Vejo mais uma vez a sabedoria do Pai chegando até mim. Depois que Ele me indicou o filme “Sangue Negro” para que eu visse a vitória do mal sobre um discípulo que fracassou, me apresenta um texto do livro “Paulo e Estêvão”, onde Paulo já convertido depois do evento às portas de Damasco, procura o seu antigo mestre, Gamaliel, para que ele lhe oriente no que aconteceu e no que pode fazer. Reproduzo na íntegra esse trecho que faz parte do capítulo II – O tecelão.
“...- Mestre amado, sempre enxergastes as soluções do bem, onde minha imperfeição não devassava senão sombras amargurosas!... Amparai meu coração mergulhado em dolorosos pesadelos. Preciso servir Àquele que se dignou arrancar-me das trevas do mal, não posso dispensar vosso auxílio neste transe difícil da minha vida!...
Essas palavras eram ditas com inflexão profundamente comovedora. Olhos firmes, embora iluminados de intensa ternura, o generoso velhinho acariciou lhe as mãos e começou a falar comovidamente.
- Examinemos tuas dúvidas, de maneira particular, a fim de estudarmos uma solução adequada a todos os problemas, à luz dos ensinamentos que hoje nos iluminam.
E, após uma pausa em que parecia catalogar os assuntos, continuava:
- Falas do desprezo experimentado na Sinagoga de Damasco; mas, os exemplos são claros e convincentes. Também eu, atualmente, sou considerado como louco pacífico, no ambiente dos meus. Em Jerusalém viste Simão Pedro vilipendiado por amar aos pobres de Deus e dar-lhes acolhida; viste Estêvão morrer sob pedradas e que mais? O próprio Cristo, redentor dos homens, não se furtou aos martírios de uma cruz infamante, entre malfeitores condenados pela justiça do mundo. A lição do Mestre é grande demais para que seus discípulos estejam a espera de dominações políticas ou de altas expressões financeiras, em seu nome. Se Ele que era puro, e inimitável, por excelência, andou entre sofrimentos e incompreensões neste mundo, não é justo aguardemos repouso e vida fácil em nossa miserável condição de pecadores.
O moço tarsense ouvia aquelas palavras mansas e enérgicas, com a alma dolorida, mormente no que se referia às perseguições infligidas à Pedro e no capítulo das lembranças de Estêvão, às quais o velho amigo tinha a delicadeza de não aludir nominalmente ao verdugo.
- A respeito das dificuldades que dizes experimentar depois dos sucessos de Damasco – prosseguia Gamaliel serenamente -, nada mais justo e natural aos meus olhos experimentados nos problemas do mundo. Nossos avós, antes de receber o maná do céu, atravessaram tempos sombrios de miséria, escravidão e sofrimento. Moisés jamais encontraria na rocha estéril a fonte de água viva. E talvez ainda não tenhas meditado melhor nas revelações da Terra Prometida. Que região seria essa, se, guardando a compreensão mais vasta de Deus, descobrimos em todos os pontos do mundo mananciais de Sua proteção? Há tamareiras, frondosas e amigas, medrando nos areais ardentes. Essas árvores generosas não transformam o próprio deserto em caminhos abençoados, cheios do pão divino para matar nossa fome? Nas minhas reflexões solitárias, cheguei a conclusão de que a Terra Prometida pela divinas revelações é o Evangelho do Cristo Jesus. E a meditação nos sugere comparações mais profundas. Quando nossos ascendentes mais corajosos trabalhavam por conquistar a região privilegiada, numerosas pessoas procuravam desanimar os mais pertinazes, asseverando que o terreno era inóspito, que os ares eram insalubres e portadores de febres mortais, que os habitantes eram intratáveis, devoradores de carne humana; mas Josué e Caleb, num esforço heroico, penetraram a terra desconhecida, venceram os primeiros obstáculos e voltaram dizendo que dentro da região manavam leite e mel. Não temos aí um símbolo perfeito? A revelação divina deve referir-se a uma região bendita, cujo clima espiritual seja feito de paz e luz. Adaptarmo-nos ao Evangelho é descobrir outro país, cuja grandeza se perde no infinito da alma. A nosso lado permanecem aqueles que tudo fazem por nos desanimar na empresa conquistada. Acusam a lição do Cristo de criminosa e revolucionária, enxergam no seu exemplo intuitos de desorganização e de morte; qualificam um apóstolo, como Simão Pedro, de pescador presunçoso e ignorante; mas pensando naquela estupenda serenidade com que Estêvão entregou a alma a Deus, vi nele a figura do companheiro corajoso e digno, que voltava das lições do “Caminho” para nos afirmar que na Terra do Evangelho há fontes do leite da sabedoria e do mel do amor divino. É preciso, pois, marchar sem repouso e sem contar os obstáculos da viagem. Procuremos a mansão infinita que nos seduz o coração.”
Não poderia o Pai ter me enviado melhor lição. Resgata o trabalho de Moisés, do Mestre Jesus e indica que devemos estar pronto para adentrar a nova Terra Prometida, o Reino de Deus, corrigindo nossas imperfeições e ajudando a todos os irmãos ao nosso alcance em penetrarem também em tão regozijante tarefa.
Sinto-me resgatado das trevas em que entrei pela luz da sabedoria do Pai. Na próxima reunião da Escola do Evangelho, irei propor uma autorreflexão das atitudes de cada um frente as aulas ensinadas e ao nosso desempenho na rotina do dia a dia. Se um evento foi capaz de despertar em mim tantos aspectos negativos, por que não criar outro que seja capaz de despertar, não só em mim, mas em todos, os aspectos positivos da chegada em nós do Reino de Deus.