Na minha atuação profissional o suicídio é uma consequência que aponta para a minha incompetência, assim penso quando isso acontece. Por que as pessoas que estavam sob a minha influência terminam por se suicidar? Eu não tenho a responsabilidade de prevenir isso por todos os meios que Deus deixou à minha disposição? Por que eu não consigo evitar? Tenho dois casos acesos na minha consciência e que de certa forma apontam minha culpa. Mesmo que eu tenha dado todas as orientações tecnicamente aceitas, que não existem motivos para a justiça dos homens me alcançar. Mas, quanto a justiça divina? Será que eu usei todos os recursos ao meu dispor para evitar isso? Faltou energia para colocar com contundência o que era preciso fazer e não deixar as pessoas envolvidas em suas negações? Faltou eu usar os recursos completos que Deus me deu, inclusive os recursos do próprio corpo, para mostrar ao outro a importância que ele tem frente a Deus e a si mesmo? São esses detalhes que ninguém percebe, mas que está sempre a me deixar constrangido frente a sondagem que Deus faz constantemente em meu coração. O que faz atenuar essa culpa é saber que o próprio Cristo não conseguiu evitar o suicídio de uma pessoa tão próxima dEle, como Judas, apesar de ter trazido da morte tantas outras. Mas essa ameaça sempre está ao meu lado, representado com pessoas próximas a mim, parentes, pacientes ou amigos.
Nestes últimos dias mais uma vez o suicídio se aproxima de mim através de duas pessoas. A primeira já é paciente e desenvolveu comigo uma base de confiança. Sentiu a ameaça chegar em sua mente e ligou para mim. Orientei para procurar de imediato o hospital para se internar e ficar longe de possíveis desencadeadores desses pensamentos, além de usar medicamentos mais fortes que levem a sedação do pensamento e não deixem que eles alimentarem o desejo maléfico. Também orientei para procurar uma ajuda espiritual conforme os próprios espíritos ensinam, e mesmo sendo evangélica, por desenvolvermos uma boa empatia, ela aceitou ir com o marido a essa consulta espiritual e verificar a existência dessas influências e o que pode ser feito nesse campo para complementar a ação dos medicamentos. Sinto que ela está segura no hospital e com uma boa condução para resolver seu problema.
A segunda pessoa é uma amiga que ainda não desenvolveu uma base empática tão boa quanto a primeira. Apesar de me considerar como médico, não aceita a doença, não aceita os medicamentos, não aceita a influência espiritual. Procura ficar no seu isolamento, afogada em lágrimas, com os pensamentos autodestrutivos e sem crítica a lhe cobrir a mente. Está em risco, mas não posso ser mais enfático do que já fui, orientando a medicação e a internação se persiste os pensamentos e ideias negativas.
Como posso fazer para mais tarde não me sentir culpado se o pior acontece? Tenho que ir a cada parente e dizer alto e bom tom, “vocês tem que internar o seu parente!”? Não posso levá-la à força para interná-la, mesmo com a autoridade médica que tenho, isso é papel da família. O tempo passa, ela está em risco, tomando remédios contra a vontade, remédios que não são fortes o suficiente para ela apagar os pensamentos negativos, ela não aceita nenhum tipo de remédio. Alem desses fracos remédios, o outro aliado que tenho para prevenir a auto destruição é o tempo. Mas sua ação também é lenta! A crise é forte e os fatos da existência os alimenta com força e que leva a pensar na destruição de tudo.
Mais uma vez o suicídio duela comigo. De um lado eu estou seguro, as minhas orientações estão sendo seguidas à contento. Minha paciente está internada, sendo cuidada, com remédios apropriados, observada por técnicos. Sei que mesmo assim, se ela quiser mesmo cometer o suicídio, nada disso protege. Ela encontra um meio, mesmo sem dizer nada para mim. Mas pelo menos eu sei que fiz tudo que eu poderia fazer, que usei todos os meus recursos. Com relação a minha paciente estou com a consciência tranquila. Ela aceitou minha orientação, assim como os familiares. Eu a vejo mais serena, o semblante melhorou, perspectivas positivas começam a surgir.
Com relação a minha amiga, não! Não tenho nenhuma segurança e me considero impotente nas circunstâncias que ela se encontra e que deseja estar. O que posso fazer é ficar à disposição, à distância, e rezar para que Deus aumente os efeitos dos fracos remédios e que o pouco tempo seja capaz de transformar os sentimentos. O suicídio nesse caso tem mais aliados do que eu, principalmente as trevas da ignorância. Tenho somente um remédio fraco e um tempo curto.
Por tudo isso peço a intervenção de Deus. Ele sabe que já fiz tudo que minhas condições permitem. Que Ele proteja seus filhos que se encontram perdidos na escuridão, que não os deixem cair no precipício da destruição dos corpos que deixastes sob a responsabilidade deles... eles não sabem, Pai, o que estão fazendo!