O Baghavad Gita fala do corpo humano como um campo de conhecimento. Como se fosse um campo de estágio que devemos fazer para conclusão de algum curso superior. No caso, o corpo é o campo de estágio para a alma. Ela fica associada a este corpo desde a sua formação no ventre da mãe. Nasce sob a influência de fortes fatores biológicos, de instintos, que capacita o corpo a sobreviver em momento que não está ainda instalada na mente a inteligência, o livre arbítrio. Fica assim a alma condicionada a esses imperativos biológicos desde a origem do corpo. A alma fica aprisionada na existência material, mas ela tenta assenhorear-se da natureza material, é o seu projeto evolutivo e que implica diversas tentativas na carne (reencarnações) para atingir o objetivo. Conforme sua capacidade de dominar a natureza material, ela obtém assim um campo de atividade que é o corpo.
Sei que o meu corpo é feito de sentidos, instintos. Minha alma quer desfrutar dos sentidos e assim obter o prazer. Foi o que aconteceu ontem. Devido a tão forte condicionamento, minha alma até desconsidera a prioridade de Deus e vai em busca do prazer que o corpo pode oferecer, por mais exíguo que seja. Um tipo de ocorrência como essa mostra a força do corpo, do campo do estágio em determinar as ações.
Devo reconhecer como o agente de minha evolução, a alma e não o corpo. O corpo é somente o campo de estágio, não pode determinar as ações. Não posso me identificar com o corpo, pelo contrário, eu sou o conhecedor do campo, do estágio em que minha alma se encontra.
Quando olho para o passado, vejo que o campo de estágio da minha alma, o corpo, está em contínua transformação. Desde a infância até o momento atual, meu corpo passou por profundas transformações, dá para ver com mais facilidade que eu sou distinto do meu corpo, que ele é o campo de conhecimento destinado por Deus para que eu aprenda a controlar essa força que emana dele com a força que emana do Pai, do Amor Incondicional.
Agora estou cada vez mais atento a esses desejos que vem para a minha consciência, sei que muitos deles é originado dos prazeres que o corpo pode oferecer e que funcionam como areia movediça, se não tiverem a sua utilização correta, para as necessidades reais do corpo. Caso contrário ficaremos chafurdando nesses prazeres carnais e afundando cada vez mais e cada vez mais sem possibilidade de sair... a não ser que exista uma ajuda externa e que estejamos dispostos a aceitar. De minha parte, reconheço a ajuda de Deus, que está sempre me dando apoio e que ás vezes não a recebo por decisão minha, e nesses momentos sinto que afundo.
Mas minha alma continuará o seu estágio nesse campo de conhecimentos carnais e aprenderei com muita atenção e determinação a evitar os locais de areia movediça, dos prazeres inconsequentes e vazios que existem no meu corpo. Para isso tenho a ajuda do Pai!
Após meses sem chover, finalmente vejo cair as gotas límpidas na janela do meu apartamento. Estava esperando o irmão sol nascer, mas quem veio na frente foi a irmã chuva. Veio na companhia do irmão vento e suas vozes se faziam ouvir completando o coro com o som do irmão mar que mais longe ficava.
A maresia que embotava os vidros da minha janela, logo foram limpos pela constância das gotas da chuva. Tinha agora uma visão mais clara da Natureza ao meu redor. Parei para fazer a oração de Abril.
Agora a chuva parou. O sol já chegou com força e tive que fechar a janela e ligar o ventilador. Lembro da oração que acabei de fazer e que já publiquei neste Recanto das Letras. Procurava a sintonia com o Pai, a chuva me auxiliava a evocar pensamentos divinos. Mas o monstro que habita dentro de nós nunca dorme, mesmo que fique quieto, pois sabe que não cumpriremos seus desejos egoístas e nocivos a terceiros, ele nunca dorme. Mesmo que eu durma. Foi o que aconteceu. Em plena oração ao Pai, cochilei. Nesse cochilo me veio um sonho. Poderia colocar na caixa preta, é algo muito pessoal, mas também é algo muito instrutivo. Serve de lição para mim e quem tiver oportunidade de ler essas experiências.
