu amigo para uma conversa em particular e repreendê-lo. Mas acredito que ele não tenha condições para isso, pois ele acredita que o outro é prepotente e ainda por cima tem um cargo público de mais relevância na hierarquia social. Meu companheiro da Associação talvez não tenha a percepção de ter cometido um pecado contra ele, pois segundo a história, ele estava procurando fazer o bem para a coletividade, mesmo que prejudicasse o pipoqueiro em suas necessidades individuais. O fato é que ambos estavam afastados, apesar de serem pessoas do bem e que procuram viver ajustados às regras sociais.
O meu papel enquanto orientador e coordenador deste grupo de trabalho de orientação cristã que estamos fazendo na comunidade, era de levantar o problema em particular com o meu amigo e mostrar o que diz a lição evangélica. Por eu ter essa dificuldade também, coloquei isso no silêncio, sabendo que existe um conflito reprimido que impede a vivência da fraternidade.
Agora, ao ler essa lição, eu fico de frente ao Mestre e percebo seus olhos serenos sobre a minha vergonha. Como eu posso assumir um papel de destaque num trabalho que tem a Sua inspiração, se não consigo praticar, nem mesmo orientar uma lição tão básica? Decidi! Mesmo sem coragem de olhar nos olhos do Mestre, de cabeça baixa, eu disse que na primeira oportunidade que tivesse eu iria abordar essa questão com o meu amigo. Não diz respeito a pecado que eu tenha cometido com ninguém de forma direta, mas de forma indireta eu não estou fazendo a lição do Cristo, de chamar quem peca para a reflexão, ou orientar para tal.
Mesmo porque o Cristo coloca uma responsabilidade enorme em minhas mãos e nas de quem tiver coragem de praticar essas lições junto aos irmãos, que parece uma ajuda mútua: eu procuro mostrar o erro que o irmão cometeu e ao mesmo tempo fico exposto a ser apresentado para mim os meus erros. Se aplicarmos essa lição como Jesus ensinou, Ele diz que ficaremos com autoridade nos céus semelhante aquela que Ele disse que Pedro teria: “Tudo que ligardes sobre a terra será ligado no céu, e tudo o que desligardes sobre a terra será também desligado no céu.”
Fico animado para fazer isso, cumprir com essa responsabilidade de mútua ajuda com os irmãos, mesmo porque também tenho a segurança de que não estarei sozinho nesse momento, pois o Mestre disse também que: “Se dois de vós se unirem sobre a terra para pedir, seja o que for, o conseguirão de meu Pai que está nos céus. Porque onde dois ou três estão reunidos em meu nome, aí estou eu no meio deles.”
Que posso eu querer mais? Tenho a lição, tenho o Mestre ao meu lado... talvez falte a coragem e sabedoria para abordar o problema, mas isso eu posso pedir ao Pai, pois o Mestre também ensinou que eu tenho essa liberdade de pedir aquilo que necessito, pois, Ele dizia, qual é o pai que o filho pedindo um pão ele daria uma pedra?
Esta reunião do dia 14-08-14 foi iniciada pontualmente as 19h na escola Olda Marinho, com a presença das seguintes pessoas: Radha, Edinólia, Ana Paula, Nazareno, Davi, Nivaldo, Paulo Góis, Paulo, João Dantas (primeira vez à convite de Francisco), Francisco, Cíntia, Estela, Marivon e Sued (que fez apenas passar na reunião, já que estava saindo para outro compromisso).
Foi lido o relato da reunião anterior, lembrando o encaminhamento dos seguintes pontos: 1) Francisco participou da reunião do Centro de Saúde de Brasília Teimosa, junto aos preceptores e alunos e foi acolhida a ideia de trabalhos na comunidade da Praia do Meio com muito entusiasmo e a possibilidade de em curto prazo ser feito o trabalho de campo; 2) Foi comunicado o contato feito com o professor Tiago e a proposta dele comparecer na reunião de hoje, mas como devia a voltar a Brasília, já que ele é o presidente do trabalho de Médico da Família, ficou de ser feita a reunião com ele na próxima semana. 3) Justificaram ausências os colegas, Marcelo (do panfleto do bairro), Magnus (do CONEM) e Rosário (do SESC); 4) Paulo não conseguiu o contato com a diretora do colégio Olda Marinho para a devida atualização dos nossos trabalhos junto à escola.
Em seguida Cíntia acertou com Sued as necessidades para dar o início da oficina de música, da possibilidade de doação de instrumentos e ela ficou de entrar em contato com a diretora da escola para ver a questão de sala para o início dos trabalhos. Também disse que tinha entrado em contato com um adolescente e procurou ver se o trazia para a reunião e verificarmos a possibilidade de o ajudarmos.
