Parece que a Paz é uma utopia difícil de alcançar, desde que a vida parece oferecer diversos campos de batalha. Para onde eu olho vejo um tipo de disputa, um tipo de guerra... Dentro do meu próprio corpo sei que existe uma batalha incessante, os vírus e bactérias que querem dominar os cem trilhões de células que administro; que elas se organizam fora do meu campo consciencial, produzem anticorpos, aumentam a temperatura, promovem tosse, coriza, etc. No campo dos relacionamentos humanos vejo a luta dos indivíduos em acumular bens e poder e assim provocar subserviência nos outros e cada vez mais provoca maior contraste entre ricos e pobres pela concentração de renda. No campo dos relacionamentos íntimos também existe uma luta surda entre os sexos, cada um querendo se aproveitar do parceiro no que diz respeito à capacidade de reprodução dos gens e a garantia superior da sobrevivência do filho.
A consciência educada com conhecimentos suficiente da mecânica da vida, tanto material como espiritual, pode ser um elemento vigoroso para a conquista da Paz, levando à Justiça amparada pelo Amor em todos os campos da batalha.
No primeiro campo de batalha que corresponde à luta do meu corpo contra os agressores do meio ambiente, devo administrar os meus desejos de prazer com a gula e a preguiça e proporcionar uma alimentação saudável tanto em quantidade como em qualidade. Essa luta depende apenas de meu comportamento, e no entanto eu não obtenho tanta vitória quanto poderia já ter obtido. Não estou numa situação de derrota, sei que ainda estou no campo de batalha lutando para vencer os desejos inadequados para a minha saúde corporal. Estou com sobrepeso, perto do limite da obesidade, e diversos trabalhos que poderiam ser concluídos estão se arrastando com a desculpa simplória da falta de tempo. Sei que realmente sou muito atarefado, mas também sei que algum tempo seria possível desviar para concluir algumas tarefas importantes.
No segundo campo de batalha, dos relacionamentos humanos, eu já consigo contabilizar algumas vitórias. O desejo de acumular bens, aumentar o meu patrimônio, não está assumindo o controle da minha consciência. Pelo contrário, minha consciência está vinculada às lições do Mestre Jesus e todo recurso adicional que conquisto com o meu trabalho, coloco à disposição dos irmãos ao redor e que precisam. Participo de atividades comunitárias onde o trabalho que faço não tem nenhuma remuneração, pelo contrário, coloco o meu dinheiro para ajudar na organização da comunidade e na construção de uma sociedade mais parecida com o Reino de Deus.
No terceiro campo de batalha também considero que estou vencendo os confrontos que surgem. Neste campo de batalha são os meus instintos animais que se defrontam com a minha ética espiritual; são os desejos da carne, de realizar o sexo, de reproduzir, que estão subordinados aos princípios espirituais, de ver sempre em primeiro lugar os interesses do próximo, de não usar a minha força intelectual, financeira ou política para subjugar quem quer que seja a adquirir assim os prazeres desejados. Consigo colocar a motivação que os desejos provocam na aproximação com algumas pessoas e que firmam uma simpatia, a serviço do amor Incondicional. Não é que a possibilidade da evolução desse tipo de comportamento chegar até a intimidade, ao relacionamento sexual e talvez um companheirismo nas bases do amor inclusivo, seja descartado como proibido ou uma forma de tabu. Quem está no comando dessa avaliação, diagnóstico e decisão é a consciência sintonizada com o Amor Incondicional. Caso ela perceba o benefício que o aprofundamento da relação trará aos dois envolvidos, então nenhuma outra barreira terá forças para se impor e evitar esse fluxo do Amor.
Parece que o Plano Divino proporcionou hoje as circunstâncias necessárias para que eu fizesse estas reflexões. Como eu faltei ao trabalho em Caicó na semana passada, hoje sabia que haveria muito paciente para eu atender e que talvez não desse para eu voltar de meio dia, no ônibus executivo. Para reforçar essa ideia a Van que eu viajava baixou o pneu e perdemos quase uma hora nessa troca. Ainda tinha que falar com o dono da Clínica que eu poderei trabalhar a partir de janeiro, foi mais um atraso. Com tudo isso eu não comprei a passagem de ônibus de meio dia e reservei a volta com a mesma Van que sai de 14h. Durante o atendimento chegou uma paciente coma qual desenvolvemos uma simpatia mútua. Ela apresentava uma necessidade e pedia que eu a ajudasse financeiramente, como já fiz de outras vezes. Após ter-lhe atendido e dado um abraço fraterno, sem nenhum tipo de outras intenções, ela olha em meus olhos e pergunta de forma direta:
- O que voce espera de mim, me ajudando assim?
Eu sabia que nessa sua pergunta estava existindo a necessidade de uma confirmação do meu desejo pelo seu corpo. Realmente existe, ela é uma pessoa bem mais jovem, atraente, bonita, simpática e acessível. Mas o que ela não sabia é da existência dos valores espirituais que dominam a minha mente e jamais iria dar uma resposta que ela se sentisse como uma meretriz. Se eu insinuasse qualquer ação sexual, libidinosa, em função dessa ajuda que ela acabara de receber, eu estaria propondo que ela pagasse com o seu corpo o benefício recebido. Mas, no entanto, ela queria uma resposta, não aceitava um tipo de ajuda dessa que ela recebe de mim quase sempre que manifesta suas necessidades, sem algum tipo de contrapartida. Deixei os meus instintos recolhidos no fundo da minha mente e permiti a expressão do meu espírito, assumindo a força do desejo, mas com o controle do Amor Incondicional, e respondi:
- Espero que você ajude alguma pessoa dessa mesma forma, quando no futuro voce tiver condições para tal.
Ela fixou seu olhar em mim, como para perceber se não era uma brincadeira que eu fazia com ela. Quando percebeu que eu falava sério, disse simplesmente um “você não existe” e foi embora.
Como fiquei com tempo suficiente no Posto de Saúde à espera da Van que só vem às 14h, deu tempo de fazer essas reflexões com todos os fatos fresquinhos na memória. Talvez seja essa reflexão que o Pai queria que eu fizesse com este caso.
Qual terá sido o sentimento que minha amiga saiu com aquela resposta que dei para ela? Será que ela se sentiu humilhada por eu não ter valorizado a sua sensualidade, e que tudo que eu estava fazendo ela poderia pagar simplesmente com a entrega do seu corpo para meu prazer? Será que ela se sentiu inferiorizada por não ter despertado desejos em mim, mesmo sentindo que esse desejo poderia haver pelo meu jeito de me comportar? Será que esta minha atitude a deixou mais humilhada que exaltada? Fiz bem ou fiz mal? Minha consciência diz que eu fiz certo. Mesmo que ela pense de forma sofrida, que se sinta humilhada por eu não ter cobrado o seu corpo para o meu prazer, sei que o tempo vai lhe dizer que este foi um dos poucos momentos que ela foi respeitada como um ser humano, e não como um objeto de prazer. Foi uma batalha importante no campo da minha alma, e que senti que venci.
Ao terminar este texto senti também o afago do Pai em minha cabeça enquanto os olhos pingavam de emoção.