A cultura mostra uma obra literária que fala de duas personalidades que se expressam numa mesma pessoa, o livro “O médico e o monstro”, que deu inspiração pra diversas obras no cinema e na literatura.
Todo esse fascínio é porque essa condição parece existir dentro de nós, uma personalidade que poderíamos classificar como boa e outra que tem aspectos mais egoístas, mais voltadas para o mal.
Fui fazer um atendimento médico particular na residência de um paciente que se encontrava acamado, obeso, doente mental. Notei que a casa era de muita pobreza, mesmo assim a família fez um esforço para pagar essa visita a fim de ser produzido um laudo que a justiça exigia. O Estado devia oferecer esse serviço aos cidadãos, afinal todos pagamos impostos para termos esses serviços essenciais à nossa disposição. Mas isso não acontece. A pessoa peregrina por todos os postos de saúde da cidade, do estado e não consegue ser atendido. A solução é ir em busca de um profissional como eu que se disponha a atender, em casa ou em consultório, pagando os honorários correspondentes.
Foi nesse momento do recebimento do valor acordado, que veio à minha mente essa reflexão, do esforço que a família estava fazendo para obter esse serviço. Senti que a crítica partia de outro aspecto da minha personalidade que se contrapunha a ação do médico. Parecia que um Francisco, espiritualista, dizia que esse era um ato errado, e criticava o Dr. Rodrigues, médico.
Sai daquela casa com essa reflexão: quem estaria certo, o Francisco espiritualista ou o Dr. Rodrigues.
Então continuei refletindo... ora, quem foi até aquela casa foi o Dr. Rodrigues, que pegou o seu carro e se deslocou de um extremo ao outro da cidade. Para fazer isso o Dr. Rodrigues gastou anos de estudo em Universidades, economizou dinheiro, comprou um carro, dois, e frequenta congressos e compra DVDs para se atualizar em sua área. Tudo isso só funciona se tiver o dinheiro, inclusive para viver com dignidade e colaborar com a família, com amigos, e com qualquer que seja o próximo necessitado. É esse Dr. Rodrigues que faz funcionar a máquina materialista em benefícios amplos com quem está ao redor. Sei que o Francisco espiritualista é importante, faz com que eu não fique bitolado apenas nos ganhos materiais e não veja o lado da solidariedade. Eu sei que é o Francisco espiritualista que faz o meu contato com Deus, é quem faz me agir de acordo com a vontade de Deus instalada na minha consciência. É ele que me faz compreender que tudo que possuo pertence ao Pai, e que eu sou apenas um administrador.
Então, quando eu faço um serviço dessa natureza e que recebo meus honorários, não estou explorando a miséria de ninguém, pois é um valor justo dentro do trabalho que vou realizar, e que se esse dinheiro tivesse ficado com a família, provavelmente fosse utilizado em coisas menos nobre do que eu utilizarei. Sem falar dos diversos serviços paralelos que eu forneci sem cobrar, como fazer receitas e dar atestados, que estava fora do nosso trato.
Assim deve essas duas instâncias da minha personalidade, o Francisco espiritualista e o Dr. Rodrigues, funcionarem harmonicamente, pois ambas fazem a vontade de Deus, cada uma atuando em caminhos diferentes, mas paralelos.