Depois de ter considerado um pouco do trabalho do filósofo Jean Paul Sartre, vou considerar agora um trecho da biografia do santo de Assis, Francisco, sobre a oração e pregação, tema bastante distante um do outro.
Francisco, o servo verdadeiramente fiel e ministro de Cristo, para realizar tudo com fidelidade e perfeição, aplicava-se especialmente aos exercícios das virtudes que – estando o Espírito Santo a ditar-lhe – sabia que mais agradava ao seu Deus. A este respeito aconteceu que ele caiu em grande agonia por causa de uma dúvida que durante muitos dias, ao voltar da oração, propunha aos seus irmãos mais íntimos para resolver. Disse: “Irmãos, o que aconselhais, o que louvais? Se eu me dedicar a oração ou se percorrer as cidades a pregar? Na verdade, eu, pobrezinho, simples e imperito no falar, recebi maior dom de rezar do que de falar. Parece-me também que na oração há a conquista e acúmulo das graças, na pregação há uma certa distribuição dos dons recebidos do céu; na oração, também há a purificação dos afetos interiores e a união com o único e sumo bem com revigoramento da virtude; na pregação, os pés espirituais ficam empoeirados, há a distração para com muitas coisas e o relaxamento da disciplina. Finalmente, na oração, falamos e ouvimos a Deus e, levando vida quase angelical, convivemos com os anjos; na pregação, é preciso usar de muita condescendência para com os homens e, vivendo humanamente entre eles, pensar, ver, dizer e ouvir coisas humanas. Mas há uma coisa em contrário que parece preponderar a todas estas coisas diante de Deus, a saber, que o Unigênito filho de Deus, que é a suprema sabedoria, desceu do seio do Pai por causa da salvação das almas, para que, modelando o mundo com o seu exemplo, pudesse falar a palavra da salvação aos homens que remiu com o preço, purificou com a aspersão e sustentou com a bebida de seu sagrado sangue, não reservando para si absolutamente nada que não desse generosamente para a nossa salvação. E porque devemos fazer tudo segundo o modelo das coisas que vemos nEle como em um monte sublime, parece mais agradável a Deus que, interrompida a quietude, eu venha para fora ao trabalho. – E como por muitos dias ruminasse tais palavras com os irmãos, não conseguia perceber com toda a certeza qual destas duas coisas escolheria para si como mais aceita por Cristo. Embora conhecesse coisas admiráveis pelo Espírito de Profecia, não conseguia por si mesmo resolver esta questão, de modo que, provendo Deus melhor, por um oráculo do alto se lhe manifestava o mérito da pregação e se conservava a humildade do servo de Cristo.
Esse dilema para São Francisco tão forte, para mim assim não parece. Primeiro por não ter como ele a vocação e determinação de estar sempre em oração. Muitas vezes esqueço de fazer as orações básicas, ao dormir e ao despertar, como sempre oriento a quem considero com essa necessidade. Eu também tenho essa necessidade, sinto que muitas virtudes em mim seriam mais adubadas e arrefecido o poder dos vícios e defeitos. Por isso não tenho essa dificuldade em fazer outra coisa além da oração, e que também seja útil aos olhos de Deus.
Segundo, a pregação para mim se torna mais fácil, pois já tenho argumentos acadêmicos que posso usar em diferentes situações, e também conhecimentos espirituais de diversas fontes. O que preciso controlar são os aspectos emocionais que muitas vezes interferem com o meu ritmo de raciocínio e a coragem de atuar. Nesse aspecto a prece pode até ajudar a aperfeiçoar a outra ponte de ação, de acordo com a vontade do Pai.
Procurarei mais uma vez aperfeiçoar o habito da oração, é um caminho diferente do de São Francisco, pois esse tinha necessidade de aperfeiçoar o seu ato de pregação. Mas assim como ele foi ajudado por Deus em seus propósitos, com certeza Deus também irá me ajudar em meus propósitos, pois afinal, tudo concorre para fazer a Sua vontade.