Sióstio de Lapa
Pensamentos e Sentimentos
Meu Diário
28/04/2014 00h01
O VALE DAS FLORES

            Como disse no texto anterior, irei agora reproduzir um trecho do livro “Maria de Nazaré”, sobre os trabalhos que ela passou a fazer no Vale das Flores, uma comunidade de leprosos.

            Maria ia frequentemente ao Vale das Flores, onde viviam os hansenianos, segregados da sociedade. Eram restos de homens, mulheres e por vezes crianças, em situações terríveis. O mau cheiro causava asco em qualquer um que se aproximasse daquela gente. Os mais resistentes saíam em busca de algum alimento para os que não podiam mover-se e muitos não voltavam mais, sofrendo o apedrejamento das mãos ignorantes ou padecendo sob leis rigorosas. Maria de Nazaré sentia a necessidade de testar seu próprio coração, rente aos corações dos que mais sofriam dor e isolamento.

            A mãe de Jesus começou a visitar o Vale das Flores sozinha. Até mesmo seus mais chegados companheiros não suportavam a idéia de aproximação com aquele tipo de gente, muitos já em estado de decomposição. Para aquela aproximação era necessário muito amor, o que não faltava no coração de Maria. À primeira visita, eles se assustaram, demorando-se para chegar perto daquela cândida mulher. Pensaram que era louca, pois somente loucos poderiam ir ter com eles, a não ser os contaminados pela terrível doença. Mas aquela mulher não era louca. A sua loucura era o amor por toda a humanidade. Com o decorrer do tempo, eles acreditaram que existia o amor, que havia pessoas que os amavam de coração, tratando-os como se fossem seus filhos, como o eram de Deus. Muitos já haviam perdido a fé no Senhor, devido ao abandono em que se encontravam e ante os sofrimentos a que estavam se submetendo, muitas vezes, do berço ao túmulo.    

            ... Maria conseguiu, certo dia, reunir todos numa espécie de acampamento e lhes falou com entusiasmo, sentindo todos eles como seus próprios filhos do coração. Ao mesmo tempo, Jesus pregava aos seus discípulos, instruindo-os, na qualidade de Mestre dos mestres, quando fez um intervalo na sua fala, entrando em profunda meditação, a que todos os discípulos respeitaram. O filho de Maria apareceu à sua mãe, que falava à grande assembléia de sofredores. Maria sustou a palavra, deixando o silêncio como ambiente de respeito e suspirou com alegria.

            Jesus, com leve sorriso em seus lábios de luz, disse na faixa que sua mãe registrou com facilidade:

            - Mãe!... Como te quero! O meu coração se alegra, na alegria que ofertas a esses que tanto amo e que deves amar como a mim. Sinto que os teus passos marcam a tua grandeza, distribuindo esperanças aos que sofrem e paz aos atribulados! Entrega o teu coração, como fonte de esperança para os filhos do infortúnio e eterniza tua alegria para a alegria dos que te cercam!

            Mãe, quando quiseres me ver, vem ao encontro destes desprezados da sociedade! Quando sentires necessidade da minha presença, vestes os nus.

            Estou sempre com os que não tem teto e estarei contigo sempre, porque atendes a voz de Deus, no mundo da tua consciência. A paz te deixo, a paz te dou!...

            E desapareceu deixando um perfume embriagador, que se misturou ao das próprias flores do campo, notado por todos os presentes. Maria de Nazaré saiu daquele estado de êxtase, deu um sorriso de satisfação e disse no silêncio d’alma:

            -Graças a Deus!... Estou verdadeiramente no céu, mesmo pisando a terra... Como se enganam os homens e, principalmente, os sacerdotes, buscando Deus e os anjos nos templos suntuosos!

            ... Maria de Nazaré, na sua beleza singular, apoiada em uma grande pedra, sentia-se assentada em cadeira preparada somente para os reis. O conforto se movia no espírito. À sua frente, se encontravam em torno de três centenas de leprosos, ansiosos para ouvi-la. Todos tinham fome de amor e carência de paz. Eles, rejeitados pela sociedade, embora vivessem em comunidade, mais se toleravam mutuamente do que se amavam. Desconheciam o amor, aquele amor na sua expressão divina, de tudo dar sem pedir nada em troca.

            ... E Maria falou a todos eles, conduzida pelo coração:

            - Meus filhos!... Não quero distância de vós! Se assim fosse, aqui eu não estaria; porém, devo falar quem sou, para justificar a minha presença neste ambiente de Deus. Sou a mãe de Jesus, sou Maria de Nazaré!...

            Houve um suspense em todas as criaturas que estavam ali reunidas. Todos já haviam tido notícias do Messias e dos seus feitos; muitos deles tinham fugido, na calada da noite, para ver se encontravam o Salvador. Os que conseguiram, nunca mais retornaram ao ambiente de tristeza e desprezo onde antes viviam, nem para dar uma palavra de consolo aos que ficaram!

