Continuemos o estudo interpretativo da obra de Humberto de Campos / Chico Xavier... “Brasil coração do mundo, pátria do Evangelho”, continuando no quarto capítulo “Os missionários”, onde Ismael fala aos novos missionários.
Um sopro de reformas se anuncia, impetuoso, no âmago das organizações religiosas da Europa e, em breves dias, Roma conhecerá momentos muito amargos, não obstante os sonhos de arte e de grandeza de Leão X, que detém neste instante uma coroa injustificável, porquanto o reino de Jesus ainda não é desse mundo; mas, temos de aproveitar as possibilidades que o seu campo nos oferece para encetar essa obra de edificação da pátria do Cordeiro de Deus.
Pregareis, em Portugal, a verdade e o desprendimento das riquezas terrestres e trabalhareis, sob a minha direção, nas florestas imensas de Santa Cruz, arrebanhando as almas para o Único Pastor. O característico de vossa ação, como missionários do Pai Celestial, será um testemunho legítimo de renúncia a todos os bens materiais e uma consoladora pobreza.
Quase todos os Espíritos santificados, ali presentes, se oferecem como voluntários da grande causa. Entre muitos, descobriremos José de Anchieta e Bartolomeu dos Mártires, Manuel da Nóbrega, Diogo Jácome, Leonardo Nunes e muitos outros, que também foram dos chamados para esse conclave no mundo invisível.
Vejamos as críticas de Leonardo Marmo neste trecho: A expressão “Cordeiro de Deus”, a qual, na missa católica, se completa com “...que tira os pecados do mundo...”, não consiste em uma expressão espírita e não tem o menor significado dentro da doutrina espírita, já que não acreditamos na “Salvação”, como é o caso do catolicismo e de outras religiões cristãs.
Como é possível perceber, analisando até o presente capítulo, já fica difícil aceitar o texto como obra propriamente espírita. Estaria mais para um livro meramente espiritualista ou ficcional. Entretanto, a situação fica mais grave se considerarmos que tal livro é exaltado como fundamental para o Espiritismo brasileiro e mundial. E é justamente por amar Chico Xavier e Humberto de Campos, respeitando e amando suas verdadeiras e extraordinárias contribuições, como elevadíssimos desenvolvimentos das obras básicas de Allan Kardec, que temos dificuldade em aceitar este livro como obra relevante doutrinariamente.
Neste ponto acredito que Leonardo Marmo esteja correto. Não podemos aceitar este livro como um suporte doutrinário como acontece com as obras de Allan Kardec e de André Luiz. Este livro que analisamos parece que extrapola os limites do espiritismo, da sua pureza doutrinária, e entra em caminhos conciliatórios incompatíveis com a doutrina, como considerar Jesus como o “Cordeiro de Deus que veio para a salvação, tirar os pecados do mundo”. Mas, do ponto de vista de relação com a humanidade, resta um grande serviço esse tom tolerante e apaziguador, trazendo de bom o que a igreja católica faz, mesmo com um ideário fantasioso para encantar mentes mais simplórias. Que mal há nisso, se o objetivo é levar as criaturas mais perto do Mestre? Pode não ser o caminho do Espiritismo que implica em pessoas de raciocínio mais vigoroso para suportar o compromisso de sermos responsáveis por nossa própria salvação, e não esperar a bondade de um Cordeiro que Deus nos enviou. Então, vamos considerar este livro um texto espiritualista de grande utilidade para o movimento espírita. Acredito que assim não estaremos denegrindo nem Chico Xavier nem Humberto de Campos.