Nesse sonho que se passou durante cerca de 20 minutos ou menos, no qual cochilei, orando para Deus, quero deixar isso bem explícito, surgia uma moça que era minha aluna na Universidade, mas que não consegui distinguir a identidade. Era uma moça bonita. Ficava comigo na cama com o objetivo de aprender algo que não lembro o que era. Nossos movimentos eram respeitosos, apesar de mais adiante ela estar sem roupas. Eu a tocava de início sem pretensões, sabia que a estava tocando, sabia que esses toques podiam despertar desejos dentro dela. Não percebia da parte dela nenhuma resistência. Passei então a acariciar seu corpo, minhas mãos deslizavam por suas pernas, chegavam perto da genitália, percebia seu monte de Vênus devidamente depilado, sentia a umidade que vinha do seu interior e que sinalizava a carga de desejos que ela também estava possuindo naquele momento. Senti que era o momento de eu penetrá-la com o meu desejo que também estava a mil. Deixei meu corpo cair sobre o dela e sem nenhuma resistência ela abriu as pernas para me receber. Procurei a beijar, mas notei que seus olhos não expressavam o desejo que sua carne demonstrava. É como se tivesse recebendo apenas o fruto do meu desejo e que o dela não se manifestava. Mesmo assim eu prosseguia, o meu desejo permitia que eu realizasse toda a penetração, que sentisse todas as ações do ato sexual. Percebia também que no interior do corpo dela não existia tanta lubrificação quanto eu tinha percebido no exterior. Foi então nesse estado de coisas que eu voltei a realidade. Despertei do cochilo, mas estava com os efeitos da excitação sexual em meu corpo. Percebi que eu estava rezando para o Pai e que me acontecera isso. Agora eu poderia voltar a oração e pedir perdão ao Pai pelo que aconteceu, afinal não fora minha vontade.
Mas o desejo agora se confrontava com essa determinação de orar ao Pai. Se eu voltasse a oração, sabia que o desejo iria se dissipar, e eu queria experimentar o prazer que o desejo sinalizava que viria. Então, a minha vontade se aliou ao desejo. Deixei a obrigação de fazer a oração depois de obter o prazer, o Pai iria me entender, afinal Ele sabe que sou um fraco. Com essas argumentações internas entrei no ato da masturbação. Voltei a lembrar do sonho e da garota que o patrocinou. Achei estranho que essa garota não fosse identificada. Tinha traços de uma antiga atendente que trabalhou comigo na Casa de Saúde e também de uma atual residente. Mas nada definitivo com relação a uma identificação. Sabia apenas que era uma estudante de medicina e que estava comigo numa missão de aprendizagem. Voltei a lembrar dos nossos movimentos, do nosso comportamento. Era isso que mantinha alto o nível do desejo. Mesmo que não houvesse uma correspondência afetiva, não havia troca de beijos, seus olhos não sintonizavam com os meus, mas sua carne servia de pasto para os meus desejos. Eu conseguia fazer essas considerações, mas o desejo imperava e não me fez parar até a consumação do prazer. Fiz ao final uma reflexão, tanto esforço, tanto compromisso perdido com o Pai, apenas para experimentar uma fração de minutos de prazer!? Uma coisa tão fugaz e deixo de obter outro prazer que seria muito mais amplo e eterno? Mas já fazia essas considerações depois do ato consumado.
Voltei então para terminar a oração. Claro, qualquer pai mundano iria ficar revoltadíssimo com meu comportamento, mesmo fazendo tudo isso consciente ainda tinha a petulância de chegar perto dele e pedir um perdão por algo que eu sabia que não era certo. Mas não senti qualquer revolta do Pai. Senti apenas o Seu “olhar carinhoso e compreensivo” sobre minhas faltas e minhas fraquezas. Que acredita nas minhas intenções de fazer o que é certo em todas as dimensões e que um dia eu alcançarei a condição de também ser um filho dEle muito amado.
Isto me envergonha, é claro, seria muito mais confortável deixar tamanho tropeço em minha caixa preta. Mas faz parte de minha missão ser transparente, de ser condutor da plena verdade em minhas comunicações, quando isso disser respeito a mim, não implicar outras pessoas, trouxer consequências reativas somente contra mim e não contra terceiros.
É importante que as pessoas saibam que por trás da aparência de pessoa tão evoluída no campo espiritual que aparento ser, existe uma alma com tantas fraquezas, que precisa tanto ainda da compaixão do Pai e da compreensão e tolerância de todos que dividem a vida comigo, principalmente daqueles que estão mais próximos.