Davi informou que existe a oferta de Carteira de Habilitação gratuita para as pessoas carentes da comunidade que tenham interesse. Também se comprometeu em fazer o projeto para escola do futebol, com número de alunos e material necessário para ser apresentado na próxima semana. Ficou também de levar o pedido de audiência com o prefeito assinado pelas pessoas que podem estar presentes e com a pauta a ser discutida.
Edinólia pegou telefones com Paulo para entrar em contato com o proprietário do Hotel Reis Magos para verificar em que estágio se encontra o projeto de reconstrução do imóvel.
Paulo voltará a ficar atento quanto o contato com a diretora da Escola Olda Marinho e procurará ver a possibilidade de intervenção num jovem da comunidade que foi preso e da possível vítima que ele prejudicou.
Stela verificará a possibilidade de ser feita visita a residência da comunitária que apresentou dificuldade com os seus filhos menores e com os parentes alcoólicos.
As 20:30h foi encerrada a reunião com todos fazendo a oração do Pai Nosso com as mãos dadas e feito a foto oficial do encontro.
O Comunitarismo é um conceito político, moral e social que surge no final do século XX (por volta das décadas de 1960 a 1980) em oposição a determinados aspectos do individualismo e em defesa dos fenômenos como a sociedade civil. Entre a queda do Comunismo russo em 1989 e o triunfo do Liberalismo anglo-americano no mundo até 2007-2008, a sociedade fica sem rumo para as suas novas esperanças. Com a necessidade de contestar o Liberalismo surge o Comunitarismo, para enriquecer o debate político no mundo pós guerra-fria.
A ideologia comunitarista não é contrária ao liberalismo, mas centra seus interesses nas comunidades e na sociedade e não no indivíduo, como o liberalismo faz. É centrada na crença que as comunidades são a base de todas as soluções para um mundo melhor e que o liberalismo não vem conferindo a importância que elas merecem, devido ao individualismo defendido pelo sistema liberal. Acredita também que o individualismo do liberalismo prejudica as análises sobre as questões de nosso tempo.
A Igreja Católica identificou no comunitarismo uma forma de valorização das ações sociais e coletivas e um meio de ação política. Já nas primeiras comunidades cristãs, narradas nas epístolas paulinas, fala-se de comunitarismo. Pouco a pouco a comunidade vai se organizando, criando uma pequena estrutura econômica de sustentação dos órfãos e viúvas. A prática da fraternidade e a colocação dos bens em comum não eram uma norma obrigatória e sim um compromisso vindo da vivência do Evangelho. Conforme o número de cristãos vai aumentando, a comunidade vai ganhando uma estrutura própria, até mesmo no sentido do governo, mas ainda não existe uma hierarquia.
João Paulo II, referindo-se ao comunitarismo dos primeiros cristãos, disse que o restauro da cobertura da Basílica dos Santos Nereu e Aquileu nas catacumbas de Domitila enriquece ulteriormente aquele patrimônio monumental que representa o testemunho mais concreto e evidente do mundo das catacumbas, onde os primeiros cristãos conceberam um sistema funerário novo, sepultando os fiéis em túmulos semelhantes, humildes e sóbrios, como símbolo da igualdade e do comunitarismo. (João Paulo II, Assembléia Plenária da Pontifícia Comissão da Arqueologia Sacra, 2001).
Toda a difusão do cristianismo reside na irradiação evangélica das comunidades cristãs, através das quais se experimenta o novo e contagioso Amor de Cristo, nas quais o Espírito dinamiza e faz sentir a experiência antecipada do Reino de Deus. As novas comunidades devem acolher a humanidade que busca um mundo novo e seu fermento é conseguir transformar a face do mundo, de planeta de provas e expiações para planeta de regeneração.
O trabalho de natureza cristã que está sendo realizado na Associação de Moradores e Amigos da Praia do Meio (AMA-PM) tenta fazer ressurgir essa prática dos primeiros cristãos e necessita que todos tenham essa compreensão: que todos são filhos de um mesmo Pai, portanto todos somos irmãos; que o Pai nos enviou o seu filho mais preparado, Jesus Cristo, para nos ensinar sobre o Amor e como construir o Reino de Deus a partir da transformação dos nossos próprios corações; que a pessoa mais importante dentro do relacionamento humano é o próximo, não importa quem seja, devemos amar como se fosse a nós; que a família biológica é importante para a evolução do mundo material onde os corpos fazem parte, mas a família espiritual é mais importante, pois através dela se processa nossa evolução em direção ao Pai.
