Tem um trecho no livro “Fontes Franciscanas e Clarianas”, páginas 601-601, que é citado na biografia de Francisco, como ele detestava o detrator, e que está escrito da seguinte forma:
Detestava também, como uma mordida de serpente, o vício da detração, inimigo daquele que é a fonte da piedade e da graça, e afirmava que era uma parte atrocíssima, abominável ao Piíssimo Deus, pelo fato que o detrator se alimenta com o sangue das almas que ele mata com a espada da língua. Ouvindo uma vez que um irmão denegria a fama de outro, voltando-se ao seu vigário disse: “Levanta-te, levanta-te, examina diligentemente o caso e, se descobrires que o irmão acusado é inocente, com dura correção torna conhecido a todos o acusador!”
E por vezes julgava que devia ser espoliado do hábito aquele que espoliava do hábito o seu irmão da honra e da fama, e que não podia elevar os olhos a Deus, se antes não cuidasse, na medida do possível, de restituir o que tirara. Dizia: “Tanto maior é a impiedade dos detratores do que a dos ladrões, quanto mais a lei de Cristo que se cumpre na observância da piedade – nos obriga a desejar mais a salvação das almas do que a saúde dos corpos”.
Detrator é sinônimo de acusador, difamador, ultrajador, maledicente. Pode se tornar um hábito naquela pessoa que sempre observa o que está errado no próximo e quase sempre exagera na acusação do mal feito. Dizer a verdade sobre o que acontece ao nosso redor é uma virtude, mas devemos ser piedosos com as faltas dos nossos amigos, parentes, etc. Existe uma orientação para que ressaltemos no próximo sempre o lado positivo; deixar o lado negativo sem destaque, se tivermos oportunidade que orientemos de forma reservada. Essa atitude vai nos preservar de ser um detrator, de ser um assassino da fama, da honra ou do bom conceito de alguém.
Essa atitude se aproxima daquela parábola oriental sobre os dois amigos. Ambos caminhavam pelo deserto e em determinado momento se desentenderam e um bateu no outro. Naquele momento, o que foi vitimado pela violência escreveu com um graveto na areia: “neste dia, o meu amigo, fulano de tal, bateu em mim”. A viagem continuou e em outro momento estando ambos a repousar na beira da lagoa, o amigo foi tomar banho e num descuido, sem saber nadar, estava a se afogar. O seu amigo sem titubear, se lançou na água e o resgatou do perigo. O amigo depois de recuperado, pegou um estilete e escreveu na pedra: “Neste dia o meu amigo, fulano de tal, arriscando a sua própria vida salvou a minha”. O amigo ficou curioso com esse comportamento e perguntou: “Por que quando eu bati em você, você escreveu na areia, e agora que eu lhe ajudei você escreveu na pedra?” Então o amigo respondeu com naturalidade: “Eu escrevi na areia o mal que você me fez para que o vento logo apagasse da minha memória, e escrevi na pedra o bem que você me fez para que o tempo demore o máximo possível essa lembrança”.
Esta é uma atitude muito digna e que está muito próxima dos ensinamentos do Cristo, da experiência do Amor explicado por Paulo: o Amor é paciente, é benigno, não arde em ciúmes, não se orgulha, não se ensoberbece, não se conduz inconveniente, não exagera os seus interesses, não se exaspera, não se ressente do mal, não se alegra com a injustiça, mas se regozija com a Verdade. Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta.
Portanto, a detração está na contramão do Amor e por isso São Francisco foi tão severo com ele. Sei que isso às vezes parece ser um hábito desenvolvido por algumas pessoas, que as vezes acha que isso é uma forma de defesa ou de ataque. Mas é um puro engano, pois ao invés de está progredindo está cada vez mais se afastando de Deus.
Que Deus me ajude a não cometer esse equívoco, pois sei que é grande a tentação de colocar em destaque o negativo do outro como forma de destacar o nosso positivo.