Estava animado para aproveitar o dia 13-05 e me libertar das cadeias internas, do jugo da preguiça e da gula. Pensava que não era tão fácil, mas que eu poderia conseguir, mesmo porque eu sentia que o Pai estava na torcida por mim. Ledo engano! Falhei vergonhosamente à primeira visão que tive da carne de charque, bem assadinha, cortada em miudinhos... como a me chamar. Agora estou aqui, digitando mais uma vez essa questão da escravidão e agora com a certeza que continuo sendo escravo e que essa libertação é mais difícil do que aquela libertação física que Zumbi conquistou ao fugir para Palmares. Eu não posso fugir de mim, onde eu estiver, ali estarei eu com todas as minhas cargas de vícios e defeitos.
Olho para frente e vejo a responsabilidade que o Pai colocou em meus ombros, e olho no espelho e vejo uma figura frágil sem forças para o enfrentamento do próprio egoísmo, quanto mais o egoísmo de terceiros. Antes de seguir em busca de retirar o cisco do olho dos irmãos, eu não consigo tirar a trave que está no meu. Pelo menos eu tenho a consciência disso, que tenho uma trave no olho e que devo retirá-la.
Lembro-me de Moisés que foi convocado por Deus para uma missão que ele sabia que não tinha forças suficientes para cumpri-la, não sabia nem falar. Deus, no entanto, falou com ele, incentivou-o e colocou o seu irmão Aarão para ser o seu intérprete frente ao Faraó. Mas se eu não consigo esse tipo de contato com Deus? Não consigo vê-lo ou escutá-lo? Posso estar agora simplesmente delirando sobre conjecturas que não se apoiam na lógica da realidade material?
Este corpo que Deus me deu, tão saudável, vigoroso, é, no entanto, um exímio carcereiro. Eu não consigo ver ou ouvir nada do mundo espiritual. O que eu aprendi do mundo espiritual foi simplesmente devido o uso da lógica frente os fatos e argumentos ao meu redor. Esta mesma lógica é que me aponta a condição de escravo. Sei da importância do meu espírito, que ele está encarnado neste corpo físico para aprender a administrar os diversos desejos que ele emite, sem prejudicar a minha evolução, tanto no ponto de vista material, quanto do ponto de vista espiritual.
Sei o que devo fazer para executar o comportamento necessário para a evolução do espírito. Basta usar a ferramenta da vontade para eu quebrar as algemas da escravidão ao corpo físico e construir novos esquemas comportamentais necessárias à evolução do espírito. Mas não consigo sucesso. A minha vontade de fazer o que é importante, logo fracassa frente aos desejos do corpo.
Tenho um monte de tarefas para realizar, mas o peso dessas duas faltas faz um prognóstico ruim do meu sucesso. Vejo com pessimismo tudo que fiz até agora. Estou numa posição social anômala frente à prática “normal” que vejo ser executada pela maioria. Moro sozinho, com os entes queridos à distância, pois a forma deles pensarem e agir não tem afinidade com a minha forma de pensar e agir.
Meu espírito está preso na senzala organizada pelo meu corpo. Mesmo que eu tenha toda essa compreensão, não consigo a liberdade do meu espírito. Rogo a Deus que me dê forças e sabedoria, pois não consigo sozinho sair desse labirinto de desejos e emoções, de desvios e de quedas.