Mas não estamos isolados, pertencemos a comunidade natalense, norte-riograndense, brasileira e certamente todos são convidados a participarem desse projeto, direto ou indiretamente.
Jesus disse aos Seus apóstolos que os estavam enviando como ovelhas no meio de lobos. Eu, como Seu discípulo, me sinto nessa condição e, portanto, devo ficar bem atento a essas lições. Ele advertia que devo ser prudente como as serpentes, mas simples como as pombas. Dizia que eu prestasse bem atenção ao comportamento humano, pois poderia ser levados aos tribunais e ser punido com as leis civis ou eclesiásticas. Advertia que eu iria ser levado por causa dos Seus ensinamentos diante de governadores, reis ou sacerdotes. Iria servir assim de testemunho para todos que não conhecem a lei do Amor, que vivem na ignorância da Verdade divina. Apesar dessa visão pessimista do futuro, Ele me deu a esperança para que eu não saia do caminho que o Pai me apontou e que decidi cumprir. Disse que quando eu fosse preso, não me preocupasse nem pela maneira com que havia de falar, nem pelo que havia de dizer: naquele momento não seria eu que falaria, mas o Espírito de nosso Pai que falaria em mim. Poderia até ser odiado por muitos por causa da aplicação das lições do Amor.
Em outro momento Jesus diz que se eu for mal recebido devido praticar as Suas lições, saia logo dessa cidade, dessa casa. E na saída sacuda o pó das suas sandálias, ou sapatos, como sinal de protesto contra essa gente.
Não quero ver nessa lição um sinal de indignação ou de “lavar as mãos”, uma isenção de qualquer responsabilidade. Quero ver nessa recomendação um apelo à tolerância. Não é fácil falar, ensinar, demonstrar e não ser ouvido ou reconhecido. É deprimente ter a experiência de sentir a indiferença, raiva ou ódio daqueles a quem dedicamos cuidado, atenção e Amor... mas acontece. Não é questão de sentir-se superior, mas de entender que nem sempre quem recebe alguma coisa nova está preparado para acolher bem a novidade. Existe quem não tenha como me receber, não porque na realidade não queira, mas porque não entende ou não confia. E preciso respeitar isto! A minha conduta é diferente para quem me vê!
Cada um tem uma imagem diferente do que sou, mesmo que eu seja uma pessoa honesta, sincera, verdadeira, única de caráter, e que me considero discípulo do Cristo e obediente à vontade que o Pai colocou na minha consciência. Mas as pessoas podem levar tempo para compreender isto... dias, meses e, até anos!
Por isso, em certos momentos, não como desaforo ou represália, mas por tolerância e amor, é preciso tirar o pó das sandálias! Dar tempo, dar espaço, respeitar!
Imagino quanta dor Jesus sentiu na cruz. Ele foi preso, espancado, xingado, cuspido, ofendido, traído, abandonado! Tinha todo o direito de se voltar ao “mundo” e dizer: “Vocês são ignorantes, não entenderam nada do que falei, do que fiz. São uns ingratos, não tem inteligência!”. Mas apesar de ter essa prerrogativa, preferiu tirar o pó das sandálias... não com arrogância, mas com generosidade e Amor, pedindo o perdão de Deus dizendo: “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem.”
De certa forma, bater esse pó é deixar a semente no chão, na esperança de que um dia nasça; é registrar que a minha tarefa foi cumprida, e não há mais nada a fazer. Espero ter a sensibilidade de sempre tirar o pó das sandálias no momento certo, antes de ser posto fora da casa que entro com sandália, pó e tudo!
Não posso correr o risco de passar da medida, insistindo com quem não tem condição de absorver mais do que pode... e quanta confusão acontecerá por isso!
Para tirar o pó na hora certa é preciso que eu tenha a segurança de está seguindo as lições do Cristo e a vontade do Pai, e do que tenho como virtudes e defeitos. Sei que o potencial humano tem os seus limites e não sou tão diferente de ninguém, que vivo na carne e sofro os seus efeitos. É preciso que eu entenda que não é na hora, mas com o tempo que as sementes do Amor nascem, as plantas crescem, as flores surgem e se formam frutos que amadurecem.
Não posso gastar sandália à toa, é preciso de vez em quando renová-la, retirar-lhe a poeira para que seja útil em outras paragens, em outro chão, com outro pó. Esta lição nunca foi tão necessária para mim, porque mais que na insistência, o crescimento e o resultado do Amor acontecem através da tolerância e do tempo.