Hoje resolvi falar da despedida. Parece uma circunstância inofensiva, que não pode trazer grandes ameaças à vida íntima. Mas quando me sinto tomado pela saudade, quando sinto um aperto no coração, um nó que se faz na garganta ou mesmo um aguaceiro nos olhos, vejo que quem causou tudo isso foi a despedida, que gerou ausência de alguém, que gerou a saudade.
Vejo também que existem diversas formas de despedidas, nem todas tem o mesmo formato. Existe aquela na qual a ética e o bom senso se impõe, e força ao coração abrir mão de um amor que ele tanto deseja. Lembro de uma ocasião dessa, estava apaixonado por uma pessoa, desejava tanto ela ao meu lado, mas tive que conter toda essa enxurrada de afetos, pois ela precisava para ficar comigo, que eu tomasse decisões contrárias a minha consciência, a ética. Combinamos para ficar a última noite juntos, numa pousada na praia. Foi uma lua de mel às avessas, não posso dizer que foi uma lua de fel, pois apesar da tristeza que existia como pano de fundo, devido a despedida que logo iria chegar, foi uma noite maravilhosa. No dia seguinte, foi com o coração amargurado, cheio do dores, que eu fui deixa-la na rodoviária para a despedida final. O céu estava nublado, como estava a minha alma que acompanhava com os olhos a cadencia dos pingos da chuva. Sabia que com a partida dela o meu coração não teria conforto, mas a minha razão não podia permitir o que minha consciência não considerava correto. Esta foi uma despedida concedida por minha razão. Sofreria as consequências dela com altruísmo, pois eu sabia que, mesmo machucando o meu coração, eu estava do lado correto. Foi uma despedida sofrida, mas pacífica, compreensiva, tolerante, e com certeza cheia de amor. Aquela pessoa querida também se despediu com lágrimas nos olhos, sei que dentro dela não existia mágoa por eu não ter ficado.com ela. Acredito que ela entendeu minhas razões e também assumiu o ônus da despedida, por não querer violar a sua consciência, de permanecer comigo violando os seus princípios.
Mas existe outra forma de despedida muito mais sofrida, muito mais traumática... e eu também a experimentei. Uma despedida em que fui forçado a sair de perto da pessoa amada. Mais uma vez os princípios de minha consciência provocaram essa situação de intolerância máxima da pessoa amada. Ela não conseguiu tolerar tanta decepção que sofria pelo meu modo de agir. Dessa vez a iniciativa da separação não foi minha, mas as condições quem forneceu foi eu. Talvez eu nem pudesse considerar essa circunstância como uma despedida, por tão traumática que foi. Nem me lembro se fui agredido fisicamente, como de uma outra vez que aconteceu de forma semelhante com outra pessoa. Sei que fui forçado a colocar minhas roupas dentro do carro e abandonar aquela convivência de cerca de 20 anos, sem nenhuma palavra de afeto, sem nenhum abraço. Nesta despedida o amor ficou comprometido com relação a mutualidade. Ela se deixou contaminar pela raiva e me fustigou com tanto ódio que pediu a toda sua família a nem se aproximarem de mim. Eu, como ferramenta do Amor Incondicional nas mãos de Deus, como assim me considero, não desenvolvi nenhuma raiva, tolerei toda reação negativa que desabou sobre mim e mantive o amor sempre presente.
Certamente existem outras formas de despedida e já experimentei diversas delas. Mas eu queria colocar aqui dois polos bem diferentes de uma mesma circunstância e que pode ter a participação das mesmas pessoas. No meu projeto de vida não está incluso as despedidas traumáticas, como esta última. Meu projeto de vida considera com prioridade os encontros carregados de amor, e tendo muitos encontros vai haver muitas despedidas. Mas as circunstâncias devem garantir a harmonia nas despedidas, que sempre tem a perspectiva do reencontro. Isso implica que cada encontro deve estar sintonizado com o Amor Incondicional e sua natureza inclusiva.
Cada vez que fico mais experiente nessa lida, as despedidas se tornam menos traumáticas, pois agora não deixarei alimentar na convivência uma perspectiva de amor exclusivo, pois é aí que reside o risco da despedida traumática.