Um velho mercador de Damasco, ao encontrar certa vez um de seus amigos, disse-lhe:
- Vejo-me forçado a evitar a tua companhia, porque ouvi hoje, ao sair para o trabalho, alguém insinuar torpezas a teu respeito.
Replicou o amigo, encarando-o muito sério:
- Já me ouviste maldizer de alguém?
- Não = confessou o damasceno surpreendido.
- Sendo assim - retorquiu-lhe o amigo com a mais natural segurança -, evita a companhia dos caluniadores que falam contra mim. Amanhã assacarão também calúnias e torpezas mais terríveis, talvez, contra ti.
Podemos comparar o caluniador à serpente venenosa e traiçoeira.
Conta uma lenda que os animais um dia interpelaram a serpente:
- O leão - alegaram eles -, atira-se contra a presa, mata-a e devora-a. Estraçalhada pelo lobo, a ovelha serve de alimento. O tigre, quando faminto, ataca o carneiro e arrasta-o para o seu covil. E tu, hedionda serpente, que fazes? Mordes e inoculas veneno. Ora, que proveito tiras da tua perversidade peçonhenta?
Respondeu a serpente, retorcendo-se esverdeada:
- Nada espero dos golpes venenosos que desfiro. Do mal que faço não tiro o menor proveito. E procedendo assim, traindo, envenenando, semeando a dor e a morte, não sou pior do que o caluniador.
Este é mais um texto que nos adverte. A lenda final se encontra em Tahanit, 8 a. A parte inicial do trecho é de Ibn Gabirol, o célebre moralista, poeta e filósofo medieval. Valiosas indicações sobre Ibn Gabirol o leitor poderá encontrar no livro Antologia judaica, de Carlos Ortiz e Jacó Guinsburg, São Paulo, 1948, p. 51 e s.s.
Colocando a serpente equipada ao caluniador, que não usufrui materialmente da sua peçonha, mostra que não podemos agir dessa forma e termos o maior cuidado com as pessoas que têm essa atitude. Hoje, com tanto fake news ao nosso redor, podemos imaginar cada ação dessa como o bote de uma serpente. Se sou testemunha de tal ato, devo me afastar dessa fonte de peçonha que poderá a qualquer momento me atingir.
Posso dizer com segurança que no Brasil atual, a pessoa mais atingida por essa peçonha é o presidente Bolsonaro. Desde que chegou ao poder, tentando desbaratar os efeitos nocivos da quadrilha que aparelhou nossas instituições com a moeda da corrupção como fator de cooptação, se tornou o alvo de todas essas serpentes. Muitos não têm o perfil de uma serpente, como o líder deles, analfabeto e prepotente, afirmava revoltado ser uma cascavel cuja cabeça não havia sido atingida. Mas seguem defendendo as serpentes, mostrando que mesmo sendo bons cidadãos podem lutar em favor do mal, devido ao veneno que entrou em suas veias racionais e não consegue elaborar uma crítica dos seus atos.
Felizmente somos a maioria que ainda não foi contaminada, que apoia o presidente e que deseja a limpeza moral da nossa nação. O problema é que ainda somos desorganizados e pouco engajados nessa luta tão necessária para transformar o nosso país no coração do mundo e a pátria do Evangelho.