Sióstio de Lapa
Pensamentos e Sentimentos
Meu Diário
22/09/2014 00h01
TRANSMUTAÇÃO DE GÊNERO

            É ainda sobre o relato do Major Jasão, em consequências da unção que Maria fez em Jesus, citado no livro de J. J. Benítez, “Operação Cavalo de Tróia”, que me surge outra reflexão sobre o papel das mulheres na minha vida. Diz assim o relato na íntegra:

            “Estava já próxima a vigília do domingo quando alguns dos fariseus, até então recolhidos a um prudente silêncio, dirigiram-se a Jesus e, mesmo fazendo abstração do preço do perfume em si, recriminaram-no por haver consentido em que aquela mulher violasse as sagradas leis do descanso sabático. Pelo que entendi, uma das normas estabelecia que uma mulher “não podia sair de casa com uma agulha apta para coser, nem com um anel que tivesse selo, nem com um gorro em forma de caracol, nem com um frasco de perfume”. Se infringisse esse código, ficaria obrigada a pagar e oferecer um sacrifício, para compensar seu pecado.

            Jesus observava, divertido, os sacerdotes.

            - Dizei-me – perguntou-lhes – de onde vindes?

            - De Jerusalém – afirmaram.

            - E como é possível que condeneis uma mulher que caminhou menos de um estádio, enquanto vós mais de quinze?

            Recordei, então, que os hebreus recorriam a um ardil para poder ultrapassar os dois mil côvados, ou um quilômetro, que era o trajeto máximo permitido nos sábados. Jesus sabia que, embora o povo simples pusesse em prática o erub, aos “santos” ou “separados”, presumidos como eram da extrema pureza de sua conduta, não se poderia tolerar que o fizessem. Entretanto, era notório que eles próprios não hesitavam em infringir as leis quando estava em jogo uma boa comilança.

            Os fariseus agitaram-se, inquietos. Mas o Mestre não estava disposto a conceder-lhes trégua. A quase totalidade dos cinco mil membros das comunidades ou irmandades de fariseus de Israel, era constituída de comerciantes, artesãos ou camponeses que careciam da sólida formação dos escribas, mas que, graças à sua rígida observância das normas de pureza e da paga do dízimo, haviam-se elevado acima dos ammê ha’-ares, ou a grande massa dos povos de Israel. Essa vaidade e dureza de coração era algo que o rabi não suportava. E não tardou que o proclamasse em seus próprios narizes, para regozijo dos que temiam a ira dos que se autoproclamavam “o partido do povo”.

            - Ai de vós, fariseus! Lançou-lhes Jesus corajosamente. Sois como um cão num estábulo: nem come nem deixa comerem os bois.

            - Quem és tu – replicaram os representantes de Caifás com seu ar de suficiência – para ensinar-nos onde está a Verdade?

            - Para que saístes a campo? – arrematou o Nazareno -. Para verdes talvez uma cana agitada pelo vento?... Para verdes um homem com vestes delicadas? Vossos reis e vossos grandes personagens – vós mesmos – cobri-vos de vestes de seda e púrpura, mas eu vos digo que não podeis conhecer a Verdade.

            - Vinte e quatro profetas falaram em Israel e nós seguimos o seu exemplo...

            Os comensais voltaram-se para Jesus. Mas o Galileu continuava imperturbável. Seu domínio da situação havia crispado o ânimo dos fariseus.

- Vós falais dos que estão mortos e rechaçais aquele que está entre vós...

E, voltando seu olhar para mim, acrescentou:

- Não sabeis escrutar este tempo.

Uma onda de sangue subiu-me do ventre à face.

Os fariseus optaram por levantar-se, renunciando a continuar com aquela batalha dialética e, entre expressivas mostras de indignação, lavaram as mãos em suas bacias. Mas Jesus não havia terminado. E, antes que pudessem abandonar a discussão, disparou:

- Ai de vós, fariseus! Lavais o exterior da taça sem compreender que quem fez o exterior fez também o interior...

Começava a ficar bem claro para mim porque as castas de sacerdotes, escribas e fariseus haviam-se conjurado para prender e dar morte àquele Homem.

A borrascosa ceia culminou, praticamente, com a saída dos sacerdotes. Quando os convidados já se despediam do anfitrião, Pedro aproximou-se de Jesus e, com ar conciliador, propôs-lhe que Maria fosse apartada do grupo, “já que as mulheres – comentou – não são dignas da vida”. O Nazareno deve ter ficado tão perplexo quanto eu. E no mesmo tom respondeu ao impulsivo discípulo:

- Eu a guiarei para fazê-la homem, para que ela se transforme também em espírito vivente, semelhante a vós, homens. Porque toda a mulher que se faça homem entrará no Reino dos Céus.”

Toda essa disputa intelectual de Jesus contra os preconceitos e a hipocrisia foi empolgante para o meu espírito, mas esse trecho final foi esclarecedor para mim. Fez-me lembrar do passado quando eu saia para passear com minha filha caçula gerada fora do casamento e a minha esposa insistia para que eu fosse passear só com a menina e não levasse também a sua mãe. Eu não conseguia fazer isso, pois a qualidade do meu Amor não permitia. Se a minha filha gosta da companhia da mãe e eu também, que justiça é essa que pede para que não saiamos juntos? Esse talvez tenha sido mais um motivo para o ódio contido que ela alimentou contra mim durante os anos de nossa convivência. Eu não tinha a sabedoria para explicar a justiça de meus atos, como Jesus fez com os fariseus, mas tinha a intuição dada pelo coração do que eu devia fazer, e eu fazia. Jamais neguei a minha filha ou a sua mãe. Mesmo que eu tenha me relacionado de forma clandestina com a mãe da minha filha antes dela nascer, mas estava pronto para assumir o envolvimento desde que eu fosse provocado, mesmo não querendo sair do convívio da minha esposa, como deixava isso claro em todos os contatos e relacionamento que eu desenvolvia. E com o nascimento dela eu de pronto a assumi como pai e informei a minha esposa do que havia sucedido.

É essa mesma força que me leva a agir na atualidade de forma ampla na expressão do Amor, de desenvolvê-lo de forma inclusiva, de deixar entrar todas pessoas que o Pai me apresenta com suas respectivas características, as mais diversas possíveis, mas todas com obediência severa ao Amor Incondicional e não ao amor romântico ou condicional a qualquer circunstância.

Vejo bem o que Jesus queria dizer ao responder para Pedro que guiaria a mulher para fazê-la homem, para que ela se transforme também num ser vivente como um homem, pois fazendo assim ela entrará no Reino dos Céus.

A minha missão também é de dar o mesmo direito que eu tenho como homem à mulher. Do mesmo modo que eu devo amar de forma ampla, geral e irrestrita, obedecendo acima de tudo a Lei do Amor para ser um cidadão do Reino de Deus, assim também a mulher tem o mesmo direito que eu, de ser uma cidadã do Reino de Deus. Haverá uma transmutação de gênero, do feminino cheio de limitações e preconceitos ao masculino com ampla liberdade e compromisso de respeitar Lei do Amor em todas as circunstâncias.

Publicado por Sióstio de Lapa
em 22/09/2014 às 00h01