Sióstio de Lapa
Pensamentos e Sentimentos
Meu Diário
10/10/2013 00h01
A FORÇA DA GULA

            Observei com maiores detalhes a força que a gula exerce sobre o meu comportamento. Estou determinado a fazer o controle alimentar esta semana tendo em vista o aumento do peso que me deixa na faixa do sobrepeso com ameaça a saúde. O meu espírito observa esse detalhe e a necessidade desse controle. O meu corpo não tem a condição crítica de fazer essa observação. Ele tem apenas o preparo fisiológico de apresentar as necessidades na forma de desejos e sabe que ao cumprir recebe em troca o prazer corporal. Assim ele comete exageros em vários aspectos, não somente no alimentar, sempre que a ação lhe proporcione algum prazer. Assim observo com relação as drogas recreativas, legais ou ilegais; com relação ao sexo, jogos, doces, etc. Todas as ações, desde que realizadas acima de determinado limite, passam a ser nocivas ao próprio corpo e por consequência, ao espírito que deve ser responsável por ele. Mas somente cabe ao espírito fazer esse diagnóstico e limitar as ações dentro de limites saudáveis.

            Então, dentro desse contexto, o meu espírito viu a necessidade do controle alimentar e isso vai de encontro a força do desejo do corpo por alimento, força essa que quando não controlada e tem uma existência abusiva a chamamos de Gula, reconhecida como um dos sete pecados capitais. Pode até parecer um controle simples e fácil de fazer, comparado ao controle do uso de drogas recreativas onde o poder nocivo dessas é devastador na vida dos dependentes. Mas se observarmos bem a Gula também faz seus estragos massivos. É só verificar quantas pessoas estão classificadas na faixa do sobrepeso em que me encontro, quantas avançam para a obesidade sem conseguir deter essa marcha. Quando percebem a necessidade do controle, se submetem as diferentes formas de dietas e até a cirurgias corretivas e limitantes.

            A estratégia que eu uso com maior êxito é o jejum. Consigo ficar até três dias sem me alimentar de nada, apenas tomando água ou no máximo um suco de frutas, sem sofrimento corporal significativo. Porém sou muito criticado por isso, que devo fazer apenas o controle da alimentação, mas não deixar de comer, pois isso também é nocivo à saúde. Não tenho essa compreensão, mas muitas vezes me submeto a opinião da maioria que está ao meu redor, e sinto nesses momentos a força da Gula. Uma porção de alimentos por pequena que seja desperta no corpo toda a força dos desejos, o vigoramento da Gula.

            Foi isso que aconteceu ontem. Eu já estava sofrendo derrotas sucessivas representadas no controle do peso que não consegue descer aos níveis desejados e algumas vezes sobe em vez de descer. Isso na primeira semana que decidi fazer o controle alimentar. Então ontem eu estava determinado a fazer o jejum mesmo, para compensar a falha do dia anterior que elevou o meu peso muito acima do que eu queria. Pensava que ao sair do trabalho eu passaria na padaria e comeria um pouco de salada ou um pacote de castanhas, já foi um boicote a necessidade do jejum que o espírito tinha planejado. De forma bioquímica e neurofisiológica as necessidades do corpo chegam até as estruturas cerebrais capacitadas em levar os conteúdos mentais que formam os desejos no campo emocional dos pensamentos. Toda essa estrutura tem um desenvolvimento biológico autônomo, predeterminado desde a existência do ser na forma de instintos, que se desenvolvem para a preservação da vida e reprodução do indivíduo. Não existe nessa engenharia biológica um setor de autocrítica que por si só faça o controle do comportamento exagerado, apesar de que, os mesmos sistemas neurofisiológicos da gula promovida pelo corpo, também sustentem os processos intelectivos movidos pelo espírito os quais irão fazer o diagnóstico nocivo do comportamento. Surge assim no campo mental a decisão do espírito em limitar ou evitar o comportamento nocivo, no caso a aquisição exagerada de alimentos. Também existem no campo mental os desejos do corpo, alicerçados no interesse da sobrevivência biológica. São dois títeres que se confrontam e que vestem os devidos uniformes: no lado espiritual é o Ego superior ligado aos interesses da vida eterna, a evolução do espírito no campo moral; no lado corporal é o ego inferior, ligado aos interesses da sobrevivência do corpo, da vida efêmera, da evolução no campo biológico. O termo superior e inferior não significa maior ou menor força de forma automática. Claro, a lógica nos diz que o Ego superior é quem deveria ter a maior força e comandar o comportamento. Mas isso não é o que observamos. Na maior parte das vezes o comportamento e determinado pelo ego inferior, o que está preocupado com a vida efêmera da carne, com a evolução egoística do próprio corpo.

            Foi isso que aconteceu quando entrei naquela padaria. O meu processo mental foi tomado pelos desejos do corpo e meus pensamentos foram totalmente direcionados para eu me alimentar o máximo possível. Parecia que eu era um autômato onde a voz do meu espírito não conseguia influenciar o meu comportamento. Fiz um prato enorme e me dirigi a mesa. Fazia a crítica do que estava acontecendo, mas sem nenhuma convicção de evitar o desastre eminente. Aconteceu. Ingeri o enorme prato que construí e o espírito agora passava apenas a se lamentar por mais uma derrota.  

            Sei de todos esses detalhes e sei que meu espírito não pode abandonar a arena de luta, apesar das derrotas humilhantes que sofre. Hoje é mais um dia, mais uma batalha. O meu espírito se coloca mais uma vez a postos, enche a minha mente com os propósitos da abstenção total de alimentos, do jejum total, onde seja aceita apenas a água, como forma de recuperação do amor próprio. Hoje verei se esse round será vencido por meu espírito. Estarei torcendo por ele durante todo o dia. Procurarei evitar todas as armadilhas que a Gula desenvolver com os mais diversos argumentos, com os mais diversos apoiadores que sem saberem estão atuando como uma torcida que motiva os jogadores do seu time. No caso, os desejos da carne que já estão bem postos em campo.

Publicado por Sióstio de Lapa
em 10/10/2013 às 00h01
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