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20/01/2018 00h47
LUIZ DE BRAGANÇA, ENTREVISTA (7) - ESCRAVIDÃO

            A Sociologia, a historiografia e a ciência política brasileira colocam muita ênfase na escravidão como uma marca presente em toda a formação do país – do Estado à sociedade -, mas ela não aparece muito no seu livro. Foi uma escolha ou a escravidão não teve um papel relevante nessa história?

            Ela teve um papel relevante, claro. Agora, sociologicamente, ela foi controlada. O que falar da escravidão senão que ela foi totalmente controlada e que a ascensão social das classes carentes foi distorcida?  Eu falaria a mesma coisa que falaria para qualquer classe de cidadãos brasileiros em situação de carência, não apenas ex-escravos: é que, com oligarquias no poder, eles vão sistematicamente criar políticas em que mantenham esse poder e que o povo em carência, sozinho, não vai conseguir exercer as suas capacidades. É sempre por meio de uma política de Estado, de uma política assistencialista, nunca individualmente capacitado e independente. Isso serve para escravos e não escravos, ex-escravos, qualquer raça, imigrantes, não imigrantes. Não importa. Não é pelo fato de um não conhecimento desse fator, mas de como resolver. Faço uma passagem no livro que falo do controle das oportunidades, que em países de fato liberais as oportunidades existem para todos. Estou falando em tese. Não é 100% assim, mas existem muito mais do que países oligárquicos controlados centralmente. Nesses países onde não há uma situação de carência, se você tem uma grande ideia e você tem o seu trabalho e disposição de empreender, as coisas convergem. Você pode sair de uma situação de carência e se tornar um grande empresário, afluente tanto quanto qualquer grande oligarca. No Brasil não: a regulamentação existe para limitar a capacidade de ascensão social, para limitar a competição, para manter aqueles que têm uma empresa grande no comando. Quando você tem regulamentação, ela não favorece ao Estado, mas ao grande empresário que está se alimentando do sistema político. Então é a mesma coisa que aconteceu no Brasil República logo depois da Monarquia.

            Essa questão da escravidão é um conceito que se aplicado de forma ampla chega até nós, seres humanos civilizados. Na época da Monarquia, os escravos eram apresentados de forma mais escrachada, acorrentados, açoitados, abusados de todas as maneiras, sem dignidade humana. A Monarquia era contrária essa condição humana, tanto é verdade que fez vários projetos de lei para suavizar a condição, até o momento final da abolição da escravatura. Este foi um dos motivos do golpe de Estado que iniciou o regime Republicano que vigora até hoje, sem que a população tivesse a curiosidade de ver quais as reais causas dessa mudança tão brusca.

            Hoje, a escravidão escrachada não existe, não vemos ninguém acorrentados ou chicoteados, mas estamos cansados de ver multidões indo e vindo dos seus trabalhos, em ônibus, trens ou metros superlotados, passando muitas vezes os dias úteis em seus trabalhos para voltar para casa somente em curtos fins de semana, indo para casa no sábado e voltando para a mesma rotina na segunda feira.

            Não é uma nova forma de escravidão, de forma mais sofisticada e às vezes nem tanto?

Publicado por Sióstio de Lapa
em 20/01/2018 às 00h47