Justamente hoje, dia que Maria visitou Isabel, um momento importante para a nossa atual vida espiritual, faço o relato de ontem quando recebi a visita de G., a garota que fez no passado eu mudar radicalmente o meu paradigma de vida, de manter um casamento com base no Amor Romântico, para um casamento com base no Amor Incondicional, com a inclusão dos amantes que assim se decidirem.
Foi ela que me tentava com seu corpo sensual, com seu decote generoso. Foi ela que lentamente foi quebrando minhas barreiras preconceituosas, inclusive o machismo, pois eu não me permitiria sair com uma pessoa sem dar o mesmo direito a minha esposa.
Ela chegou no Hospital quando eu estava atendendo os pacientes internados. A minha atendente avisou que tinha uma senhora que queria falar comigo. Jamais eu pensava que era ela, afinal fazem cerca de 30 anos que não nos encontrávamos. Quando ela entrou na sala eu achei que era alguém conhecido, achei familiar aqueles lábios, os olhos, o modo de falar... mas foi quando eu vi um encaminhamento que ela me entregou com o nome dela, que veio a minha mente a sua imagem do passado se casando com aquela atual. O tempo foi carrasco com ela. Já não tinha aquele vigor do passado, aquele toque forte de sensualidade. As rugas tomavam conta do seu rosto, os seios mesmo ainda volumosos estavam bem protegidos, contrário ao que acontecia antes.
Li o documento, era um encaminhamento para a psiquiatria, e ela explicava que o recebera pois sofreu um AVC e resolveu me procurar. Eu expliquei que não podia lhe atender, pois ali no Hospital eu só atendia aos pacientes internados, não havia como eu fazer atendimento ambulatorial ali.
Mas eu não podia entregar simplesmente aquele encaminhamento de volta e dizer para ela procurar um psiquiatra na rede pública, pois eu sabia que isso era muito difícil a longo prazo e assim de imediato para atender a sua urgência, era quase impossível. Entreguei o documento a ela e disse que se ela quisesse ir para a Casa de Saúde Natal, poderia ir que eu logo que terminasse o atendimento, por volta do meio dia, iria atender os pacientes do consultório lá, e eu poderia lhe atender antes que chegasse o pessoal marcado. Ela concordou e se dirigiu para lá.
Quando cheguei no consultório encontrei-a me esperando na recepção. Pedi para ela me acompanhar e entramos juntos no consultório. Peguei a história atual dela, que se envolveu com uma pessoa e passou a usar drogas. Conseguiu se livrar das drogas e do companheiro, mas sofreu um AVC e ficou com sintomas psiquiátricos e por esse motivo foi encaminhada para mim. Disse que morava sozinha e que uma filha mora perto dela, que monitoriza a sua vida. Disse que deixou de trabalhar e que não conseguiu se aposentar, pois deixou de pagar algumas contribuições. Fiz as devidas pontuações na sua história, nos seus sintomas... Fiz a receita da medicação e lhe dei as amostras grátis correspondentes. Dei também um atestado de sua condição clínica para que ela procurasse o INSS mais uma vez, pois realmente ela não tinha condições de trabalhar e não tinha nenhum rendimento. Não resgatamos nenhuma memória do envolvimento no passado. Ela fez apenas uma observação, de que eu ficara mais bonito com o envelhecimento. Eu comentei que ela fizera mal ao se envolver com drogas.
Ao final do encontro sai de trás do birô e fui ao seu encontro lhe dar um abraço, demorado. Senti a emoção chegar aos nossos corações, mas agora não tinha o apelo erótico de antes. Pude confirmar com isso que as ações eróticas têm dentro de si as sementes do Amor que nunca se destroem pelo tempo, a qualquer momento elas podem eclodir e o perfume do Amor surgir, mesmo que não exista nenhuma motivação sexual.
Nos despedimos e deixei a abertura para ela me procurar sempre que precisasse. Pelo menos a cada mês devido o acompanhamento da medicação e as exigências do INSS. Fiquei a pensar que, naquele tempo que nós namorávamos, que ela foi o pivô de toda transformação comportamental que sofri; que ela terminou sendo a responsável pelos meus filhos mais jovens, E. e A., pois se não fosse ela eu não teria quebrado a estrutura fechada do meu casamento e não teria entrado numa relação aberta, primeiro passo para eu reconhecer e assumir minha missão frente ao Pai, a criação de uma família ampliada. E mesmo ela não sabendo dessas argumentações da minha mente, a minha consciência a considera como mais um membro da minha família ampliada. Foi mais um instrumento que Deus usou, talvez o primeiro, para eu chegar onde estou.
O passado me visitou e encontrou o meu coração íntegro, justo com quem eu namorei, que eu amei, que eu transei... Não senti aversão pela pessoa envelhecida, ex-usuária de drogas e um tanto esquecida que estava ali na minha frente. A saudade que eu tenho daquele tempo não implica que eu queira agora repeti-lo. Mas ao sentir a saudade, desabrocha o Amor que está como semente no meu coração.
Assim eu posso concluir com bastante segurança:
O passado se conciliou com o presente.
O presente se fortalece na construção do futuro com integridade e coerência.
O Amor jamais te esquece.
Saudade é o Amor que fica.