No primeiro momento que li esta assertiva de São Francisco de Assis, fiquei meio encucado. Como é que o amor não é amado? De onde ele tirou isso? Fui ver então porque ele afirmava isso e vi que era uma conjectura, talvez mesmo uma contestação, do que aconteceu com Jesus. Ninguém que tenha conhecimento da vida de Jesus, pode contestar que a principal lição que ele estava sempre mostrando em prática e teoria era o amor. Pode assim ser considerado o embaixador do amor, que veio em nome do Pai (Deus) transmitir essa magna lição aos ignorantes nativos deste planeta. Mas, o que aconteceu a Ele? Foi derrotado numa eleição direta quanto viver ou morrer, onde concorreu com um assassino confesso e quem votou de forma aberta foi justamente a massa que Ele tanto cuidou, curou e amou. Depois dessa condenação, seguiu após ser açoitado de forma impiedosa e coroado com espinhos, por uma estrada tortuosa e íngreme, conduzindo um pesado madeiro, apupado pelos curiosos, em direção ao monte onde seria crucificado. Está muito certo São Francisco ao chegar a essa conclusão: o amor, representado pelo Cristo, não é amado pela massa humana que Ele tanto amou, e curava o corpo e a alma.
Posso dizer que passo por experiências parecidas. Considero-me um discípulo do Mestre Jesus e procuro incorporar em minha vida suas lições, principalmente a Lei do Amor. Como Ele fazia também eu procuro fazer. Amar a todos que estejam próximos, indistintamente. Vou até mais além e chego a me envolver intimamente, chego ao ponto de trocar fluidos com a pessoa que naquele momento está sendo amada. Com esse comportamento acredito ficar mais próximo do Reino de Deus, o qual Jesus ensinava nascer no nosso coração e se consolidar na comunidade, nas diversas formas de amar com inclusividade, onde todos são incluídos e não excluídos e daí viabilizar a família universal. No entanto, as pessoas mais próximas, para quem o amor é mais fortemente canalizado, dão o exemplo de que não amam o amor, expulsam com atitudes iradas de suas presenças o agente do amor, pelo simples fato do amor naquele momento não ser dirigido para elas. É uma tarefa difícil, amar tanto e saber que no fim vai ser repudiado pelo outro a quem também dedica amor, justamente devido a isso: amar!
Tenho a consciência da existência dos mundos, material e espiritual. Sei que o mundo espiritual é onde se processa a vida real, a matéria é apenas reflexo de realidade, fugaz, temporária. Passei do mundo espiritual para o mundo material com o objetivo de aprendizado, de conhecer as forças oriundas do interesse reprodutivo e saber domesticá-las de acordo com as necessidades de aprimoramento moral do espírito. Assim, sei que minha existência agora no mundo material, tem o propósito de cumprir uma determinada tarefa de interesse do espírito, cumprir uma missão.
O caminho que leva ao cumprimento da minha missão foi elaborado ao longo do tempo da minha educação, da oportunidade que tive de aprender com diversos professores, acadêmicos, técnicos, místicos, religiosos, etc. Cada um tem igual oportunidade, porém as chances de aprendizado por qualquer tipo de corrente do pensamento, varia muito de indivíduo para individuo, pois uma mesma experiência partilhada por dois indivíduos, mesmo que eles sejam gêmeos idênticos, sempre vai haver alguma perspectiva que um tem, que aprendeu, e o outro não. Isso implica que, mesmo que a pessoa tenha uma proximidade muito grande com os respectivos paradigmas de vida , sempre vai haver algum ponto destoante, por mínimo que seja.
As pessoas que tenham um mínimo de diferença de seus respectivos paradigmas, são os mais capacitados para se tornarem companheiros no jornadear da missão. Ao longo da minha vida encontrei muitas pessoas que despertavam simpatia e motivavam o aprofundamento da relação, mas logo se percebia pontos de profundas distorções com o potencial de impedir o companheirismo harmônico.
