Na Escola do Evangelho feita semanalmente em Ceará-Mirim, sinto a necessidade das atividades terem a participação mais efetiva dos presentes. Sinto que a maioria dos que frequentam as aulas com assiduidade e procuram absorver e praticar as lições que recebem, já mostram alguns benefícios na forma de pensar e de se comportar. Mesmo assim, sinto também que as lições podem ser melhor absorvidas se for introduzido algum grau de teatralidade com a participação dos presentes.
A leitura da história O Servo Bom que foi publicada no diário de ontem, neste espaço, é uma boa oportunidade de ver o funcionamento dessa ideia. Será feito a xerox do texto para ser dado a cada um dos participantes dentro do teatro, que tenham alguma fala ou comportamento. Nesse texto a fala do relator será sempre da pessoa que conduz a palestra. Os outros participantes ficarão com as falas ou comportamento de Jesus, Tadeu, Filipe, Pedro, Levi e Zaqueu.
O texto será dado a cada participante ativo com uma semana de antecedência. A pessoa deve ler todo o texto e teatralizar a sua participação, quer seja fala ou comportamento. No dia da apresentação, as pessoas que não participaram ativamente da teatralização, devem ficar atentos para no final fazer uma avaliação de todos os participantes e da forma de passar o conteúdo.
Sei que a maioria das pessoas tem uma certa leitura da Bíblia, até procuram compreender as lições, mas existe uma grande confusão. A leitura do Antigo Testamento tem uma direção e o Novo Testamento tem outra muito diferente, apesar dos personagens procurarem uma coerência dentro do conceito de divindade. Poucas pessoas conseguem fazer essa distinção e leem a Bíblia como se fosse um livro único, com uma só destinação.
O Velho Testamento tem mais compromisso com o povo judeu, tratam todos os outros como bárbaros, pessoas não escolhidas pela divindade. São aceitos comportamentos perversos de uma nação contra outra, de uma pessoa contra outra, somente pelo fato de não pertencer a mesma raça.
O Novo Testamento sob a inspiração do Mestre Jesus, dá uma orientação mais universalista e ensina o Amor como sendo a essência do Pai, do Criador. Por isso tem a vocação de ser difundido e compreendido por toda a humanidade, transformando todos em ovelhas do mesmo pastor, em busca da formação do Reino de Deus entre nós, a partir da transformação dos nossos corações.
Mas a maioria das pessoas, mesmo estando num estágio mais elevado de compreensão espiritual, ainda estão muito envolvidos em dogmas irracionais, sem perceberem a real dimensão da doutrina espírita. Somente a forma de passar as lições de maneira mais dinâmicas e compreensível pode ajudar nesse esforço de evangelização, e nesse ponto a teatralização pode ser de grande ajuda.
Existe uma história no livro “Boa Nova”, de Humberto de Campos/Chico Xavier, que me deu um grande alento frente a uma dúvida que sempre martela a minha consciência com relação à caridade. Resisto muitas vezes a fazer a caridade, nas ruas, nos semáforos das ruas, pois imagino que possa estar sendo ludibriado e prejudicando quem esteja naquela situação. Mas fica sempre uma dúvida se estou ou não fazendo o correto, se não devia ajudar de qualquer forma, mesmo que por trás tivesse alguma maldade sendo beneficiada. Isso seria da conta de Deus com essa pessoa malvada.
Nessa história relatada por Humberto de Campos através de Chico Xavier, veio o ensinamento que não posso ficar bitolado somente na letra do que está nos evangelhos, o orar e vigiar é importante assim como a prática da caridade de forma mais ampla possível, e não só na doação de uma simples moeda para aliviar a consciência.
Tadeu parecia querer impor aos ouvintes das palestras de Jesus a entrega de todos os bens aos necessitados. Filipe não vacilava em afiançar que ninguém deveria possuir mais que uma camisa, constituindo uma obrigação tudo dividir com os infortunados, privando-se cada qual do indispensável à vida.
Levi, o antigo cobrador de impostos, replicava com cuidado: “E quando o pobre nos surge apenas nas aparências? Conheço homens abastados que choram na coletoria de Cafarnaum, como miseráveis mendigos, apenas para não pagar os impostos. Sei de outros que estendem a mão à caridade pública e são proprietários de extensas terras. Estaríamos edificando o Reino de Deus se favorecêssemos à exploração?”.
Tudo isso é verdade, redarguia Simão Pedro, entretanto, Deus nos inspirará sempre nos momentos oportunos, e não é por essa razão que devemos abandonar os realmente desamparados.
Levi não se dava por vencido e retrucava – A necessidade sincera deve ser objeto incessante de nosso carinhoso interesse, mas tratando-se de falsos mendigos, é preciso considerar que a palavra de Deus vindo por nosso Mestre, nos adverte que devemos orar e ser vigilante. É importante que não distorcemos o nosso sentimento de piedade e termine por prejudicar aos irmãos que estão desviados da estrada do Senhor.
Mas Filipe, agarrado à letra do Evangelho, continuava acreditando que era mais fácil a passagem de um camelo pelo fundo de uma agulha do que a entrada de um rico no Reino do Céu.
Jesus não participava dessas discussões, mas esperava uma oportunidade para um esclarecimento geral.
Na sua última ida à cidade de Jericó, um publicano de nome Zaqueu conhecia a fama de Jesus e queria vê-lo. Zaqueu era de pequeno porte e subira numa árvore para ver Jesus. O Mestre o viu e pediu para descer da árvore porque necessitava da sua hospitalidade e companhia. Zaqueu ficou possuído de imenso júbilo, abraçou-se com Jesus com prazer e espontaneidade e deu ordens para que Jesus e sua comitiva fossem bem recebidos. O Mestre deu o braço ao publicano e escutava, atento, as suas observações, com grande escândalo dos discípulos: “Não se tratava de um rico que merecia ser condenado?”; “Como justificar tudo isso se Zaqueu é um homem de dinheiro e pecador perante à lei?”
Zaqueu mandou servir uma refeição a todo o povo e passaram a conversar num vasto alpendre sobre a missão de Jesus, que sabia ser condenável as riquezas criminosas do mundo. O publicano esclarecia com toda a sinceridade da alma:
- Senhor, é verdade que tenho sido observado como um homem de vida reprovável, mas, desde muitos anos venho procurando empregar o dinheiro de modo que represente benefícios para todos que me rodeiam na vida. Compreendendo que aqui em Jericó havia muitos pais de família sem trabalho, organizei múltiplos serviços de criação de animais e de cultivo permanente da terra. Até de Jerusalém, muitas famílias já vieram buscar, em meus trabalhos, o indispensável recurso à vida!...
- Abençoado seja o teu esforço! – replicou Jesus, cheio de bondade.
Zaqueu ganhou novas forças e murmurou:
- Os servos de minha casa nunca me encontraram sem a sincera disposição de servi-los.
- Regozijo-me contigo – exclamou o Messias -, porque todos nós somos servos de nosso Pai.
O publicano que tantas vezes fora injustamente acusado, experimentou grande satisfação. A palavra de Jesus era uma recompensa valiosa à sua consciência dedicada ao bem coletivo. Extasiado, levantou-se e, estendendo as mãos ao Cristo, exclamou alegremente:
- Senhor! Senhor! Tão profunda é a minha alegria, que repartirei hoje, com todos os necessitados, a metade dos meus bens, e, se nalguma coisa tenho prejudicado a alguém, indenizá-lo-ei, quadruplicamente! ...
Jesus o abraçou com um formoso sorriso e respondeu:
Bem-aventurado és tu que agora contemplas em tua casa a verdadeira salvação.
Alguns dos discípulos, notadamente Filipe e Simão, não conseguiam ocultar suas deduções desagradáveis. Mais ou menos aferrados as leis judaicas e atentando somente no sentido literal das lições do Messias, estranhavam aquela afabilidade de Jesus, aprovando os atos de um rico do mundo, confessadamente publicano e pecador. E, como o dono da casa se ausentasse da reunião por alguns minutos, a fim de providenciar sobre a vinda de seus filhos para conhecerem o Messias, Pedro e outros prorromperam numa chuva de pequeninas perguntas. Por que tamanha aprovação a um rico mesquinho? As riquezas não eram condenadas pelo Evangelho do Reino? Por que não se hospedaram numa casa humilde, e sim naquela vivenda suntuosa, em contraposição aos ensinos da humildade? Poderia alguém servir a Deus e ao mundo de pecados?
