Conheci uma lenda escrita por Taylor Caldwell em seu livro “O grande amigo de Deus” que dizia o seguinte:
Quatro homens foram a um banquete para o qual tinham sido convidados. Um fora de má vontade, mas havia sido convidado pelo rei e não podia recusar. Tinha pouco apetite para os pratos ricos e temperados e para o vinho e teria ficado satisfeito com um pouco de pão, queijo e leite. Era um homem em quem os fluidos da vida não corriam fortes. O segundo comeu com bastante apetite, que, no entanto, era grosseiro; como não fosse muito inteligente, não usufrui a conversa erudita em torno dele. Ficou entediado. Pensou com saudades nas suas dançarinas ausentes. Assim, sentiu-se insatisfeito, ofendido, bocejando, nada encontrando de interesse à sua volta. O terceiro divertiu-se e esperou que o banquete continuasse até o amanhecer, pois os pratos eram deliciosos, o vinho inebriante e lamentou que aquilo finalmente acabasse, ficando triste em certos momentos ao pensamento da rápida passagem daquelas delícias.
E o quarto homem ficou satisfeito por ter sido convidado para o banquete e agradecido ao seu real anfitrião, pois tudo em volta dele era beleza, música, vistas majestosas, que comoviam sua alma. As carnes, as frutas, os pães, o vinho permaneciam agradavelmente em seu paladar. Suas reflexões excitaram-se com as trocas de ideias e sua mente ficou acesa, participando da conversa com estranho prazer. Não lamentou por aquilo ter de acabar. Sabia que teria, mas era suficiente sua permanência momentânea. E sua gratidão ao anfitrião aumentou muito com isso. Sentiu-se realmente acolhido pelo mais solícito dos amigos e seu coração transbordou.
Ora, o primeiro homem, que não tinha muita inclinação pela boa comida, nem mesmo a reconhecendo como tal, resolveu pedir licença para sair. O rei ficou triste, mas deu-lhe permissão. O segundo estava farto, pois tinha comido e bebido demais, bocejava de enfado, não ouvira a música nem ela lhe interessava e queria dormir. Também ele pediu permissão para partir e o rei, ficando mais triste, consentiu. O terceiro protelou, na esperança do banquete não terminar, olhado a espera de novos prazeres nos pratos e mãos dos criados, embora seu rosto começasse a demonstrar cansaço e suas mãos tremessem de fadiga. Ficou olhando entre as colunas, temendo ver a manhã. O rei, observando-o, suspirou e disse-lhe: ‘Meu hóspede, já é tarde. O senhor deve partir.’ O convidado tentou protestar, mas o rei, gentilmente, fez-lhe ver que precisava erguer-se e partir, o que ele fez, chorando, embora exausto.
Mas o quarto homem, foi subitamente atacado por uma sensação de pena e vazio, deixando de se interessar pela música e pelos sorrisos dos amigos, desejando apenas deitar-se em algum lugar escuro e silencioso, sem querer saber de mais nada. A comida e o vinho haviam se tornado repugnantes para ele. seu desejo desaparecera sem que ele soubesse por quê. Uma enorme solidão o envolveu, uma sensação de abandono e de nada mais desejar, não, nada mais no mundo inteiro, nenhum prazer, e ficou desolado. Sentiu uma dor no coração. Ao sentar-se no sofá, achou que ela estava acima de suas forças; perdeu a fala. ‘Estou empanturrado. Comi demais’, pensou. ‘O banquete tornou-se intolerável para mim.’ O vinho sabia-lhe a vinagre. As vozes dos amigos doíam em seus ouvidos. ‘Nada mais desejo’, pensou, imaginando se o rei iria achar descortês se ele pedisse para retirar-se. Tudo havia perdido cor, beleza e significado para ele.
Foi então que o rei olhou-o e disse: ‘Seus três amigos já foram. Deseja também retirar-se?’
Como podemos compreender essa lenda?
O rei convidou seus súditos para um banquete, divertindo-se em suas companhias. O primeiro em nada tinha na alma com que corresponder, ou teria atenuado sua reação com um comportamento modesto e a recusa de olhar a beleza da vida à sua volta, uma vez que tinha perdido a capacidade de vê-la. Por isso deixou o banquete cedo. O segundo tinha-se empanzinado cedo demais, comera vorazmente e assim quando não conseguiu comer mais, não ficou quieto e contemplou a graça em torno dele, pois todos os seus apetites tinham sido grosseiros na vida e acreditava que, uma vez empanzinado, só lhe restava partir com o prazer do corpo e não da mente e por isso não ouviu a conversa nem sabedoria. Assim, para que permanecer?