Cada vez mais vou adquirindo a consciência de que, qualquer pessoa que passe a morar comigo, ou mesmo conviver com mais intensidade, vai logo despertar esses pontos de distorção de paradigmas, o que gera conflitos, desarmonia e queda da qualidade de vida. Tenho que ter o bom senso de que, quando observar essa ocorrência, cortar de imediato o nível dessa convivência, sob pena de ver transformado o sentimento de amor que antes essa pessoa nutria por mim, por sentimentos negativos, de raiva, ressentimento, talvez até ódio. Não é isso o que deseja um caminhante do amor!
Não somos navios, não estamos navegando em alto mar, não estamos submetidos aos vendavais marítimos, mas tem dia que parece que nós somos uma nau a navegar nessas circunstâncias, cheias de turbulências. Assim correu o meu dia de hoje, do começo até o fim.
Acordei logo cedo com o objetivo de colocar o carro para a revisão, já que eu rodava com um carro locado há sete dias, arcando com toda a despesa. Deixei o carro na concessionária, mas ela não me forneceu um veículo para eu ir pegar o carro locado. Paguei uma corrida de táxi de um extremo a outro da cidade, em pleno período natalino onde esses carros são autorizados a cobrar uma taxa extra a título de 13º salário. Parei num restaurante ao meio dia e dei toda a corda à gula, coloquei 1,2 kg de alimento no prato e o comi todo acompanhado de dois copos de suco. Quebrei minha programação de perder um kg a cada dia. Fui em seguida fazer perícia, o paciente marcado não compareceu e surgiu outro que não estava sendo esperado, com alta complexidade, acompanhado de diversos familiares que estavam em conflito em função do curador do examinando. Terminei tarde e um documento que precisava ser assinado teve que voltar para completar as assinaturas. Era o último dia do curso que eu coordeno, mas já estava na hora de pegar o carro que havia sido revisado. Deixei o meu colega sozinho na sala de aula com os alunos no seu último dia e tive que ir a concessionária. Não resolveram o sensor da ré, nem o pneu que estava com um bucho. A concessionária disse que nada podia fazer apesar do carro estar apenas com três meses de uso. Ficou a abertura para eu acionar a fábrica, o PROCON ou o proteste. Enquanto isso vou rodar com o pneu em risco? Ao retirar o carro não tinha mais tempo de participar de uma assembleia da loja e optei para ir à reunião espiritual das quartas feiras. O documento que eu deveria levar com urgência para entregar a minha irmã, para entregar ao advogado, para entregar o juiz e este não cancelar a aposentadoria do meu irmão que se encontra internado não estava no carro. Tive apenas a notícia que a janela do apartamento caíra que quase causava um acidente sério, que o apartamento iria passar a noite com a janela sem vidro exposta as intempéries. Tive que voltar para dormir no apartamento e deixar a programação de dormir fora nas quartas feiras que sempre faço. Passou o dia todo e não tive tempo de preparar uma perícia que tenho que entregar com urgência, não preparei a prova que tenho que aplicar na segunda feira, não fiz o projeto de monitoria cujo prazo já foi adiado para o dia sete. Fiquei o dia mergulhado em turbulências. Não deu nem para pensar em Deus, mas com certeza Ele pensou em mim e deve ter conduzido as circunstâncias no ponto de administração das minhas forças e por isso agradeço mais uma vez a Ele. Para fechar a noite, fui passear o cachorrinho que espera toda quarta feira por seu passeio. Afinal, ele também é uma criatura de Deus, e Ele me usa para fazer com que a turbulência não atinja com força meu companheirinho.
