Sióstio de Lapa
Pensamentos e Sentimentos
Meu Diário
14/02/2016 00h59
MODELO ASILAR E MANICOMIAL

            O Hospital João Machado, coitado, luta para ser um hospital com características clínicas, com a missão de acolher o paciente em crise e devolver no menor tempo possível, de 15 a 30 dias, à comunidade, à sua família. No entanto, a força das circunstâncias extra-hospitalares, das políticas sociais extra psiquiátricas, cria uma situação premente onde a ética de bem cuidar do paciente força o profissional a atender pacientes com características asilares, que moram no hospital sem data definida de alta, por não terem referências familiares ou instituições apropriadas para cuidar do seu quadro clínico. Da mesma forma é forçado a cuidar como se fosse um manicômio de pacientes que cometem crimes e a justiça ordena a sua permanência, porque as instituições que o deveriam guardar não tem a devida competência para cuidar do seu quadro clínico. Que fazer com esses pacientes? Jogá-los na rua sem a devida compaixão por sua situação de indigência, apenas para respeitar um decreto ideológico que diz o Hospital Psiquiátrico não pode ser um asilo? Desobedecer a ordem judicial e não receber um criminoso doente mental, para obedecer com rigidez ao decreto de Reforma que diz que o Hospital Psiquiátrico não pode ser um manicômio? Sim, Hospital Psiquiátrico Hospital João Machado, sabemos que você quer ser um Hospital clínico, como seus congêneres são, receber o paciente, compensar e devolver para sua família... Mas você absorve os efeitos de nossa compaixão psiquiátrica, de acolher aqueles fora de sua missão, mas que não tem outra opção dentro da sociedade. E o mais perverso de tudo, pobre Hospital Psiquiátrico João Machado, você ainda é culpado disso acontecer... Como se você fosse o culpado por não existir Residências Terapêuticas suficientes, CAPS coerentes com suas funções e capacitados, Hospitais de Custódia preparados para a abordagem clínica. Você é acusado de Manicômio, de Asilo, e muitas vezes os pacientes em crise não conseguem acolhimento por suas dependências se encontrarem repletas de tanta gente em busca de socorro. E chega a deixar pacientes que precisam ser acolhidos, voltarem para casa com suas psicoses e cometerem insanidades, como aconteceu no bairro Planalto, onde um paciente apenas medicado foi para sua residência, matou os filhos e a população o linchou de imediato. Sem falar daqueles que são mortos em vias públicas das mais diversas formas e que somente o ITEP registra com a sua fria burocracia.

            Então entramos na luta ideológica, e alguns técnicos, bem intencionados, bem sei disso, mas diz com todas as letras que VOCÊ NÃO DEVERIA EXISTIR. Dizem que a luta maior não é por instituições, nem categoria... e sim por um modelo de assistência, visão de tratamento, bem como seu modo de tratamento.

            Nós, psiquiatras, entendemos que ainda existe a necessidade de um Hospital Psiquiátrico, além de todos os recursos extra-hospital psiquiátrico que possa existir: Ambulatórios, CAPS os mais diversos, leitos em hospitais gerais, residências terapêuticas, etc. existe uma doença mental que implica em tratamento especializado com os recursos aprofundados que as neurociências, a psicofarmacologia e a psicoterapia trouxe para a psiquiatria, associado a todas as técnicas complementares que ajustem o psiquismo do paciente à realidade. Tudo isso fluido naturalmente o Hospital Psiquiátrico poderia cumprir sua missão, de acolher o paciente em crise e devolver no menor tempo possível à comunidade. Mas, por deficiência da sociedade, do Estado gestor, que não cria esses recursos extra-hospitalares e assim sobrecarrega o hospital de preconceitos e de casos que não mais são de sua competência, deveria ser extinto? Parece-me um contra-senso, e ainda mais quando se justifica agir assim em defesa do paciente.

Publicado por Sióstio de Lapa
em 14/02/2016 às 00h59