Encontrei nova forma de conceituar Gratidão, explicada pelo professor António Nóvoa, que veio fazer uma aula magna da Universidade de Brasília, e considero muito interessante. Eis o que ele falou:
Se me derem mais dois minutos explico-vos o que quero dizer com a palavra “agradeço”.
Há uns meses atrás estava eu em Brasília, a preparar a aula magna da Universidade de Brasília, e vinha-se à cabeça que queria agradecer aos colegas brasileiros tudo o que me tem dado e tem sido muito. E vinha-me à cabeça o Tratado da Gratidão de S. Tomás de Aquino. Todos aqui sabem que o Tratado da Gratidão de S. Tomás de Aquino tem três níveis de Gratidão: um nível mais superficial, um nível intermédio e um nível mais profundo.
O nível mais superficial é o nível do reconhecimento, do reconhecimento intelectual, o nível cerebral, o nível cognitivo do reconhecimento.
O segundo nível é o nível do agradecimento, do dar graças a alguém por aquilo que esse alguém fez por nós.
O terceiro nível, mais profundo do agradecimento, é o nível do vínculo, é o nível de sentirmos vinculados e comprometidos com essas pessoas.
E de repente, descobri uma coisa na qual eu nunca tinha pensado. Que em inglês ou em alemão, se agradece no nível mais superficial da Gratidão. Quando se diz “thank you” ou quando se diz “zu danken” estamos a agradecer no plano intelectual.
Que na maior parte das outras línguas europeias, quando se agradece, agradece-se no nível intermediário da Gratidão. Quando se diz “merci” em francês, quer dizer dar uma mercê, dar uma graça. Eu dou-lhe uma mercê, estou-lhe grato, dou-lhe uma mercê por aquilo que me trouxe, por aquilo que me deu. Ou “gracias” em espanhol, ou “grazie” em italiano. Dou-lhe uma graça por aquilo que me deu e é nesse sentido que eu lhe agradeço, é nesse sentido que eu lhe estou grato.
E só em português, que eu conheça, que eu saiba, é que se agradece com o terceiro nível. O terceiro nível, o nível mais profundo do Tratado da Gratidão. Nós dizemos “obrigado”. E obrigado que dizer isso mesmo. Fico-vos obrigado. Fico obrigado perante vós. Fico vinculado perante vós. Fico-vos comprometido a um diálogo, agradecendo-vos o vosso convite, agradecendo-vos a vossa atenção. Fico obrigado, vinculado a continuar esse diálogo e a poder contribuir, na medida das minhas possibilidades, para vossos projetos, para vossos trabalhos, para as vossas reflexões, para o vosso diálogo... É esse diálogo que quero, e é nesse preciso sentido que eu vos digo: MUITO OBRIGADO!
Então, por força da língua, estamos sempre agradecendo num nível profundo, de vinculação àquelas pessoas que nos prestam algum favor, algum benefício. É coerente com as lições do Evangelho, e se queremos ser realmente a Pátria do Evangelho e Coração do Mundo, como está previsto, é bom que tenhamos o completo entendimento sobre a Gratidão e possamos sempre a realizar no nível mais profundo.