Voltei a hidroginástica na aula seguinte. Refiz os mesmos passos daquele fatídico dia que poluí a praia. Ainda tinha certo temor na alma, de que o Pai me pusesse à prova em outro teste de igual sofrimento. Não, Ele não apresentou nenhum teste dolorido para mim dessa vez, mas Ele observava meu comportamento como se tivesse testando a garantia do que eu havia prometido naquele dia. Da mesma forma que o comprador de qualquer objeto tem um determinado tempo de garantia para que se não for atendido naquilo que foi prometido possamos devolvê-lo, o Pai também estava testando a garantia do perdão que eu disse que tinha aprendido com a lição que me foi dada. Vim perceber isso no justo momento que estava caminhando de volta para casa.
Vi novamente fezes, principalmente de animais no trajeto, mas não despertou em mim nenhuma revolta como antes. A crítica revoltada que se instalava de automático na minha consciência havia sido substituído por uma procura do que eu poderia fazer para atenuar a situação. Mais adiante vi um senhor conduzido o cão pela coleira e este tentando se agachar para defecar. Vi que o senhor não estava conduzindo nada que pudesse limpar a sujeira, e seria mais um monte de fezes no trajeto da praia. Não senti nenhuma revolta por aquela pessoa permitir isso, mas sim compaixão pela ignorância do mal que ele estava fazendo. Usei a minha inteligência para ver como eu poderia ajudá-lo a compreender o mal que estava sendo feito, sem ofender a sua honra de cidadão até mais idoso do que eu. Refleti que eu poderia comprar saquinhos plásticos de recolhimento de fezes, como eu já faço com a compra de saquinhos de biscoitos para cães e levo sempre que lembro um ou dois para dar a cadela vizinha do meu apartamento que está sempre grávida ou em aleitamento. Também eu poderia sair com esses saquinhos de recolhimentos de fezes e numa situação como essa eu poderia chegar perto do dono do cão e oferecer, com educação e respeito, um saquinho ou dois para ele recolher as fezes do seu animal e depositar no local apropriado.
Sei que vai ser mais um aprofundamento das minhas lições espirituais que o Pai está intuindo em minha mente, deixando que ela trabalhe com essas reflexões, pois Ele sabe da minha dificuldade de comunicação, do quanto eu tenho bloqueio de dizer um simples bom-dia a um transeunte desconhecido que cruza comigo na caminhada. Agora está sendo proposto eu abordar um cidadão que não conheço, falar com educação e respeito sobre um assunto que pode lhe ofender; vai ser necessário mais um esforço da minha alma.
Parece até que essa hidroginástica que procuro fazer com regularidade para melhorar o meu corpo está se tornando também outro campo de exercícios, dessa vez exercícios espirituais para melhorar a minha alma. Da mesma forma que acontece dentro d’água onde os exercícios vão ficando cada vez mais complexos e exigentes, a minha alma cada vez mais vai sendo exigida para domesticar os valores egóicos do meu corpo.
Enfim, acredito que eu tenha passado no teste de garantia que o Pai estava verificando quanto a qualidade da minha capacidade de perdoar. Vejo agora os erros dos irmãos sem as murmurações de antes, e a vontade de ajudar, de atenuar o mal que foi feito sem jogar críticas ao ar, prevalece. Talvez seja um tipo de promessa que minha alma está engendrando, o pagamento não por uma graça recebida, mas de uma culpa perdoada.
Com tudo isso que aconteceu não consigo explicar bem claro os meus sentimentos quanto este comportamento de exposição de minha caixa preta. Minha alma não quer glória e o meu ego não quer desonra. Então, parece que minha exposição nesse episódio não atende nem a um nem a outro. No entanto sinto ter alcançado um grau maior de espiritualidade com esse sacrifício da minha honra. Adquiri uma melhor qualidade de perdoar que antes era ainda muito cheia de murmurações contra os atos errados dos meus irmãos. Peço apenas a quem tenha tido oportunidade de ler esse texto que se esforcem acima de qualquer sentimento negativo ou positivo que lhes venham à mente, que tenham compaixão do meu ego, aviltado pelo que meu espírito me obrigou a fazer. Não tenho coragem de ler para ninguém esse texto como fiz com outro parecido, onde também fui humilhado, mas que não prejudiquei a ninguém, e pude até usar o humor com a sua descrição. Dessa vez foi diferente, eu poluí a praia, causei dano à Natureza e a qualquer pessoa pelo simples fato de observar o mal que foi feito. Que seja o Pai que conduza a quem precise ou mereça a leitura desse texto, antes que mais adiante ele integre o livro que pretendo publicar. Mas nesse caso o tempo terá atenuado o peso da minha culpa. O mais importante de tudo isso, acima da vergonha, ignorância e covardia que ainda tenho é que me sinto em sintonia com o Pai.