Encontrei na internet a entrevista de Bill Moyers a Joseph Campbell, publicada em 02-11-2019, com 7.145 visualizações, que achei interessante reproduzir partes neste espaço, para refletir junto com meus leitores neste momento em que o Brasil tem na presidência uma pessoa considerada como mito. Será que Joseph Campbell fará alguma associação moderna com o nosso caso Brasil e reflexos no mundo?
BM – Deixe-me dizer como me sinto quando leio essas histórias, seja qual for sua cultura de origem. Fico maravilhado ao ver o espetáculo da imaginação humana simplesmente tentando entender esta vida. Isso também lhe acontece?
JC – Eu vejo a mitologia como a pátria das Musas. As inspiradoras da arte, da poesia. Ver a vida como um poema e ver a si próprio participando de um poema. É isso que o mito nos dá.
BM – O que quer dizer com poema?
JC – Quero dizer um vocabulário, não em forma de palavras, mas de atos e aventuras, que é conotativo, que conota algo transcendente da ação imediata. E que inspira todo o conjunto de modo que você sempre se sente em sintonia com o ser universal.
BM – O que me interessa nisso tudo é que em vez de abalar minha fé, seu trabalho com a mitologia libertou minha fé das suas prisões culturais.
JC – Libertou também a minha. Sei que ele tem esse efeito com as pessoas que realmente entendam a sua mensagem. Cada mitologia, cada religião é verdadeira nesse sentido. Como uma metáfora do mistério humano e cósmico. Mas quando ela fica presa à sua metáfora, então começa o problema.
BM – E a metáfora é...
JC – Veja, Jesus subiu aos céus. