Jesus sempre usava essa imagem do pastor e suas ovelhas para exemplificar o Seu cuidado com as pessoas as quais considerava como ovelhas. Tinha a missão precípua de cuidar delas, que viviam no mundo desgarradas sem um objetivo de cunho definitivo frente a eternidade da vida. As pessoas viam apenas seus interesses imediatos, guiadas pelo instinto natural que visa apenas a preservação da vida corporal, do acúmulo dos bens materiais, de garantir a própria subsistência, pessoal e genética. Para atingir esse objetivo imediato funcionava a lei do mais forte como fator de construção de hierarquias sociais, com seus critérios de inclusão (o próximo parente ou conhecido) e exclusão (o próximo desconhecido). Fator esse que iniciou com a existência da própria pessoa e que persiste ao longo do tempo até hoje, com a criação das grandes fortunas e poderosos em contraste com as grandes misérias e escravidão. Mesmo que a conquista científica e tecnológica tenha trazido um verniz ético as relações sociais, é inequívoca a percepção da lei do mais forte em pleno vigor entre nós. Tenho na minha experiência cotidiana a comprovação disso. Trabalho em um hospital universitário onde sou professor e sou considerado de classe média. Ao redor existe uma comunidade que sofre pela dificuldade de acesso aos recursos básicos de sobrevivência. Muitos se entregam ao tráfico e/ou consumo de drogas, a prostituição, a furtos. Todos nós, professores e alunos, entramos diariamente pelo portão do hospital para guardarmos nossos carros, que superlotam o estacionamento, após passar por montanhas de lixo que esses moradores sem educação colocam nesse local. Todos nós, professores e alunos, cumprimos nossas tarefas cotidianas com o intuito de garantir nossa sobrevivência na base do acúmulo da capital, passando pelo acúmulo do conhecimento acadêmico. As vezes lançamos um olhar caritativo a essas pessoas no sentido de facilitar um exame clínico, uma consulta médica, dar uma moedinha a uma criança ou idoso pastorador de carros. Tudo isso cumpre o objetivo imediato da sobrevivência do corpo e de meus descendentes.
Jesus veio há mais de 2000 anos para nos ensinar a existência de outro sentido para a vida, que não era esse tão fugaz e ilusório como as necessidades da existência material. Veio nos ensinar que possuímos um espírito eterno e que ele é educado ao longo das existências corporais, que um só corpo, uma só existência material, é insuficiente para aprendermos tudo que é necessário. Que devemos reconhecer e conter os impulsos instintivos de natureza egoísta que visam apenas os nossos interesses materiais, de forma implícita ou explícita. Que existe um Criador para toda a Natureza, que sua essência é o Amor e que é nessa essência que devemos sintonizar para criar e educar as virtudes da alma. Esse é o papel do “Bom Pastor” que Jesus representou frente as ovelhas perdidas no sentido existencial. Esclarecia que era a porta, o conhecimento, por onde as ovelhas passam, a verdade e a vida. O Bom Pastor dormia na porta, seu corpo servia de portão que protegia suas ovelhas, estava disposto a dar sua vida por elas, como aconteceu.
Da mesma forma que as ovelhas, os lobos também fazem parte do povo, são aquelas pessoas arraigadas aos impulsos instintivos, que deles não querem largar mão e que continuam a explorar o próximo, as ovelhas, em seu beneficio pessoal e imediatista.
Agora chega a minha mente uma pergunta: será que uma ovelha pode se tornar um pastor? Na minha condição de ovelha e obediente as instruções do Bom Pastor, às vezes sinto essa vontade de também cuidar de ovelhas, pois quando eu sigo a lição de amar ao próximo como a mim mesmo, e que tenho tanto cuidado de respeitar, sinto que estou assumindo a missão de um bom pastor.