As vezes sou confrontado com a ideia de que o casamento, como uma permissão que Deus faz de união entre o homem e a mulher, tem que ser indissolúvel, pois o que Deus une o homem não pode desunir. Isso implica dizer que eu não obedeci a Deus no primeiro casamento que eu realizei perante Ele no altar. Cometi esse erro e também outro, pois casei uma segunda vez e separei novamente.
Mas fico a imaginar, por que essas separações aconteceram se eu estava sempre procurando cumprir a principal lei de Deus que é a lei do Amor Incondicional? Para ajudar nas minhas dúvidas, procurei ler novamente o Evangelho.
“E chegaram-se a Ele os fariseus, tentando-o e dizendo: é porventura lícito a um homem repudiar a sua mulher, por qualquer causa? Ele respondendo, lhes disse: ‘Não tendes lido que quem criou o homem, desde o princípio os fez macho e fêmea? E disse: ‘Por isso, deixará o homem pai e mãe, e ajuntar-se-á com sua mulher, e serão dois numa só carne. Assim que já não são dois, mas uma só carne. Não separe logo o homem o que Deus ajuntou. (Mateus, XIX: 3-6).
Vamos seguir então as lições do Mestre. Ele ensina que Deus criou o homem na forma de macho e fêmea, e que o homem/mulher deixará pai e mãe e ajuntar-se-á com sua/seu homem/mulher, e serão os dois uma só carne. Assim, já não são dois, mas uma só carne. Portanto, unidos assim conforme a vontade de Deus e os desejos humanos, não caberá a nenhum homem fazer essa separação.
As leis humanas baseadas no amor romântico reforçam esses ensinamentos. A união entre o homem e a mulher é feita na forma do casamento que visa construir uma família nuclear, voltada para os interesses da parentela em primeiro plano, e que o desvio desse compromisso leva o nome de adultério, um crime que chega à pena do apedrejamento em algumas culturas, inclusive naquela que o Mestre vivia. Inclusive foi Ele que impediu a morte por tal castigo de uma mulher flagrada em tal crime, simplesmente por evocar na consciência de cada um dos pretensos carrascos, se eles tinham moral para fazer o que pretendiam.
Por outro lado, o Pai criou cada pessoa com instintos básicos de sobrevivência, entre eles um dos mais forte é o instinto de preservação da espécie, representado pelo desejo sexual entre homem e mulher. O homem honesto que queira seguir a Lei do Amor, obedecendo a bússola comportamental que o Cristo nos ensinou, de fazer ao próximo o que desejaríamos que fizessem conosco, vai se defrontar com a possibilidade de envolvimento afetivo/íntimo/sexual com outra pessoa, caracterizando o adultério. Fica então a decisão para essa pessoa ciosa de fazer a vontade de Deus no cumprimento da Lei do Amor: desenvolve o relacionamento extra conjugal com essa pessoa sentindo que está cumprindo a Lei de Deus, ou permanece firme na decisão de não se envolver sexualmente com outra pessoa, para não cometer adultério? Mesmo tendo a consciência que se mantiver a fidelidade ao casamento, perderá a fidelidade ao que Deus espera dele? Mas pelo menos terá o respeito de todos que o verão como uma pessoa honesta e respeitador das leis. Mas ele terá a mesma compreensão que Deus o verá assim?
Mas vamos imaginar que tal pessoa queira fazer a vontade de Deus e seguir as lições do Cristo, o Seu filho mais evoluído que veio à matéria para nos ensinar. Então ele conclui que a união com sua mulher o transformou numa só carne com ela conforme a vontade de Deus. Se ele tem os desejos que Deus colocou na sua mente, se existe a oportunidade de relação sexual com outra pessoa na obediência da Lei do Amor, de fazer ao outro o que desejaria que fosse feito consigo, então a sua mulher, carne da sua carne, ao invés de se sentir agredida por tal ato, deveria se sentir gratificada por seu companheiro obedecer de forma tão precisa as determinações do Criador. Mesmo porque ela sabe que se tal oportunidade surgisse nos seus relacionamentos, de cumprir a Lei do Amor com outro homem, o seu companheiro estaria tendo a mesma compreensão e sentido o mesmo tipo de orgulho com sua mulher.
Acontece que na prática, quando o homem toma tal atitude sentindo estar dentro da Lei de Deus, a mulher o esbofeteia e expulsa de casa. Dessa forma não foi ele que repudiou a esposa, foi ela que, sem compreender o alcance do seu comportamento, não tolerou o que para ela parecia uma agressão. Mesmo assim, sofrendo tais dissabores, tal homem cioso do cumprimento da vontade de Deus continua sem repudiar a sua mulher, mesmo tendo sido por ela expulso de sua casa e de seu coração. Ele continua a entender que ela continua sendo carne de sua carne, pois um dia juntos trocaram fluidos e seus corações dispararam juntos no êxtase do orgasmo cósmico. Continua a considera-la uma pessoa especial e cujo amor que um dia nutriu não deixa se extinguir de dentro do seu coração. Essa pessoa que o tempo pode levar à uma consideração mais próxima da verdade, volta a se relacionar de forma fraterna e solidária com o antigo marido que hoje é seu companheiro espiritual.
Pronto! Por caminhos diferentes foi encontrada a indissolubilidade do casamento, sem este está presente na sua formalidade, mas que na essência os corações estão unidos como antes estavam na orgia da carne. Pode não ser uma só carne, se para isso é exigido ainda a troca de fluidos, mas com certeza pode ser um só espírito, tolerante com os desejos da carne e corajoso para assumir os caminhos que o Pai apresenta para a construção do Seu Reino.