            Tomaram um susto muito grande, renovando-lhes a esperança, ao ver a mãe do Mestre frente a frente. Seria um socorro do céu? Por aquele meio, quem sabe, se Jesus não viria até eles? Não sabiam que o Mestre já ali estivera, em corpo espiritual, abençoando-os através de sua querida mãe.

            Maria passou seus grandes olhos em todos e notou que muitos deles choravam, mas de alegria, nascendo em seus corações a esperança de algum dia ver ou, pelo menos, se possível, tocar as vestes do Salvador do mundo. A mãe do Mestre, convicta, tocada pela luz do amor, falou novamente com carinho e confiança:

            - Sou a mãe de Jesus, mas sou também a mãe de todos vós, na mais profunda expressão dos meus sentimentos. Este lugar em que vós encontrais é também o meu lar, porque sei que nele vou encontrar os filhos do meu carinho e aqueles que irão me compreender na posição de mãe do Messias prometido pelas escrituras sagradas. Quero vos dizer o que ouvi dEle e tenho ouvido dos anjos!

            Eu quero vos transmitir o que aprendi na lida da própria natureza. Vós estais afastados da sociedade humana, mas não da sociedade divina. Para nos confortar os corações e vos ajudar a crer na bondade de Deus, existem entre vós, anjos do Senhor, como enviados dEle, em número três vezes maior do que o que representais. Compreendo as vossas necessidades e sinto o que deveis buscar.

            A vida não termina no túmulo! Foi para isso e para outras coisas que o Messias chegou ao mundo: para dizer e afirmar que a vida continua depois da morte do corpo! O que passais pelas chagas é um pequeno testemunho, para mais tarde solidificardes mais fé e limpardes as mazelas da alma, pois que não soubestes aproveitar a liberdade de pensar, de falar e de fazer. Os frutos vêm depois do plantio!

            Sabemos que o mundo está turvado de ódio e de maledicência, empenhado em nefastas alianças e mancomunado com as sombras. Mas Deus, sendo Pai de bondade, de amor e de justiça, não deixa seus filhos se perderem em profundos labirintos; as suas mãos de luz alcançam todas as profundidades e conseguem abençoar todas as criaturas, mesmo as mais infelizes. Jesus é o Messias prometido, como também o Salvador de todos os povos. Ele vem nos mostrar os melhores caminhos que deveremos trilhar, para não cairmos em novas tentações. Ele é a luz que afasta todas as trevas dos nossos corações!... Quem andar com Ele não perderá a direção dos céus...

            Eu quero vos falar muito! Eu posso vos dizer coisas frente às quais a própria dor ficará esquecida, porque vou vos falar em espírito e verdade, como meu filho está falando aos povos de todas as nações. Ele não veio somente salvar os judeus, porém, para abraçar os gentios e samaritanos, gregos e romanos, egípcios e outros povos e raças. A humanidade irá comungar com suas idéias, porque elas são as idéias de Deus!

            Eu vos peço para não vos desesperardes com tantos infortúnios! Eles são premissas de uma vida melhor e de uma paz próxima, como as trovoadas são prenúncios de chuva. Não duvideis da minha palavra, porque elas são vida, que irão modificar vossos corações no aspecto dos sofrimentos e aquele que tiver fé no coração, sem que a dúvida possa manifestar-se em seu peito, verá a luz e sentirá a cura física e espiritual de todas as suas enfermidades!

            O que deveis esperar mais dos homens em termos materiais? Certamente que muito pouco. Quando temos, eles, na maioria das vezes, nos tiram, bem como quando precisamos deles, eles nos desprezam, para que possamos conhecer os verdadeiros valores, os valores do espírito. Vós não sabeis a alegria que me toca neste instante! É uma alegria que vem do coração, que mesmo quem a sente não sabe explicar. Há muitas coisas do espírito que nós sabemos somente sentir. Mas anima a certeza de que todos vós estais compreendendo o que vai por dentro de mim.

            Quero vos falar de muitas coisas que entendo e daquilo que ouvi de pessoas cuja conduta não deixa pessoa alguma delas duvidar. Tenho ansiedade que me ouçais e compreendais que são bem aventurados os que sofrem, pois deles está próxima a paz de consciência; que são bem-aventurados os que são renegados pela sociedade humana, porque deles é o reino da Luz; que bem-aventurados são os que estão distanciados das alegrias humanas e transitórias, porque são deles as alegrias imortais!

            Sei que passam pelos vossos corações sentimentos tisnados pela incompreensão dos próprios familiares! Quantas mães aqui não se encontram, pela incompreensão, apartadas dos seus filhos, maridos e parentes? São muitas, bem sei. Quantos pais fizeram morada no Vale das Flores e não mais viram os seus filhos, mulheres, parentes e amigos, pois todos desapareceram? Essa dor profunda que somente quem ama a entende, vem fazer um trabalho maravilhoso em vossos corações, vem operar um milagre de porte grandioso em vossos sentimentos, vem transformar o apego em desprendimento e o amor em divino, aquele que universaliza todos os sentimentos! Essa dor por que passais é uma escola das mais respeitáveis, porque ainda não foi encontrada outra com tamanhos recursos de burilar as almas, iluminado-as para a verdadeira felicidade.