O Mestre deixou que cessassem as interrogações e esclareceu com generosa firmeza:
- Amigos, acreditais, porventura, que o Evangelho tenha vindo ao mundo para transformar todos os homens em miseráveis mendigos? Qual a esmola maior: a que socorre as necessidades de um dia ou a que adota providências para uma vida inteira? No mundo vivem os que entesouram na Terra e os que entesouram no Céu. Os primeiros escondem suas possibilidades no cofre da ambição e do egoísmo, e por vezes, atiram uma moeda dourada ao faminto que passa, procurando livrar-se de sua presença; os segundos ligam suas existências a vidas numerosas, fazendo de seus servos e dos auxiliares de esforços a continuação de sua própria família. Estes últimos sabem empregar o sagrado depósito de Deus e são seus mordomos fiéis, à face do mundo.
Os apóstolos ouviam-no, espantados. Filipe, desejoso de se justificar, depois da argumentação incisiva do Cristo, exclamou:
- Senhor, eu não compreendia bem porque trazia o meu pensamento fixado nos pobres que a Vossa bondade nos ensinou a amar.
- Entretanto, Filipe, elucidou o Mestre, é necessário não nos perdermos em viciações do sentimento. Nunca ouviste falar numa terra pobre, numa árvore pobre, em animais desamparados? E acima de tudo, nesses quadros da Natureza a que Zaqueu procura atender, não vês o homem, nosso irmão? Qual será o mais infeliz: o mendigo sem responsabilidade, a não ser da sua própria manutenção, ou um pai carregado de filhinhos a lhe pedirem pão?
Como André o observasse, com grande brilho nos olhos, maravilhado com as suas explicações, o Mestre acentuou:
- Sim, amigos! Ditosos os que repartirem os seus bens com os pobres; mas bem-aventurados também os que consagrarem suas possibilidades aos movimentos da vida, cientes de que o mundo é um grande necessitado, e que sabem, assim, servir a Deus com as riquezas que lhes foram confiadas!
Em seguida Zaqueu mandou servir uma grande mesa ao Senhor e seus discípulos, onde Jesus partiu o pão, partilhando do contentamento geral. Impulsionado por um júbilo insopitável, o chefe publicano de Jericó apresentou seus filhos a Jesus e mandou que seus servos festejassem aquela noite memorável para o seu coração.
Nos terreiros amplos da casa, crianças e velhos felizes cantavam hinos de cariciosa ventura, enquanto jovens em grande número tocavam flautas, enchendo de harmonias o ambiente.
Foi então que Jesus, reunidos todos, contou a formosa parábola dos talentos, conforme a narrativa dos apóstolos, e foi também que, pousando enternecido e generoso olhar sobre a figura de Zaqueu, seu lábios divinos pronunciaram as imorredouras palavras: - Bem-aventurado sejas tu, servo bom e fiel!
Na filosofia Zen a história dos 10 Touros é contada para explicar a evolução humana. Tem certa semelhança com o Mito da Caverna, de Platão, onde pessoas acorrentadas vêm sombras na parede projetadas por uma fogueira que está atrás deles. Pensam que essas seja a realidade e fazem estudos magníficos sobre elas. Até que um dia, uma dessas pessoas consegue se libertar das correntes e foge para o mundo exterior. Essa pessoa ver outra realidade, a luz do sol e um mundo brilhante ao seu redor. Volta à Caverna para dizer às pessoas o que viu, como é a realidade lá fora, mas todas não acreditam, o ironizam e tentam prendê-lo como louco. Ninguém acredita que exista lá fora um mundo como foi descrito.
A história dos 10 Touros começa pela primeira figura onde um jovem vaqueiro sai pelo mundo à procura do Touro, o seu animal. Esta história Zen já começa num nível mais adiantado, pois a pessoa vai à procura de uma coisa que sabe que existe, enquanto as pessoas na Caverna de Platão continuam presas às suas correntes, sem aceitarem a existência de um mundo novo lá fora.
Na segunda figura o jovem encontra as pegadas do Touro. Já imagina que seja um animal bem maior do que ele pensava, tendo em vista o material que ele levava para prender esse Touro, imaginava ser um animal bem mais frágil, material mais apropriado para prender um cãozinho poodle.
Finalmente o vaqueiro ver o Touro à distância, ver o seu enorme corpo, mas ainda não consegue ver a cabeça. É o momento que nós nos deparamos com nossos instintos que possuem a força para nos arrastar para onde eles acreditam que exista o prazer.
O vaqueiro não se intimida e parte para o enfrentamento do Touro. Corresponde ao momento que nós estamos frente a frente com o animal que dorme dentro da gente e que sentimos que é necessário enfrenta-lo. Mesmo o animal sendo enorme, o vaqueiro tem a determinação, e isso é o suficiente para a sua vitória, mesmo que demore muito tempo.
