Interpretando a letra da canção “Noite cheia de estrelas” composta por Cândido das Neves e interpretada por diversos cantores, entre eles, Martinho da Vila.
NOITE CHEIA DE ESTRELAS
(Cândido da Neves / Martinho da Vila)
Noite alta, céu risonho
A quietude é quase um sonho
O luar vai sobre a mata, qual uma chuva de prata de raríssimo explendor
Só tu dormes, não escutas
O teu cantor
Revelando à lua airosa a história dolorosa deste amor
Lua...
Manda a tua luz prateada despertar a minha amada
Quero matar os meus desejos
Sufoca-la com meus beijos
Canto...
E a mulher que amo tanto, não me escuta, está dormindo
Canto e por fim
Nem a lua tem pena de mim
Pois ao ver que quem te chama sou eu
Entre a neblina se escondeu
-x-
Lá no alto a lua esquiva
Está no céu tão pensativa
As estrelas tão serenas, qual dilúvio de falenas andam tontas ao luar
Todo astral ficou silente
Para escutar
O teu nome entre as endechas e as dolorosas queixas ao luar
-x-
Canto...
E a mulher que eu amo tanto, não me escuta, está dormindo
Canto e por fim
Nem a lua tem pena de mim
Pois ao ver que quem te chama sou eu
Entre a neblina se escondeu
-x-
Canto e por fim
Nem a lua tem pena de mim
Bela canção, de romantismo suave, profundo e dolorido, como a alma querendo se queixar de Deus o seu padecimento.
O cantor chega próximo à janela da amada que dorme naquele momento. Ele tem consciência disso, mesmo assim, canta o que sente para a lua, requisitando o seu testemunho para o sentimento que invade seu coração.
Além do testemunho ele pede para lua despertar a sua amada, pois só ela pode matar seus desejos, quer beijá-la intensamente... por isso canta, mas ela não escuta, está dormindo.
Mas a lua não tem pena dele, pois ao identifica-lo, ao invés de atende-lo, se esconde entre as nuvens, permanece no alto, pensativa, deixando as borboletas noturnas voando tontas sem luar... todo o cosmo, o astral fica emudecidos, apenas escutando as dolorosas queixas, como membros de um jurado especial, divino, que analisa o caso apresentado em versos melancólicos.
O poeta não é atendido, a mulher que tanto ama continua dormindo, a lua continua escondida. Desiste do seu intento, não se queixa mais da amada que continua adormecida, ela não tem culpa, está dormindo, não sabe o que ele está sentindo. Ele se queixa agora da lua, a última instância que requisitou para escutar suas razões, para intervir em sua defesa, para acordar quem dormia e não podia perceber quem ele era na realidade. Nem o jurado divino se manifestou. Sua canção se perde no vazio da noite sem luar, na floresta escura, talvez regada pelas lágrimas das borboletas tontas que também se sentem órfãs do luar e da justiça divina.
Simboliza muito amor real que se encontra dentro do coração do amante, mas que a amada, mesmo acordada fisicamente, está dormindo romanticamente, espiritualmente, coberta por grossos mantos de preconceitos, hipocrisias culturais, falsas narrativas. A lua deixou de ser evocada, ela não assume a defesa de quem ama, não consegue dissipar as amarras dos preconceitos. Resta apelar para o jurado divino que pode se manifestar a favor da verdade, do amor, da justiça. O amante tem que provar, com o tempo, que é portador desses atributos. Que o seu amor não está contaminado pelo egoísmo, vaidade, injustiça, mentiras ou qualquer traço de iniquidade. Somente assim pode esperar o veredicto positivo.