            Estais mais próximos da luz do que os que trilham nos caminhos do erro, as vezes sorrindo por fora, mas apagados por dentro, por alimentarem o maior entrave à paz de coração: a ignorância. E foi para combater as trevas do espírito que desceu do céu o Messias, com todo o seu fulgor, com toda a sua bondade e amor, e, ainda mais, sendo o sábio dos sábios, para ensinar aos próprios sábios os caminhos do amor. Não vos desespereis!... Nunca vos desespereis em tempo algum, pois o desespero apaga a luz do entendimento e nos desvia das diretrizes da consciência reta.

            Sei que de agora em diante não vai faltar assistência para os vossos corações. Outros companheiros virão com muitos recursos, como eu também estarei convosco, até que a vontade de Deus determine a modificação de minha vida. Tende confiança no soberano Senhor do Universo, que os céus virão à Terra, como se manifesta por essas flores que embelezam esses vales!

            Não queirais colocar-me como diferente de vós, considerando-me uma mulher livre de sofrimentos. Eu sofro também. Sou mãe que deve confiar mais em Deus, porque meu filho, bem o sabeis, tem uma missão espinhosa na renovação do mundo, dentro de uma humanidade que tem ouvidos, mas não quer ouvir, tem olhos, mas não quer ver! Os caminhos por onde ele deve trilhar estão cheios de espinhos, lobos vorazes e dardos sem piedade. No entanto, devo sofrer menos que as outras que ignoram a verdade, porque sou consciente das luzes que já estão se derramando pela boca de Jesus, como sendo palavras de Deus.

            Meus filhos, a vida na Terra é uma passagem rápida, as formas são breves. Porém, a Luz que brilha na carne com essência divina, essa vive na imortalidade, recolhendo experiências e despertando valores para o próprio conforto. A consciência tranqüila é um estímulo santo permanente, que desconhece esmorecimento, porque vive na felicidade contínua, aquela de poder trabalhar no serviço de Deus, na conscientização do amor.

            Agora eu já posso pedir a todos vós, como mãe e companheira, para que não blasfemeis em hipótese alguma. A blasfêmia é um corrosivo da alma, que tira o sossego da consciência. Compreendo que estais afastados das criaturas que chamais de sãos; entretanto, não sabeis que muitos deles são mais enfermos do que todos vós juntos!? Quem não obedeceis às leis de Deus é enfermo de maior profundidade. Se quereis ser curados, restabeleci-vos primeiramente pelos caminhos da educação e da disciplina dos impulsos inferiores, que juntos podereis testemunhar diante dos outros no que já melhorastes.

            Quantas palavras falais durante o dia neste convívio de dor? Centenas, milhares. Já atinaram sobre quantas delas são imprestáveis para a boa conduta? Já meditastes nos pensamentos que surgem em vossas mentes a todo momento, que a boca tem vergonha de transformar em palavras? Pois bem, procurai pensar nisto e começai hoje a vos modificardes! Agora mesmo, neste trabalho divino de mudança, é que as dores e os infortúnios vão sendo esquecidos como que por encanto, devido à nova posição que deveis tomar em nome de Deus, dos céus e dos anjos.

            Se quereis guardar o que ouvis, podeis fazê-lo. Não existe idade que o interesse não supere; não existe condições que a boa vontade não ganhe, quando a dignidade abençoa os bons propósitos. Se sois iletrados, não vos preocupeis, pois podeis fazê-lo somente com o que ouvistes. Ainda mais, existe uma força excelente  que todos sabem usar e se a quereis exercitar, é a oração, ato divino que aprendemos desde criança e que, quando velhos, jamais deixamos de praticar. A prece nos conforta e coloca Deus com mais evidência dentro de nós!

            Vamos esquecer a dor! Não precisais estar no seio da sociedade judaica ou romana, grega ou egípcia, para desempenhardes um papel ante os semelhantes. Onde estiverdes, aí poder trabalhar, viver e amar, como se estivésseis nos melhores lugares do mundo. Se sois portadores dessa doença que repugna os homens, como quereis forçá-los a aceitarem as vossas companhias? É, pois, uma espécie de violência da parte dos que sofrem.  Se não quereis violência para vós, como quereis para eles? Vivei juntos aqui mesmo, até o dia em que Deus determinar, que Ele não deixa seus filhos na orfandade. As suas leis justas sempre põem os iguais a se reunirem. Isso é grandioso, mas o seu amor e a sua misericórdia nos faz nivelar a todos, quando a compreensão ilumina o nosso íntimo com a luz do amor!

            Esta foi a fala de Maria naquele local e naquela época. Acredito que não é preciso mais considerações para vermos como está tão atualizado no trabalho que pretendemos fazer.

Publicado por Sióstio de Lapa
em 28/04/2014 às 00h01