Sióstio de Lapa
Pensamentos e Sentimentos
Meu Diário
05/07/2015 23h59
MARIA, MÃE DE DEUS?

            Existe uma crítica muito severa que dura vários séculos e que já foi motivo de conflitos conceituais dentro da igreja católica. É a questão de Maria, Nossa Senhora, ser ou não a mãe de Deus. Por uma questão de lógica, Deus como ser supremo, incriado, que sempre foi formado, Deus não pode ter sido criado por ninguém.

            No livro de Taylor Caldwell, “O grande amigo de Deus”, ocorre um diálogo quanto a isso que mostra a opinião de Paulo e de certo modo a opinião da igreja que o venera:

            Como Elias foi levado para o Céu no carro de fogo – disse Barnabé – e Nosso Senhor ascendeu perante nossos olhos, também Maria  subiu quando morreu na casa de João. Estávamos lá quando ela faleceu e foi amortalhada, ajoelhamo-nos junto do seu leito, rezando, ouvindo-se repentinamente um barulho enorme, maior que qualquer trovão, pois sacudiu a pequena casa, viu-se um a luz mais forte que a do sol e caímos de rosto no chão, mudos, cegos e sem sentidos. E quando nos erguemos, aturdidos, o leito estava vazio, com apenas um resplendor de luz nele, que esmaeceu enquanto o olhávamos.

            Saul ficou instantaneamente incrédulo, embora os outros tenham curvado as cabeças, ficando de rostos iluminados.

            - Como! - Exclamou. – Uma simples mulher recebeu honra tão divina! Não acredito. Voce estava louco de dor e desejando muito um milagre...

            - Por que então – perguntou Barnabé – seu corpo desapareceu?

            - Quem sabe? – respondeu Saul, encolhendo os ombros. – Os que queriam um milagre ou desejavam mostrar coisas sobrenaturais levaram-na enquanto voce estava meio aturdido

            Subitamente. Lembrou-se ter proferido palavras semelhantes quando seu primo Tito Milo lhe contara a ressurreição do Messias. Mas encolerizou-se. Que tinha uma mulher, uma simples mulher, a não ser dar seu corpo virgem ao Senhor? Apesar de Lia, Judite, Raquel, Rute e Sara, amadas por Deus, tivera favores tão divinos. Ele havia rezado inúmeras vezes no túmulo de Raquel em Jerusalém e pensou que , apesar de sua excelente nobreza e grandeza, ela morrera e apodrecera como milhares de mulheres antes dela. Era verdade que Maria tinha sido escolhida entre todas as mulheres para dar nascimento ao Messias e O cobrira com sua carne, deu-Lhe seu sangue e seu leite, mas fora apenas, como Lucano lhe dissera, “a criada do Senhor”, uma humilde moça galiléia, embora da casa de Davi. Não passara de uma mulher, de pouca confiança, o rio no qual a Graça tinha viajado como uma nave branca. Quem honrava as águas que conduziam a velas e o Passageiro?  O rio não passava do caminho inevitável.

            Foi aí que uma fria tristeza espalhou-se pelos rostos das visitas.

            - Voce esqueceu – disse Barnabé. – Mesmo Deus esperou seu consentimento – daquela mocinha recém-saída da puberdade – para gerar Seu Filho! Aquela menina virgem fora anunciada havia séculos. Ela nutriu Deus em seu seio, ensino-O a andar; ouviu Suas primeiras palavras infantis. Fez Suas roupas; embalo-O nos braços; conversou com Ele como só as mães sabem fazer ternamente com os bebês que ouvem confiantes e felizes. Ela cozinhou Seus alimentos; fez Seu pão. Ordenhou as cabras para ele e colheu frutas. Atendeu às necessidades do Seu corpo humano. Durante trinta anos Ele pertenceu somente a Ela e quantas maravilhas lhe devem ter sido reveladas! E como deve ter meditado e chorado em Seu berço, sabendo que um dia Ele precisaria abandoná-la para levar as sagradas novas à humanidade e que teria de morrer sob aterradoras circunstâncias. Os apóstolos e Lucano falaram-nos dessa coisa. O Senhor fez Seu primeiro milagre ao amoroso pedido dela. Foi Ele que a fez mãe de todos os homens, enquanto pendia moribundo na cruz infame. Ela estava presente quando o fogo do Pentecoste caiu sobre Seus apóstolos e discípulos chorosos. O fogo foi cuidadosamente evitado de se abater sobre a mãe?

            Ela não foi uma ‘mera mulher’, Saul. Era a Mãe de Deus. Ele a amou antes de amar a outros em Sua forma humana. Correu para o lado dela como uma Criança; foi irremediavelmente dependente dela para se alimentar. Nós, homens, amamos e reverenciamos nossa mãe. Quanto mais, então, deve Deus amar e bendizer a Sua Mãe! Nada é impossível para Deus. Se Ele escolheu levar seu corpo impoluto até ela, como foi levado o Messias, quem ousará discutir? Embora – disse Barnabé, sem alegria no rosto ao olhar Saul – fosse apenas uma mulher.

            Saul refletiu. Contra a vontade, admitiu todos os argumentos de Barnabé. Era um mistério. Todavia, Maria não passara de uma mulher e as mulheres não eram muito consideradas pelos profetas e patriarcas, apesar de todas as Mães de Israel. Eram propensas à fraqueza da carne e da vontade. Pensou em sua própria mãe, em Dacyl e nas outras que conheceu. Então lembrou-se de ter visto Maria uma vez, quando jovem em Jerusalém, e que ela cochilara, cansada, perto dele, esperando o filho. Lembrou-se da terna veneração do Messias; Ele a alimentara com Suas próprias mãos. Mostrara tristeza e preocupação com ela. Chamara-a emi (mãe). Se o Senhor honrava e amava tanto a Sua Mãe, por que deviam os homens objetar? Ele não tinha gritado; “Todas as gerações devem me chamar abençoado?” Saul balançou a cabeça.

            - É um mistério – murmurou apreensivo. – Preciso meditar a respeito.

            Esse pequeno trecho também me levou à reflexões. Também eu pensava de forma fechada e irremovível que existia esse erro conceitual ao ser chamada Maria de Mãe de Deus. Mas vejo agora, pelas palavras de Barnabé, que não devo ser tão radical na minha forma de pensar mais aprofundada. Jesus ensinou que todos nós podemos ser deuses, ou já somos deuses, basta despertar dentro de nós uma sintonia imaculada com o Pai. Neste sentido, podemos considerar Jesus como Deus, pois ele nos provou que tinha essa sintonia imaculada com o Pai, que nem mesmo os piores castigos e tentações fizeram Ele pensar ou agir diferente. Portanto devo ser tolerante quando ouvir a conceituação de mãe de Deus com relação a Maria, como também devo imaginar que posso também chamar assim a mãe de cada ser humano que tenha demonstrado uma sintonia aproximada com Deus, mesmo que tenha sido maculada por algum aspecto, ou tardia por falta da devida compreensão da vida real e seus aspectos evolutivos. Lembro assim de diversos personagens de nossa história, como Santo Agostinho, Francisco de Assis, Gandhi, Tereza de Calcutá... o próprio Paulo de Tarso.

Publicado por Sióstio de Lapa
em 05/07/2015 às 23h59