Na quinta figura o vaqueiro tem o Touro dominado, mas é preciso que ele tenha muito cuidado, o animal está vigilante, raivoso e a qualquer momento ele pode arrastar o seu dono. Esta é a fase que o apóstolo Paulo experimentava, de querer fazer o bem, mas terminava fazendo o mal que ele não queria.
Na figura seguinte o animal está domesticado, o vaqueiro pode seguir serenamente sobre ele, pois o Touro irá para o vaqueiro queira ir, e ele pode ir tocando sua flauta sem preocupações. É o momento que nós dominamos nossos instintos e eles não ameaçam que nós façamos alguma coisa que não queremos
Na sétima figura vemos o vaqueiro sem o Touro. Ele não precisa mais dele. Foi um momento que ele precisava saber administrar a energia do seu animal para atingir determinado propósito. É como alguém que vai à procura de um barco para atravessar um rio, e depois de atravessado não precisa mais o carregar.
O vaqueiro sabe que tem um animal dentro de si, que o obedece e fortalece, por isso essa figura é em branco, o vaqueiro pode ir para qualquer lugar, está livre.
A penúltima figura mostra a Natureza e agora o vaqueiro pode olhar e apreciar tudo que existe sem ter o incômodo do animal dentro de si.
Por fim ele vai pelo mundo a mostrar a importância de cada um encontrar o seu animal e com ele viver uma vida de qualidade. É semelhante a pessoa que consegue fugir da prisão da caverna, no mito de Platão, e que volta para instruir seus companheiros sobre a realidade da vida. Foi o que Jesus fez conosco, já estava vivendo no êxtase de paraíso, mas obedeceu a vontade do Criador, dentro da sua consciência, para voltar à Terra e nos ensinar como fazer para dominar o nosso animal poderoso e seguir com liberdade a vontade do Pai.
Pedro chegou perto de Jesus e indagou a Ele sobre a lei de Moisés que orientava o apedrejamento das mulheres que pecavam, que se deterioravam pela prostituição, já que as lições que o Mestre passava, de Amor e tolerância, parecia proteger essas pessoas.
Jesus advertiu ao velho discípulo, que a maioria das mulheres que se encontram nessa situação de decadência moral, são devido as culpas dos próprios homens que a induziram entrar no mundo do pecado. Disse ainda que tanto o homem quanto a mulher foram criados de forma equânime, todos com a centelha do Criador dentro de si, mas a mulher tem uma responsabilidade maior com o Amor, pois é dela o dever de guardar dentro de si por nove meses o filho que foi gerado, e ainda alimentar no próprio seio, educar e proteger nos primeiros anos de vida. Esse esforço extra que toda mulher faz na sua vida, geralmente de forma anônima, não é reconhecido como é reconhecido o trabalho de políticos, filósofos, generais, nos livros de história. Isso faz ainda mais a mulher se aproximar de Deus, pois o Pai também não é reconhecido pela maioria das pessoas, que vivem na terra dominado pelos instintos animais. Por isso, Pedro, - explicou o Mestre - o rigor da lei de Moisés com as mulheres, que assim tenta preservar os interesses materiais dos instintos masculinos, não pode ter mais autoridade moral que a lei do Amor, que é baseada na Verdade e na Justiça divina. Como poderíamos compactuar com tal lei, se sabemos toda essa história e predestinação da mulher? E sabemos também do comportamento masculino?
Pedro assentiu com as explicações do Mestre, sentiu a sabedoria e justiça que vinham de suas palavras e calou meditativamente.
O tempo passou, e dois dias depois do sacrifício da crucificação do Mestre, os discípulos estavam desarvorados, sem entender porque o Mestre tão poderoso, tão próximo de Deus, se submeteu à tanto suplício, à desonra, à ironia, à crucificação entre dois ladrões. O pensamento chegava ao desespero, ao medo... como levar adiante as mensagens do Mestre, de uma pessoa que se viu tão humilhada e desonrada? O Amor que o Mestre ensinara não tinha espaço no coração desses discípulos.
No terceiro dia Maria Madalena foi ao sepulcro do Mestre com flores nas mãos, lembrava das lições, do Amor que sentia em sua presença... Foi nesse momento que Jesus sentiu a vibração do Amor, o sentimento que liga o Céu com a Terra, e teve condições de se manifestar. Chamou Maria pelo nome e quando essa o reconheceu e tentou lhe abraçar, o Mestre disse que não o tocasse, que não havia ainda subido para o Pai.