O terceiro homem temia o fim do prazer, pois saboreara a vida descuidadamente, usufruíra o banquete real e não podia ter-se agarrado bastante a existência nem vivido o suficiente, embora estivesse paralisado e precisasse de descanso. Temia a manhã porque esta significava o fim do banquete e porque nada tinha para ele. por isso chorou quando o rei se compadeceu e sugeriu-lhe que partisse para onde pudesse deitar e descansar, ele que odiava repouso e tranquilidade.
E o quarto homem, grato ao rei pelo convite para o banquete, tendo se divertido nele, e se encantado com o gosto, cheiro, tato, som e visão, a princípio pensou que o banquete era delicioso e sua gratidão aumentou, adorando o rei por sua extrema bondade. Mas uma nuvem e uma angústia o envolveram, escurecendo sua vista. Mas relutou em pedir ao rei que lhe permitisse partir, pois não desejava parecer ingrato, apesar de tudo ter-se tornado enevoado, penoso e cansativo para ele. Contudo, o rei apenas lhe perguntou: ‘Também deseja retirar-se? Sua companhia me agrada e quero que se demore; assim, fique comigo e não peça para ir embora. Sei que está cansadíssimo. Sei da tristeza em sua alma e sou o único que sabe. Mas o convidei e sei por que o fiz. Portanto, fique.’
O grande rei sabe porque convidou Seus filhos para o banquete e ficou triste quando o primeiro não gostou, por culpa exclusiva do convidado; sentiu que o segundo apenas pensou em comer e depois, com ingratidão, nada mais quis, nem mesmo Sua companhia. O terceiro, sem conter-se, demorou demais, pois tinha medo e vivera apenas para o prazer e para a satisfação do eu, mas seu prazer era somente o de um animal e não o de um homem. Assim, por pena, o rei liberou-o.
Quanto ao quarto homem, o Rei quis que ele permanecesse um pouco mais fazendo-lhe companhia. O Rei não obrigou. Apenas pediu: era demais concordar com o pedido até Ele ficar satisfeito e depois solicitar-lhe que partisse?
Por que o Rei por piedade não libertou o último homem? Talvez porque Ele seja piedoso. Ele é o Rei. Conhece Seu banquete. Tem Seus motivos.
Essa lenda coloca os motivos que aqueles filhos de Deus que se sentem desamparados, sozinhos no mundo, sem mais nenhum projeto ou motivação e que pensam na morte, no suicídio, possam fazer suas reflexões. Os três primeiros convidados podem cometer o suicídio, cada qual ao seu modo, porém o quarto, Deus quer que ele permaneça no banquete da vida terrena, pois ele sabe reconhecer todos os atributos da divindade no seio da Natureza da qual ele participa. Deus sabe que algum motivo interferiu em suas emoções e fez com que toda a beleza que ele tanto reconhece, perdesse o valor frente o cansaço que se instala. Este pedido de permanência que o Pai faz ao filho sofredor é no sentido de lhe oferecer uma chance de reconhecer o desvio por onde sua mente entrou e corrigir seu trajeto. Sabe o Pai que os seus filhos coerentes e conscientes desfrutam do banquete da vida com toda a disposição e agradecimento, e fazem à Sua vontade em qualquer momento de suas vidas, na infância ou na velhice, na alegria ou na dor. Quando Ele recebe um pedido para se retirar do banquete antecipadamente é porque sabe que algo interferiu com a sanidade da sua alma querida.
Eu sou um dos Seus filhos, que O reconhece como Pai e que procuro fazer a Sua vontade, por mais estranho que o caminho me pareça e aos outros que junto comigo convivem. Ele permitiu que eu me capacitasse em técnico das emoções, em saber como funciona as suas percepções tanto à nível do corpo e da mente, como à nível da alma. Tenho portanto essa tarefa profissional de chegar junto dos meus irmãos e tentar corrigir seus pensamentos alterados que fazem sua retirada precoce da vida, seja qual for o perfil de convidado que essa pessoa tenha no banquete da vida. Posso usar os recursos da química com os diversos medicamentos chamados psicofármacos, assim como os diversos recursos da psicoterapia, e principalmente o incentivo à reforma íntima com base nas lições evangélicas.