Eu ia dirigindo para o trabalho quando meu carro emparelhou com um camburão da polícia. Vi que dentro dele, na carroceria ia um jovem adolescente sentado, com o rosto machucado, que parecia estar amarrado, pois eu não conseguia ver suas mãos. Mas vi o seu olhar desolado, melancólico a contemplar o mundo rápido que passava ao seu lado e se perdia na distancia, já que ele viajava de costas para a frente do carro. A inexpressividade do seu rosto era muito expressiva! Era como se dissesse, “que estou fazendo neste mundo? Nada disso me pertence, eu não tenho nada, não tenho ninguém, não sou de ninguém.”
De tantos carros que passavam ao seu lado, o meu carro era mais um, perdido na indiferença da sua vida. Eu sabia, ele também, que seu destino era a delegacia, uma cadeia... constrangimentos? Acho que não. O que para mim seria constrangimento, para aquele rosto massacrado pela vida talvez não passasse de mais um estímulo que não alcançava mais o seu emocional.
Foi nesse momento que surgiu na minha mente o compromisso que tenho com Deus de construir uma família ampliada com base no amor incondicional. A minha visão do mundo deve ser diferente da visão comum. Aquele jovem que era conduzido daquela forma, talvez tenha feito por merecer tal castigo. Mas onde estão os pais dele que talvez tenham errado na forma de educar? Talvez nem eles mesmos tenham sido educados para serem cidadãos, quanto mais pais? Portanto, a minha visão adquiriu a coerência dos meus ideais, da minha missão, do meu compromisso com Deus. Passei a vê-lo com os olhos de um pai. Era meu filho que seguia naquele camburão. Esse pensamento fez despertar no meu emocional energias da sensibilidade que fez marejar os meus olhos. Pensei que o meu papel era seguir aquele camburão até a delegacia e procurar saber o que aconteceu, tanto da visão da polícia como do meu filho. Era isso que eu teria feito se qualquer um dos meus filhos biológicos estivesse naquela condição. Mas para aquele jovem, o meu pensamento estava ainda muito distante da ação. O único efeito que fez foi derramar algumas gotas de lágrimas, mostravam que eu não estava indiferente emocionalmente aquela situação.
Depois eu fiquei a refletir sobre a situação. Tudo foi mais um teste de Deus para sondar o meu coração. Ele viu que eu ainda estou muito distante da teoria de Seu Reino de paz e amor para a prática que eu posso realizar aqui na Terra para cumprir a sua vontade. Era a vontade dEle que eu tivesse feito como pensei, tivesse seguido aquele camburão e me inteirasse da situação. Poderia chegar atrasado ao trabalho, ou mesmo faltar, eu conseguiria justificar. Poderia saber a situação daquele jovem e procurar fazer a harmonia entre sua família biológica e as leis da comunidade. Poderia contribuir para compensar os prejuízos que ele causou e assim atenuar sua pena. O Pai esperava que eu, como pai, não deixasse um filho caminhar na indiferença para um destino obscuro.
Falhei com o Pai e Ele percebeu o quanto ainda sou frágil para realizar a Sua vontade. O que me salva de ser considerado como um hipócrita é porque Ele percebe que o meu coração está realmente sintonizado com a mensagem que meus lábios defende, mesmo que eu ainda não tenha forças ou coragem de colocá-las em prática.
No momento do acontecimento eu não tinha essa consciência de que estava sendo minuciosamente examinado pelo olhar atento do Pai. Jamais pensei que aquela lágrima que deixei cair naquela ocasião foi o livramento da minha alma frente ao julgamento divino do Pai.