É lógico que nossa vida se processa no momento atual, no hoje, no agora. Porém a nossa mente está sempre conectada com as memórias do passado e com as perspectivas do futuro. Isso pode ser tão forte que nosso sentido do agora pode se perder. Podemos ficar tão fixados no passado ou no futuro, que o presente fica em segundo plano. Perdemos a vida, ou nos rastros do passado ou nos reflexos do futuro. O primeiro não pode ser recapitulado, o segundo pode nunca surgir da maneira que imaginamos.
Isso pode parecer algo difícil de acontecer. Como alguém pode se perder no passado ou no futuro e esquecer a vida presente? Também eu pensava dessa forma, não acreditava que esse desvio fosse tão forte a ponto de esquecermos o presente. Até o dia que passei a atender como paciente uma colega médica, cujo sintoma era justamente esse. Ela era pediatra, médica experiente, bom relacionamento familiar, mas de repente a sua mente passou a se fixar no passado, querendo reproduzi-lo a todo custo. Desenvolveu forte depressão, sintomas obsessivos e compulsivos, já tinha passado por vários colegas psiquiatras, já havia experimentado diversas condutas farmacológicas, psicoterapeutas, sem resultado eficaz.
Ao consulta-la observei a fixação da sua mente no passado, queria que determinada época voltasse a acontecer sem que colocasse o objetivo desse retorno. Isso inviabilizava a psicoterapia, pois não havia argumentações, era sempre aquela repetição do desejo de voltar o passado á realidade atual. Os medicamentos, o máximo que podiam fazer era promover a sedação, deixar a energia da mente diminuída, induzir o sono, pois ao voltar a energia mental, novamente o desejo do retorno do passado voltava. Com o quadro clínico dentro dessas características psicóticas, estava indicada a eletroconvulsoterapia, e após consulta e a aceitação dos familiares, a paciente foi encaminhada ao Instituto de Psiquiatria em São Paulo. O procedimento foi realizado com sucesso e a paciente ficou livre dessa obsessão por certo tempo.
Este é um bom exemplo do desvio mental grave, do presente para o passado. Percebi dessa forma que devo domesticar minha mente para não se voltar tanto para frente ou para trás. Devo viver o agora como o momento mais importante. Claro que devo aproveitar as experiências do passado e construir perspectivas para o futuro, mas sem viver dentro dessas instancias mentais. Fazendo assim observo o mundo com mais colorido, as oportunidades do amor se mostram mais frequentes, a vida se torna mais rica de opções.