Finalmente terminei de ler “O Irmão de Assis”, a vida de São Francisco de Assis, segundo Inácio Larranaga. O homem que elegeu a Pobreza como sua companheira, sua esposa, que amava todas as criaturas do Pai, que procurou seguir o exemplo de Cristo até o desenvolvimento de suas chagas, que nos deixou palavras como as que foi título do texto de ontem: “O silêncio é a linguagem do amor.”
Observei em vários momentos um radicalismo extremo em função de sua determinação em ser humilde e conviver na intimidade com a Pobreza, a sua caminhada na trilha que o Senhor colocou em sua consciência. Cada um de nós temos a semente do Criador, o amor, em nossos corações e recebemos a missão que devemos cumprir na terra de acordo com nossas características fisiológicas, psicológicas e o contexto sócio-cultural que estamos inseridos. Então, cada um pode aprender com o exemplo dos irmãos, mas jamais podemos aplicar as suas atitudes em todos os momentos, pois somos por natureza diferentes e recebemos do Pai missões que também não são idênticas. Temos sim, que manter a coerência nas ações e na absorção dos ensinamentos ao nosso alcance, que sejam úteis para a nossa própria caminhada.
É dessa forma que hoje faço essa reflexão mais ampla do comportamento e da lição que o Irmão de Assis deixou para nós. Ontem eu concordei com ele sobre o silêncio ser a linguagem do amor. Continuo ainda acreditando nisso, pois Deus nunca falou comigo e apesar disso eu sei que Ele é a principal fonte de Amor e que a todo momento com Ele posso me abastecer e com Ele também aprendo a distribuir o Amor. Mas, respeitando a nossa condição humana, tão distante da condição angélica que um dia iremos atingir, vejo também a necessidade do verbo. Afinal foi com o verbo que Deus criou o universo. O silêncio dá a força disseminadora do Amor para todo o universo, onde existir uma consciência que consegue decodificar os afetos, em qualquer ponto desse imenso universo. O verbo torna-se necessário para o fortalecimento do Amor dentro das relações de tempo e espaço que temos durante a caminhada. O Irmão de Assis não destacou esse detalhe, mas foi importante tudo o que ele disse aos seus pais, seus amigos, a Clara, aos seus conterrâneos de Assis e ao mundo inteiro. Foram suas palavras associadas aos seus atos que deram a grande lição para todos nós e que se disseminam pelos séculos. Assim fica a lição para mim, que o meu silêncio sirva com a linguagem apropriada para levar o meu amor as partes mais distantes deste universo, principalmente dentro do contexto da minha vida. Mas também, que o verbo apropriado, que as palavras certas que traduzem a linguagem do coração possam ser proferidas nos momentos necessários e que sejam suficientes para atenuar o temor que possa nos atingir a alma.
Qual deve ser essa linguagem? Como deve se expressar o Amor? A energia mais poderosa do universo? A essência do Criador?
Será com a gramática apurada, rebuscada? Será com a música sublime, sofisticada? Com a matemática? Com as cores?
Posso eu ter capacidade mental de ir à busca dessa resposta? Minha inteligência é suficiente para encontrar a verdade com toda a coerência?
Sinto que sou tão pequeno diante da dimensão da vida, basta fazer essa simples reflexão para verificar a incapacidade da minha razão em dar explicações. Eu, que tanto valor dou ao Amor, que sei da força que Ele possui, da sua semelhança com o Criador, com o Pai, com Deus, não encontro palavras para descrever a forma dele se expressar. Tudo parece insuficiente para a expressão dessa tão imensa força.
Por não encontrar palavras, por não encontrar explicações racionais, fico calado, em meditação. Fico a sentir o que vai ao meu coração. Fico a sentir o deslocamento dessa força dentro de mim, que vem do infinito e que passa pelas pessoas, pela criação; que volta para o infinito e que também passa pelas pessoas, pela criação...
Sou uma espécie de estação sentimental, sintonizada com o Poder Criador, com o Amor, que dele recebo e transmito energia. Sempre tendo como centrais secundárias alimentadoras e receptoras, todos os meus irmãos de criação, principalmente àqueles feitos a semelhança do Pai como eu. Dessa forma eu também sirvo como central secundária para todos os meus irmãos que estão sob o meu raio de influência. É lindo quando duas centrais secundárias entram em sintonia na distribuição e recepção desse Amor. A energia do cosmo ao redor fica mais brilhante, todos os elementos da criação ficam mais energizados com o nosso fulgor.
