Achei interessante essa comparação que Francisco fazia do preguiçoso, conforme escrito por São Boaventura nas Fontes Franciscanas e Clarianas:
06. E ensinava que como maior empenho se deve fugir do ócio, sentina de todos os maus pensamentos, mostrando com o exemplo que o corpo rebelde e preguiçoso deve ser domado com contínuas disciplinas e com frutuoso trabalho. Donde, chamava seu corpo de irmão burro, a ser submetido a tarefas cansativas, a ser tratado com frequentes açoites e sustentado com alimento barato. – Quando via alguém ocioso e sem trabalhar querendo comer o trabalho dos outros, determinava que devia chamar-se irmão mosca, pelo fato que tal irmão, não fazendo nada de bom e arruinando os bens feitos, se torna vil e abominável a todos. – Por causa disto, disse uma vez: “Quero que meus irmãos trabalhem e se exercitem, para que, entregues ao ócio, não vaguem com o coração e com a língua por coisas ilícitas”. – Queria que o silêncio evangélico fosse observado pelos irmãos, para que se abstivessem solicitamente em todo tempo de toda palavra ociosa, já que haveriam de prestar contas disto no dia do juízo. Mas também quando encontrava um irmão acostumado a palavras frívolas, repreendia-o asperamente, afirmando que o silêncio modesto é guarda do coração puro e não pequena virtude, pelo fato de se dizer que a morte e a vida estão em poder da língua, não tanto por causa do paladar quanto por causa da fala.
07. E embora induzisse com todas as forças os irmãos a uma vida austera, no entanto, não lhe agradava a severidade da rigidez que não se reveste com as vísceras da piedade e não é condimentada com o sal da discrição. Pois, numa noite, um dos irmãos, muito atormentado pela fome por causa do excesso de abstinência, como não pudesse ter descanso algum e o piedoso pastor compreendesse que o perigo estava iminente para sua ovelha, chamou o irmão, colocou o pão sobre a mesa e, para tirar-lhe a vergonha, começou ele próprio a comer primeiro e a convidá-lo docemente para comer. O irmão deixou de lado a vergonha, tomou o alimento, alegrando-se muito, porque, pela discreta condescendência do pastor evitou dano ao corpo e recebeu não pequeno exemplo de edificação. Quando amanheceu, tendo convocado os irmãos, o homem de Deus, relatando o que acontecera de noite, acrescentou uma sábia admoestação: “Irmãos, sirva-vos de exemplo não o alimento, mas a caridade”. Ensinou-os, além disso, a seguir a discrição como a condutora das virtudes, não aquela que a carne aconselha, mas a que Cristo ensinou, cuja vida santíssima consta expressamente que é modelo de perfeição.
Esse comportamento dá lições sobre o trabalho e sobre a abstinência de itens necessários à integridade do corpo. Nas primeiras lições é compreensível toda admoestação sobre o preguiçoso, como aquele ser pernicioso que se alimenta do trabalho dos outros, como as moscas fazem; porém nas segundas lições, essa abstinência severa que deveria ser observada, até mesmo com o risco da própria saúde, é muito temerária. Francisco tenta dessa forma a mortificação do corpo físico num extremo perigoso, que mais além de ser essa atitude simpática aos olhos de Deus, acredito que, em dias atuais, seria uma atitude reprovada pelo Criador. Estamos de acordo que todos devem trabalhar, desde que possuam capacidade para isso, mas que devemos respeitar e cuidar do corpo que o Pai nos deu, e não martiriza-lo até o risco da insolvência.