Saulo de Tarso, quando jovem, considerava que o seu temperamento era um espinho na carne e que seria sempre assim. Ele procurava amar a Deus sobre todas as coisas, e chegava a odiar a humanidade por ser tão pecadora, promíscua. Seu pai certa vez, conversando com um rabi, amigo, colocava suas preocupações quanto ao futuro do filho: “Só sei que o próprio Deus disse que não é bom para o homem viver só, sem companheira. Ele criou Eva para Adão. Moisés tinha mulher. Os profetas também. Como meu filho ousa, então, dizer que não se casará, que dedicará a vida unicamente a Deus? Com essa decisão, não violou as verdadeiras Palavras de Deus? Um homem que serve a Deus também é humano e Deus não apenas proveu as suas necessidades, mas ordenou-as como um dever”.
O seu amigo rabino retrucou: “Há uns que só podem servir a Deus sem serem distraídos, mesmo por uma mulher e filhos encantadores. Não são muitos, mas os conhecemos e decidimos não denunciá-los. São mais fracos que nós? Ou mais fortes? Não sabemos. Nós, rabinos, casamos; nem por isso servimos menos a Deus, tendo mulher e filhos. Frequentemente, nossas mulheres nos encorajam, pois é um caminho solitário, sombrio, amargo e silencioso o que um homem trilha sem mulher. Uma boa mulher muitas vezes nos aproxima de Deus. Mas há outros cujas almas estão tão cheias de Deus que não há espaço para o amor humano. São raros. Mas também os conhecemos. Não ousamos recriminá-los.”
Eis o espinho na carne de Saulo, viver sozinho, sem a companhia de mulher e filhos, por se afastar delas tentando ao máximo se aproximar de Deus.
Posso considerar também na minha carne um espinho parecido, também vivo só sem a companhia constante de mulher e/ou filhos. Porém não é porque me afasto das mulheres tentando me aproximar de Deus, pelo contrário. A missão que Deus me deu foi a de me aproximar o máximo possível, de todas que Ele coloca no meu caminho, respeitando e obedecendo a Lei do Amor Incondicional. A consequência seria eu viver na companhia de várias mulheres, incluindo outros companheiros que elas tivessem interesse em conviver, junto com os filhos de todos, formando a família universal. No entanto, os instintos poderosos da animalidade, respaldados pelos sentimentos egoístas, trazem logo o ciúme para o contexto e assim a intolerância surge e a separação se torna inevitável.
Este é o espinho que devo tolerar na minha carne, a condição de viver sozinho sabendo do paraíso terrestre que um dia iremos construir quando conseguirmos formar a família universal. Este papel de bandeirante nas selvas do egoísmo para resgatar no fundo da alma de meus irmãos humanos, a centelha do amor que o Pai nos legou, tem como consequência a minha solidão, o meu espinho na carne. Somente o amor do Pai e a certeza de que estou tentando fazer a Sua vontade neste projeto, é que me dá forças para ir em frente sem olhar para trás