Continuando a transcrição da palestra sobre a obra de Gaston Leroux, O Fantasma da Ópera, feita pela professora Lucia Helena, voluntária da Nova Acrópole, e que está disponível no Youtube, muito útil para nossas reflexões.
Existe uma música, e esse espetáculo é cheio de músicas muito belas. Tem certas pessoas, ah, me desculpem se alguém vai ficar ofendido por isso, mas se você for cantar uma música para sua namorada ou seu namorado, que sei que alguns fazem, não cantem “All I ask of you”. É uma música linda, mas é um carcereiro cantando para sua prisioneira, ou vice-versa. Porque ele está dizendo “fuja de tudo o que lhe assusta e deixa eu ficar grudado em você 24 horas por dia. Venha para um lugar luminoso e seguro, é só o que peço para você. ” Só o que peço para você? Ele está pedindo tudo! Está pedindo para que ela renuncie à sua sombra inconsciente, está pedindo que ela renuncie à beleza que vem dessa sombra. Está pedindo que ela renuncie à sua espiritualidade, ele pede tudo! Mas é tão delicado, tão bonitinho, que parece que não está pedindo nada demais. Então vejam a letra dessa música...
RAOUL CANTA PARA CHRISTINE (All I ask of you)
Não vamos mais falar da escuridão, esqueça esses medos
Estou aqui, nada pode te ferir, minhas palavras irão te aquecer e acalmar
Deixe-me ser sua liberdade. Deixe a luz do dia secar suas lágrimas
Estou aqui, com você, ao seu lado, para te guardar e guiar
Deixe-me ser seu abrigo, deixe-me ser sua luz!
Você está segura, ninguém te achará, seus medos estão longe...
Então, diga que compartilhará comigo um amor, uma vida...
Deixe-me tirar você dessa sua solidão!
Diga que precisa de mim com você aqui, ao meu lado
Qualquer lugar que você for, deixe-me ir também.
Christine, isso é tudo o que te peço.
Compartilhe comigo cada dia, cada noite, cada manhã.
Qualquer lugar que você for, deixe-me ir também
Me ame, isso é tudo o que te peço.
Não vamos mais falar da escuridão, ou seja, do espiritual, não é? Esquece esses medos, venha ficar segura, estou aqui, nada pode te ferir, minhas palavras vão te aquecer e acalmar. Mas ela tinha ânsia de palavras que despertassem e não adormecessem. Era o momento dela, mas o que ele oferece são palavras para acalmar.
Deixe-me ser sua liberdade. Na verdade, ele se troca pela liberdade dela. Deixe a luz do dia secar suas lágrimas. Estou aqui, com você, ao seu lado para te guardar e guiar.
Chega um determinado momento, vocês conhecem um ditado popular que minha avó adorava falar, que dizia que “a necessidade faz o sapo pular”, e o sapo precisa aprender a pular. E você fica com peninha do sapo, vai lá e tira a necessidade e ele não pula, nunca! Se tirar o medo da Christine, se tirar dela esse amor ao mistério, ela não pula, ela não vai para a frente, ela retrocede e fica estagnada. Isso não é liberdade, isso é prisão, porque é exatamente o que ele está oferecendo.
Deixe-me ser seu abrigo, deixe-me ser sua luz.. uma luz falsa, pois a verdadeira ele não a deixa buscar.
Você está segura, ninguém te achará, seus medos estão longe... então diga que compartilhará comigo um amor, uma vida. Deixe-me tirar você dessa sua solidão. Porque ela tinha um momento de vida interior, um encontro interno. Solidão não é necessariamente má. A solidão é estar desacompanhado de si mesmo. Essa é a verdadeira solidão. O que Raoul oferece para Christine tinha maior solidão.
Diga que precisa de mim com você aqui com você, ao meu lado. Qualquer lugar que você for, deixe-me ir também. Christine, isso é tudo que te peço. Compartilhe comigo cada dia, cada noite, cada manhã. Você sabe que te amo. Qualquer lugar que for, deixe-me ir também. Me ame, isso é tudo que peço.
Ele sabe perfeitamente que como representante que é das paixões da vida, onde ele estiver, o Fantasma não estará. Então, fique comigo o tempo todo, que o Fantasma não estará lá. Então, eu evito que você caminhe para a verdadeira luz te oferendo uma luz falsa. É uma paixão com furto, comodismo, aceitação social, uma saída convencional que vai te deixar numa zona confortável e sem risco, e não terá mais medo. Esse é Raoul.
Este é o apelo que a cultura faz a minha amada, para que ela saia de perto de mim, dos riscos que eu levo por ensinar uma profundidade do coração, um mistério para quem não quer penetrar nessa intimidade, nessa viagem para o interior, mas com proposta de relacionamentos universais, de fraternidade, harmonia, solidariedade, compartilhamento de sentimentos. Em qualquer lugar que ela for, lá estará a cultura, eu, o fantasma, não poderei estar presente. Se ela me ouve, os valores culturais se perdem, a segurança se perde, o status que se conseguiu se perde. Não vale a pena ouvir a voz desse fantasma, é melhor ficar dentro da segurança que a cultura oferece, mesmo que jamais eu tenha oportunidade de ouvir essa voz que me ensina a pureza dos sentimentos.