Existe a tendência de assim caminharmos na vida ao lado das centrais de amor que vibram com a nossa sintonia e que tendem a disseminar de forma cada vez mais ampla toda essa capacidade de amar por toda a Natureza.
Foi essa percepção que alcançou o irmão de Assis e que ao ler hoje trechos de sua vida, me veio à mente essas reflexões. Ele também sentia o amor em dimensão profunda e a repassava sem economia a todos os seres da criação. Foi dele essa reflexão sobre a linguagem do Amor que eu aprovo totalmente:
A linguagem do Amor é o silêncio!
Qualquer outra forma de linguagem não consegue traduzir o Amor. Sempre irá faltar alguma coisa ou sobrar outras. É o silêncio que é mais fiel na transmissão dessa mensagem. Nem mesmo quando eu digo, “eu amo você”, não serve de prova incontestável dessa verdade, que pode ser uma mentira. É o silêncio que deixa expressar os meus sentimentos mais profundos que vai atingir diretamente o coração do outro.
Agradeço assim a Francisco de Assis por colaborar com minha compreensão do Amor, da sua força e da capacidade de comunicação pela linguagem mais apropriada. Fico assim mais capacitado a receber no silencio do meu lar as energias poderosas do Amor que dirigem para mim, assim como emitir da mesma forma a energia do Amor com toda potência que posso imprimir, às pessoas significativas de minha vida, principalmente. Nessa dimensão não importa a distância nem o tempo, ultrapasso até a Lei da Relatividade de Einstein e alcanço e me deixo alcançar pelas energias do amor que emitem para mim e que emito ao redor. Sem esquecer que, alem das fontes secundárias que existem e da qual sou parte, existe a fonte primária que jamais devemos esquecer e nos abastecer dela com o intercâmbio: DEUS!
Jesus usava uma metáfora agrícola para exemplificar o sentido de sua vinda entre nós. Dizia Ele:
Se uma semente permanece na segurança, aquecida e seca dentro de um celeiro, nunca irá germinar. Ela tem de ser enterrada na sepultura fria e escura do solo. Ali ela tem de morrer. Então dessa sepultura gélida o grão, no tempo da primavera, brota. Em resumo: “Se ela se agarrar a si mesma, permanecerá só, mas se morrer, se multiplicará.”
A cruz de Cristo é o exemplo supremo desse princípio fundamental. Se Ele tivesse se apegado a sua vida, o mundo teria morrido. Mas porque Ele morreu na escuridão da perversidade dos homens, renasceu com todo o respeito nesses mesmos corações que não podem deixar de considerar tamanho sacrifício.
Ao me apropriar desse exemplo do Mestre é que vem à consciência o medo da minha cruz. Sei que tenho também uma missão a cumprir como vontade do Pai e que não posso apegar tanto a minha vida que comprometa o sucesso da missão. Pelo contrário, pelo que estou entendendo é necessário que minha vida seja disponibilizada em função da disseminação e aceitação da missão, de colocar o Amor Incondicional como prática prioritária, como primado de nossas vidas. Mesmo que isso deixe em segundo plano todas as demais forma de amor, como amor fraterno, paterno, filial, conjugal, patriota, etc. Até o mais forte deles, o amor romântico, a paixão, todos devem estar à serviço do Amor Incondicional que é a essência do Pai e a sua vontade. E isso implica em sacrifício pessoal, em carregar uma cruz até o ponto extremo da extinção voluntária da própria vida para que a semente possa dar os frutos que se espera.
Existe um consolo para atenuar esse medo. O salmista diz que “Depõe no Senhor os teus cuidados (medos), porque Ele será o teu sustentáculo; não permitirá jamais que vacile o justo.” (Bíblia, Ed. Ave Maria, Salmo 54, 23).
Tenho que me desvencilhar dos meus pecados para me tornar esse justo. Tenho que perdoar as feridas e danos que as pessoas me causaram. Tenho que perdoar e liberar as pessoas. Devo abandonar o mais rápido possível o ciúme, medo, ansiedade. Também devo ajudar a levar a cruz de nossos irmãos e seguir o exemplo do Mestre que dizia: “Vinde a mim, vós todos que estais aflitos sob o fardo, e eu vos aliviarei.” (Bíblia, Ed. Ave Maria, Mat 11,28).