Maria Madalena levou a boa notícia aos demais discípulos, que após vencer o primeiro momento de dúvidas, sentiram grande alento em seus corações e despertou toda a energia de saírem pelo mundo divulgando o Evangelho.
Há um historiador francês que faz a seguinte indagação: “Onde está o sábio da Terra que já deu ao mundo tanta alegria quanto a carinhosa Maria de Magdala?”. É uma amostra da força amorosa que a mulher possui, pois nenhum dos discípulos masculino conseguiram deixar o Amor em destaque e possibilitar a materialização do Mestre, provando que Ele continuava vivo e entre nós. Foi o portal amoroso que Maria Madalena abriu, uma mulher, condenada pela cultura e preconceitos humanos, que possibilitou a força necessária para a instalação dos princípios da Boa Nova em nossos corações.
Tenho uma amiga que passa por muitas dificuldades no relacionamento com seu marido, e ao sairmos juntos certa tarde, ela confessou que se sentia simultaneamente no Céu e no Inferno. Achei interessante essa colocação dela e fiz o texto abaixo como se fosse ela a autora.
Por estranho que pareça, me sinto no inferno e ao mesmo tempo no paraíso. Estou ao lado do homem que amo, e com o homem que o destino colocou, nos últimos dias, na minha vida. Ambos foram colocados por Deus em minha vida, certamente Ele quer me ensinar algo que ainda não consigo entender.
O primeiro homem é o meu marido, entrou na minha vida e casamos... mesmo não estando entusiasmada para viver uma vida de mulher casada. Geramos duas filhas e construímos nossa casa, firmamos nosso relacionamento. Eu sempre fui muito resistente com essa questão de relacionamentos, levava na brincadeira o sentimento do amor.
Minha vida tornou-se um inferno quando soube, inclusive através de provas, da traição do meu marido. Parece um castigo dos deuses, eu que sempre ironizei o amor, fiquei como uma pessoa apaixonada que via da traição o desprezo do homem que tenho que reconhecer, se não estou apaixonada, o amo de verdade e tenho medo de perde-lo. Acontece que o sentimento do orgulho ferido, da raiva e até do ódio, tornou o meu pensamento obcecado pela imagem dos dois fazendo amor. Chego a ouvir vozes dentro de minha cabeça que me acusam ou que me mandam reagir, de matar ou morrer. Não consigo aceitar as mentiras que meu marido me diz, que nada aconteceu, não reconhecendo as provas documentais e testemunhais que tenho. É este tumulto perverso e dolorido, constante e severo na minha mente, que me tira o sono e a paz, que me joga dentro do inferno.
O outro homem que Deus colocou ao meu lado, traz para perto de mim a luz do Evangelho, mostra as lições que Jesus veio nos dar sobre o Amor, a tolerância e principalmente o perdão. Mas como perdoar uma pessoa que me machucou tanto e continua a me machucar, pois permanece na mentira e nunca aceita a verdade que eu tenho nas mãos? Mas este amigo me diz que se ele fala a mentira e não quer reconhecer isso é problema dele, o meu problema é ter a firmeza para reconhecer que isso é tarefa dele, que eu não posso fazer por ele, e que o que eu posso fazer se quiser, é corrigir a minha forma de pensar e sentir e dar o perdão pelos males que ele me fez, mesmo ele não reconhecendo isso. Mas isso é problema dele, o meu problema é encontrar forças e dar o perdão verdadeiro, somente assim sairei do inferno e poderei entrar no céu.
Então foi isso que senti nesta tarde. Ao lado do meu marido que leva consigo as mentiras que me atormenta e ao lado do meu amigo que leva consigo o Evangelho que pode me libertar, eu fico a sentir o inferno quando chega na memória a traição que sofri e o sentimento de perdão, e ao mesmo tempo, por um pequeno intervalo de tempo eu chego a sentir o céu quando imagino lhe dar o perdão e o amar sem nenhum tipo de ressentimento.
Ah, meu Deus, como eu queria jogar fora esse inferno e ficar sempre dentro do Céu! Mas eu não me renderei. Lutarei até o fim para transformar dentro de mim tanto orgulho, tanta vaidade por não ser reconhecida uma mulher que possui um marido que não trai, tanta raiva que surge as vezes sem eu querer... Mas meu amigo ensinou que quando nos sentimos fragilizados sem forças para atingir aquilo que queremos, devemos orar a Deus com toda a força dos sentimentos para que Ele nos dê força e sabedoria para alcançar este Céu, que aqui e acolá experimento um pouquinho dele.