Jesus prometeu que poderemos um dia vir a morar num Reino de justiça, amor e fraternidade. Disse que somos filhos de Deus, assim como todo ser humano existente nesta terra ou em qualquer galáxia, por mais próximo ou distante que esteja de nós. Falava com tanta convicção, dava exemplos tão coerentes, que não tinha como dizer que Ele estava errado ou que queria nos enganar. Acredito profundamente que Ele é honesto, que suas lições estão certas e que devo construir esse Reino de Deus a partir de meu coração. Passei a seguir suas lições com o máximo de coerência, mesmo que isso fosse de encontro aos valores culturais da minha comunidade. Reconheci o Amor Incondicional como a maior força do universo e que é representada nas nossas relações como a Lei do Amor. Com isso comecei a fazer faxina do meu coração e passei a fazer a retirada de tudo que fosse catalogado como egoísmo. Tive um sucesso razoável e passei a ampliar essa Lei do Amor que já prevalecia em meu coração para os relacionamentos diversos, principalmente os íntimos. Mas foi aí que encontrei os maiores obstáculos. O amor romântico prevalece no coração dos diversos corações femininos que encontrei na minha jornada, e se torna prioritário, sabe da hierarquia superior do Amor Incondicional, mas no momento da paixão não o respeita. Prevalece a tendência exclusivista do relacionamento, surge o ciúme, a intolerância, a vaidade, enfim, uma gama de sentimentos negativos, todos como filhotes da útero do egoísmo.
Minha busca pelo Reino de Deus termina nesse beco sem saída. Jesus falou que o Reino pode ser construído na comunidade, dentro dos relacionamentos, mas por que Ele não nos deu essa lição? Por que não se envolveu afetivo e intimamente com uma mulher para nos mostrar de forma bem didática, como desenvolver o amor romântico sem considerar a hierarquia superior do Amor Incondicional? Ou será que Ele espera que alguém dê continuidade as suas lições em busca do Reino prometido? Enquanto a dúvida fica de lado, procuro continuar a exercer o Amor Incondicional e quando surge o amor romântico procurar sempre colocá-lo em subordinação. Esta lição da minha parte já aprendi. Mas como ensinar aos outros? Assim, ainda não sei como alcançar o Reino Prometido, pois agora não depende só de mim.
Fui à festa da Padroeira de Ceará-Mirim-RN acompanhado por minha companheira pessoal e por alguns outros familiares. Na festa já estava presente minha companheira espiritual. Reconheço de início, o foco era a festa mundana e não a festa espiritual. Fui com o intuito de lazer, de ver barracas, apresentações, brincadeiras... nada do espiritual. Fiquei desconfortável, algo me dizia que eu não estava fazendo o correto. Minha companheira espiritual, envolvida com as atividades religiosas não pôde nos encontrar. Minha companheira pessoal estava tensa pela forma como iríamos nos encontrar. Minha filha dava sinais de cansaço. Enfim, terminamos por voltar sem nos encontrarmos todos, sem a festa mundana ter começado. Acredito que todos tenham sentido algo do que eu senti, mas ninguém se manifestou negativamente e todos circulamos com alegria e curiosidade ao redor da igreja.
Fica uma lição que Deus nos deu nessa noite, principalmente a mim que me considero tão envolvido nas forças do bem sob o comando de Jesus. Todas as atividades materiais tem a sua importância e devemos participar e nos integrar com os demais, mas sempre conscientes de que a prioridade é com o foco espiritual, que o material seja sempre que possível influenciado pelo espiritual e não o contrário.
Isso já aconteceu com o outro encontro espiritual que participo em Campina Grande, o encontro da Nova Consciência, onde existe todo congraçamento em torno das atividades das diversas religiões. Quando vou em companhia de pessoas cuja expectativa é de diversão mundana, termina por contaminar o objetivo espiritual da viagem.
Esse é um aspecto que devo tomar mais cuidado daqui para a frente. Mesmo que eu vá na companhia de pessoas que não tenham o mesmo interesse espiritual que eu, tenho que advertir que iria me envolver nas atividades espirituais e se eles não tem motivação para me acompanhar, que não fiquem incomodados por eu ter que cumprir o que manda minha consciência, mesmo que eu fique distante deles nesses momentos de atividade espiritual.