Sióstio de Lapa
Pensamentos e Sentimentos
Meu Diário
02/10/2020 00h29
VIVO NAS LEMBRANÇAS

            Desde que ela partiu o meu mundo desabou... perdi a motivação de procurar a felicidade em qualquer lugar. Volto sempre ao passado na minha mente, em busca das lembranças. Não tenho foco no presente, nem no futuro. Só o passado assume a dimensão de realidade, pois são nas lembranças que eu encontro ela.

            Não sei porque ela foi embora, não deixou carta, não disse nada. Simplesmente pegou suas coisas, o mínimo possível e desapareceu. Nem seu perfume ela deixou que ficasse como rastros de sua passagem. 

            Não sei se vou procura-la... não sei aonde! Mas o que direi a ela quando a encontrar, se a encontrar? Que fiz de errado? Porque um dia lhe disse que a amava com todas as forças do meu coração, mas que entendia que o amor que extrapolasse da minha alma eu poderia dar a mais alguém? Será que até as migalhas que caiam do nosso amor ela queria também, tudo para si? Será que este foi o meu erro? Mas por que eu fico agora assim, vivendo sem sentido, como uma alma penada que não encontrou o seu jazigo? 

            Será que vale a pena viver assim, só remoendo as lembranças? Será que a minha vontade de fazer a vontade do Pai e distribuir o excesso de amor que eu recebia dEle era para deixar tudo com ela? Será que eu deveria aceitar ser assim tão reprimido por ela?

            Dessa forma vou vivendo, trocando passos pelas ruas, sem sentido, sem destino, e na realidade caminhando por minhas lembranças junto dela. Dos abraços e beijos que trocávamos, parece que sinto o gosto com tanta realidade... do aconchego na cama, seu toque macio, e nossos desejos escorrendo por nossos corpos. Chego a sentir prazer com a força dessas lembranças. 

            Quero sentar em qualquer lugar dessa estrada que me leva para lugar nenhum. Quero colocar a cabeça entre meus joelhos e sonhar com tanta ventura, gozar de tanto prazer e depois chorar de tanta saudade. 

            Esta vida real que está ao meu lado, as flores, os pássaros, a brisa, o luar, o manto das estrelas... nada mais significam para mim. Somente as lembranças que se agigantam na minha mente, e fazem as lágrimas bloquearem a luz do sol, para que eu fique cada vez mais isolado da realidade e mergulhado no paraíso de minhas lembranças.

            Quero aumentar o sentimento de realidade das lembranças dela. Volto para casa, vou ver as plantas que ela cultivava no jardim, a xicara que ela me trazia café, o lado da cama que ela costumava dormir ao meu lado. 

            Fujo das pessoas que sabem da minha desdita e querem me ajudar de qualquer forma, mas não da forma que eu quero, que eu preciso... ter ela de volta novamente ao meu lado. Por isso eu lembro, pois assim consigo ter ela de volta, mesmo sem ela saber ou mesmo querer... dentro das lembranças. Por isso eu quero viver dentro das minhas lembranças, pois são elas que me devolvem minha adorada. São dentro delas que eu posso voltar a acaricia-la, beija-la e fazer toda forma de amor que antes nós vivíamos.

            Somente quem tem o poder de me fazer sair de dentro das minhas lembranças é a esperança. É a esperança que me faz olhar através da janela e ver se ela está de volta. Não perguntaria nada, não queria explicação... eu correria para os seus braços em busca dos seus beijos.

            A noite chega e com a escuridão a solidão se faz mais forte, as lembranças mais vívidas, mistura meus pensamentos, fantasia com realidade... me aproximo da loucura! Quem me salva desse redemoinho que quer me levar ao abismo é o sono que apaga por momentos tanto desatino.

            Quando penso no quanto ela pode está distante neste momento, há quase três meses de sua ausência, vejo que minhas carnes se atrofiaram e a minha esperança foi abatida, esperança de ter ela comigo novamente, de reviver tão grande amor. Parece que as lembranças sofrem um terremoto, os sonhos são destruídos, feitos em pedaços, irrecuperáveis.

            Desesperado, peço a Deus que não me envie mais tanto amor quanto antes, pois agora não tenho a quem entregar, que posso me afogar em tanto amor represado. A solidão agora é minha constante companheira e má conselheira... pede para eu acabar com o corpo e deixar de sofrer. Mas não posso fazer isso, enquanto existir um resto de lembrança dela que me faça viver.

            Não me incomodarei de viver assim, nas lembranças, sentindo a presença dela de qualquer jeito, mesmo que desse jeito eu morra de inanição.

Publicado por Sióstio de Lapa
em 02/10/2020 às 00h29