Certo fazendeiro convivia pacificamente com seus cães na administração da fazenda. Com o tempo, contaminado pelo egoísmo, deixou de ser bondoso e justo com seus animais. Explorava em demasia a ordenha das vacas, o trabalho dos cavalos, a carne das aves... Mantinha a fazenda sob a proteção dos cães que tinham sido adestrados para proteger a área de qualquer ameaça externa. Acontece que alguns animais mais insatisfeitos começaram a importunar o fazendeiro com protestos e quebra na produção. Ouviram falar que existia um dragão do outro lado do mundo que proporcionava à força os bens que todos sonhavam possuir, e passaram a evocar o espírito desse dragão, que viesse destruir o fazendeiro e assumir a administração da fazenda. Outros animais mais ponderados, racionais e espiritualizados, que constituíam a maioria na fazenda, sentiram o perigo que havia nessa evocação, que o fazendeiro já estava sendo possuído pela alma do dragão, e foram em romaria pelas veredas da fazenda pedir as cães que protegessem a harmonia que existia, que não deixassem o dragão monopolizar tudo, e que o fazendeiro já estava possuído.
Os cães entraram em conflito. Foram adestrados para obedecerem ao fazendeiro. Por outro lado, também foram adestrados para defender a fazenda, representada por todos os animais. Sentiram, enfim, que a fazenda corria risco, pois onde o dragão passava a administrar ocorria muita morte e perda da liberdade. Os cães resolveram afastar o fazendeiro obcecado e garantiu com a força do adestramento a manutenção da lei e da ordem como foram ensinados. Os animais revoltosos continuaram a lutar na clandestinidade e com violência pela vinda do dragão.
Enquanto os cães garantiram a segurança da fazenda, o dragão não se aproximou. Foi um período de prosperidade para a fazenda, mesmo com os animais agitados fazendo o maior barulho e más insinuações com tudo o que acontecia. Foi destruindo sistematicamente com violência e falsas narrativas toda a moral dos cães, ingênuos em suas boas intenções. Chegou a um ponto que na fazenda só se ouvia o grito de protestos dos exaltados evocadores do dragão, e com isso cooptavam estudantes, professores, juristas e até eclesiásticos menos esclarecidos na verdade.
Os cães resolveram entregar a gerência da fazenda aos novos fazendeiros que se digladiavam para assumir o poder central, com a bandeira do dragão, e assumindo o mando sobre os cães.
Será que isso dará certo?