Os assassinatos ocorridos na França em 13-11-15 (sexta-feira 13) abalou a consciência universal e forçou a uma nova reflexão sobre as lições do Cristo, como esta escrita por Mateus (5: 21-26)
Tendes ouvido que foi dito aos antigos: não matarás e quem matar será réu em juízo. Eu, porém, vos digo que todo homem que se irar contra seu irmão será réu em juízo; e quem chamar a seu irmão “insensato” será réu diante do conselho; e quem o apelidar de “desgraçado” será réu do fogo do inferno. Se, por conseguinte, estiveres ante o altar para ofertar tua oferenda e te lembrares de que teu irmão tem queixa de ti, deixa a tua oferenda ao pé do altar e vai reconciliar-te primeiro com teu irmão; e depois vem oferecer o teu sacrifício.
Não hesites em fazer as pazes com teu adversário, enquanto estiveres em caminho com ele, para que não te vá entregar ao juiz e o juiz te entregue ao oficial de justiça e sejas lançado ao cárcere. Em verdade, te digo que daí não sairás enquanto não houveres pago o último centavo.
Com as suas lições Jesus reduziu os Dez Mandamentos de Moisés, quase todos eles de natureza negativa (1-Não terás outros deuses; 2-Não farás imagens; 3-Não tomarás o nome de Deus em vão; 4-Lembrar dos dias santificados; 5-Honra teu pai e tua mãe; 6-Não matarás; 7-Não adulterarás; 8-Não furtarás; 9-Não dirás falso testemunho; 10-Não cobiçarás) a apenas dois, fundamentalmente positivos: 1º) Amar a Deus sobre todas as coisas; e 2º) Amar ao próximo como a si mesmo.
Nessa nova visão o segundo mandamento de Jesus não passa de uma consequência imediata do primeiro. Amar ao próximo como se ama a si mesmo é a resultante e consequência natural do Amor Incondicional ao Pai, que é o primeiro mandamento. Isso amplia ao máximo o mandamento “Não matarás” de Moisés.
Para Moisés a obrigação negativa de não matar já é suficiente. Moisés não quer que aconteça o fato, para Jesus, no entanto, o fazer não passa de um simples efeito, cuja causa invariavelmente é a forma de sentir da pessoa. Jesus não se preocupa somente com os fatos, interessa-lhe mais a consciência humana que é a obra prima que deve ser trabalhada, que é de onde todos os efeitos surgem, quer sejam para o bem ou para o mal.
Jesus não quer combater os sintomas do mal (matar, por exemplo), deseja erradicar o mal mesmo, extirpando-o pela raiz, em sua origem, no seu nascedouro, isto é, no coração do homem. Se o ser humano se aperfeiçoa e se ajusta, ajustado estará automaticamente tudo quanto este homem diga, faça ou deixe de fazer. Se o homem se torna realmente bom, consequentemente jamais pode fazer o mal.
À luz deste novo paradigma, deste conceito superior, que é o conceito cristão, do Cristo, um homicida, por exemplo, não é somente quem mata, mas também todo aquele que deseja matar, mesmo que não o faça. É igualmente homicida aquele que se ira contra seu irmão, quem o apelida de desgraçado, quem o chama de abestalhado. Mas... por que? Porque tudo isso é insulto ao Cristo divino dentro do homem.
É tão grave o desamor ao próximo, que invalida o nosso culto a Deus. Antes de qualquer oferenda ao Pai, temos de reconciliar-nos, se possível, com nosso irmão queixoso, sejam quais forem os motivos da queixa, sob pena de praticarmos pura hipocrisia, com a qual as leis do amor jamais podem ser cúmplices. Nem o Pai Nosso pode ser recitado de forma válida por alguém que ainda cultiva algum tipo de ódio, de amargura ou de ressentimento contra qualquer criatura de Deus.
Por tudo isso Cristo nos lembra que o momento próprio e adequado para fazermos as pazes com o nosso irmão é agora, quando caminhamos com ele, lado a lado, nesta presente jornada da vida. Depois... pode ser tarde demais.
Nesse sentido, li ontem uma carta de uma das vítimas dos crimes terroristas cometidos em Paris, um jornalista que perdeu a esposa nessa fatídica sexta-feira 13 e que reproduzo abaixo para mostrar como as lições do Cristo pode nos deixar fortalecidos, mesmo diante do mais perverso terror:
VOCÊS NÃO TERÃO O MEU ÓDIO
Na noite de sexta-feira vocês acabaram com a vida de um ser excepcional, o amor da minha vida, a mãe do meu filho, mas vocês não terão o meu ódio. Eu não sei quem são e não quero sabê-lo, são almas mortas. Se esse Deus pelo qual vocês matam cegamente nos fez à sua imagem, cada bala no corpo da minha mulher terá sido uma ferida no seu coração.
Por isso, eu não vos darei esse presente de vos odiar. Vocês procuraram por isso, mas responder ao ódio com a cólera seria ceder à mesma ignorância que fez vocês serem quem são. Querem que eu tenha medo, que olhe para os meus conterrâneos com um olhar desconfiado, que eu sacrifique a minha liberdade pela segurança. Perderam. Continuamos a jogar da mesma maneira.
Eu a vi esta manhã. Finalmente, depois de noites e dias de espera. Ela ainda estava tão bela como quando partiu na noite de sexta feira, tão bela como quando me apaixonei perdidamente por ela há mais de doze anos. Claro que estou devastado pela dor, concedo-vos esta pequena vitória, mas será de curta duração. Eu sei que ela vai nos acompanhar a cada dia e que nos vamos reencontrar nos países das almas livres e que vocês nunca terão acesso.
Nós somos dois, eu e meu filho, mas somos mais fortes do que todos os exércitos do mundo. Eu não tenho mais tempo a dar para vocês, eu quero juntar-me a Melvil que acorda de seu cochilo. Ele só tem 17 meses, vai comer como todos os dias, depois vamos brincar como fazemos todos os dias e durante toda a sua vida este rapaz vai fazer a vocês a afronta de ser feliz e livre. Porque não, vocês nunca terão o seu ódio.