Interessante procurar saber como o mal pode se desenvolver e ameaçar todos os países do mundo. O que se passou na Alemanha Nazista sob o comando de Hitler e seus asseclas, abordado pela Netflix em uma série sob o título “Hitler’s circle of evil” serve como um bom campo para nossas reflexões.
LXXXV
OPERAÇÃO VALQUÍRIA II
Em Berlim, a Operação Valquíria está em ação, com soldados cercando Goebbels e Speer no Ministério da Propaganda. No comando do exército reserva está o major Otto Remer. Achando que Hitler está morto, Remer não sabe que está fazendo parte de um golpe. Mas os conspiradores deixaram Goebbels com um telefone. Ele ligou para o major Remer, convenceu-o e disse: “Precisa parar isso. Hitler está vivo.”
O major Remer acata as ordens, mas o golpe ainda está ativo. Himmler dá ordens cancelando a mobilização da Operação Valquíria, mas não basta. Havia muito pânico em Berlim e em círculos do partido. E muitas pessoas souberam do assassinato e torciam para ele estar morto.
O ministro da Propaganda Goebbels percebe o que precisa ser feito. Saber que Hitler está vivo daria um basta à Valquíria. Hitler tem de quebrar seu silêncio de um ano e dizer ao povo alemão que está vivo.
O que sobrava aos nazistas era se comunicarem. Precisavam convencer o povo alemão de que estava tudo bem, que nada mudou. Mas a transmissão sofre problemas técnicos, e o rumor de que Hitler está morto se propaga rapidamente. Se não transmitirem logo, a Operação Valquíria não poderá ser detida.
Finalmente, após a meia-noite, estão prontos. Não há dúvidas de que a voz no rádio é de Hitler. “Eu lhes falo hoje por dois motivos. Primeiro, para que ouçam a minha voz e saibam que estou bem, em boa saúde.” Aquilo ainda tinha muito peso para o povo. Ainda tinha muito impacto. “Segundo, para saberem os detalhes desse crime, sem precedentes na história alemã.”
O golpe fracassa. Os conspiradores sabem que falharam. Para o povo alemão, há uma grande sensação de terem sido salvos, de que, se Hitler ainda está vivo, ainda possam vencer a guerra.
Os conspiradores são capturados. Stauffenberg e seus homens são mortos a tiros. Logo após essa ação, Bormann passa a mensagem: “A tentativa de golpe por generais irresponsáveis foi massacrada. Os líderes foram mortos.”
Estava claro que o assassinato era para ser o início de uma revolta militar e política contra o regime. É um movimento bem diverso, que inclui liberais, pessoas com valores cristãos, e também conservadores que estão muito preocupados. E a rede de inteligência de Himmler encontrou provas perturbadoras que incriminam alguém do círculo íntimo. No cofre dos conspiradores a SS encontra uma lista de quem encabeçaria o novo governo caso o golpe desse certo. Em ministro do Armamento, estava escrito “Speer”.
Albert Speer volta ao cenário. No diário de Stauffenberg, Himmler descobre que Speer foi convidado para uma reunião com os conspiradores no mesmo dia da tentativa de assassinato. A coisa está feia para Speer.
Himmler imediatamente ordena que não haverá mais execuções. Para um expurgo em massa da oposição, Himmler precisa de informações, e gente morta não fala. Eles são torturados brutalmente até contarem os segredos, depois são enforcados.
Há rumores de que Albert Speer foi preso, até mesmo executado. Mas a Gestapo vê que as provas contra Speer são inconclusivas. Felizmente, ele recusou o convite para a reunião com os conspiradores. Ele disse que não podia ir, estava ocupado de exausto. Motivos reais. E a escolha de Speer como ministro do Armamento podia ter partido do desejo dos conspiradores. Felizmente, a lápis, escrito ao lado do nome dele havia um ponto de interrogação e duas palavras: se possível.
É um momento difícil para Speer, mas ele o supera, e o ponto de interrogação basta. Sem o ponto de interrogação e o “se possível”, os nazistas teriam suposto que ele já tinha aceitado estar em um governo futuro sem Hitler, indicando sua cumplicidade no golpe. Ele teria sido enforcado.
Como resultado da trama, milhares são executados, muitos são pendurados como carcaças. Algumas execuções são filmadas por ordem de Hitler, para que ele pudesse assistir.
Caso o golpe tivesse dado certo, os golpistas assumiriam o poder e poderiam negociar o fim da guerra. Livraria o mundo de mais meses de sofrimento, de perdas de vidas, e a nação alemã teria um atenuante forte para a sua defesa contra os ataques éticos contra a humanidade que cometeu. Infelizmente, o golpe não deu certo e o principal mentor de uma sociedade que começava a ver as atrocidades dos nazistas, Stauffenberg, foi fuzilado impiedosamente sem nenhuma gota de consideração, pelos seus algozes, como era de se esperar, nem pelos milhares de cidadãos que estavam por trás dele e que terminaram sendo torturados, fuzilados ou enforcados.
Fica para nós, no Brasil e no mundo, que temos preocupação ética com nossas ações, a lição de que não podemos ficar impassível frente ao poder exercido em nosso nome por um facínora como Hitler e seus asseclas. Temos que ficar bem atentos e prontos para reagir com vigor na primeira oportunidade. O povo alemão esclarecido e de boas intenções procurou dar o primeiro passo, eliminar o chefe das atrocidades, como ele fez direta e indiretamente com tantas pessoas, mas falhou em dar seguimento a ação desencadeada, se armando e se agrupando dentro da Alemanha. Certamente isso daria maior visibilidade para que mais pessoas dentro da Alemanha se alinhassem ao intento revolucionário e que o mundo identificasse que existia uma terceira frente de guerra contra os nazistas. Isso com certeza traria o fim da guerra com mais rapidez.
Hoje, o que observamos? Quase ninguém no mundo conhece o ato de heroísmo desencadeado por Stauffenberg e seus colegas. Essa visão heroica serve para nós, aliados, como para os alemães que não concordavam com as atrocidades de Hitler. Não serve para os nazistas, naturalmente, que divulgaram maciçamente dentro da Alemanha a narrativa do comportamento dos golpistas, que para eles é verdade, inclusive com adjetivos perversos como traidores, irresponsáveis, miseráveis, etc., o que para os nazistas é correto e para os alemães que não possuem o devido senso crítico de analisar o que acontece.
Este é o motivo pelo qual pessoas de má índole quando assumem o poder, a primeira medida que procuram fazer é desarmar a população para dificultar esse tipo de revolta armada que poderia ter acontecido na Alemanha nazista.
Também faço uma crítica ao comportamento das pessoas no resto do mundo, a maioria delas prejudicadas pelos nazistas. Não haver um momento de solidariedade a Stauffenberg para marcar o seu ato de heroísmo no nosso ponto de vista. As pessoas que estão no poder e não procuram informar aos jovens o que aconteceu na realidade, e deixam os estudantes sem essa informação tão preciosa, jovens como eu que só vim a descobrir e fazer minha análise pessoal do comportamento de Stauffenberg e seus colegas somente agora, na terceira idade, e mesmo através de um trabalho documental na Netflix.
Tudo isso nos chama a atenção para que não sejamos envolvidos por falsas narrativas que servem para ocultar as más intenções e atrocidades dos seus criadores. Neste momento de batalha espiritual cruenta que vivemos é mais do que nunca necessário esse cuidado. Lembrar sempre da orientação do nosso comandante: “Orai e vigiai”.