Jesus ensinou no término do Sermão da Montanha que: Bem-aventurados sois vós, quando vos injuriares e perseguirem e caluniosamente disserem de vós todo o mal, por minha causa; alegrai e exultai, porque grande é a vossa recompensa nos céus. Pois do mesmo modo também perseguiram aos profetas que antes de vós existiram.
Para o homem egóico e ainda profano, a alegria na tribulação é algo absurdo e sem nenhum sentido. Alegrar-se quando perseguido? Exultar-se quando injuriado? Sentir-se feliz quando caluniado? Para o ego tudo isso parece impossível, uma loucura. Mas, só poderia ser, pois o ego, além de outras mesquinharias, sofre de ofendismo agudo e de ofendite crônica.
O ego é realmente muito frágil e sofre por qualquer coisa que lhe cause alguma resistência. Logo, para que alguém possa alegrar-se no sofrimento e bendizer a dor, é preciso que mude radicalmente de perspectiva, abandonando sua posição inferior e ultrapassando os domínios da mente, bem como das emoções e prazeres descontrolados, elevando-se assim, às cumeeiras de sua natureza crística ou racional.
O homem que vive na intimidade qualificativa e crística do Eu, não mais se contamina com as fraquezas do ego externo, fraquezas físicas, emocionais e mentais. Ele nada espera, nada receia e tudo aceita com a mais perfeita calma e serenidade. É a esse homem que o Cristo se dirige, é a ele que se destinam as palavras que o Cristo colocou na boca de Jesus, é para ele que foi dito o Sermão da Montanha. Um homem desse naipe não somente se alegra, mas se glorifica no sofrer por amor ao Cristo, dá a vida por esse amor e, por isso mesmo, vive além da vida, vive uma vida tão abundante e fecunda e perfeita, que não há palavras que possam descrevê-la.
Um dos homens que mais se notabilizou por sofrer com alegria em nome do Cristo, entre tantos santos e tantos mártires e profetas caluniados, perseguidos e torturados, foi Paulo de Tarso.
Paulo é, antes de tudo e por todos os títulos, o “apóstolo dos gentios”. Foi ele que, com suas viagens, sempre conturbadas e cheias de peripécias, lançou as primeiras sementes de um cristianismo universal, sacando-o da estreiteza de Jerusalém e da noção mesquinha de um povo eleito. Foi ele que, com suas magníficas epístolas, arquitetou, mesmo à distância e geralmente morando em prisões, a unidade da igreja recém-nascida.
“Regozijo-me de júbilo em meio às minhas tribulações” – disse ele. Nunca uma simples frase resumiu tão bem a vida de um homem. Neste caso, ela é uma verdadeira síntese biográfica e vale como um testamento espiritual. A vida de Paulo é, de fato, toda ela, um rosário interminável de dores e uma longa cadeia de martírios. Dizem até que o seu corpo era um mapa de cicatrizes, por causa da violência a que era submetido, seja por cristãos, para quem Paulo não passava de um lobo em pele de cordeiro, seja, sobretudo por judeus, que o consideravam um desgraçado e miserável traidor! Também os romanos pensavam ter motivos para maltratá-lo. Por sinal, foram eles que o decapitaram.
Mas, em toda sua odisseia, Paulo foi sempre um homem muito feliz.
Ruberto Rohden, impressionado com a estatura espiritual desse homem, escreveu: “Paulo de Tarso morreu como viveu, sozinho... sem uma lágrima de amigo... sem um gemido de mulher ou filho... sem um carinho de mãe ou irmão... sem uma alma que lhe recebesse o último olhar... sem um coração que acompanhasse as derradeiras pulsações do seu coração... Ele só... com Deus...”
Só?...
Não tenho medo de seguir também neste caminho... também sinto-me feliz na solidão do meu apartamento, mesmo sentindo o peso da ingratidão, da incoerência, do ressentimento e até da ira de pessoas que tanto amo! Sinto que estou sempre com Deus e procurando fazer a Sua vontade. Por isso, mesmo morando sozinho como Paulo sempre viveu, eu repito a interrogação feita na causa dele:
Só?...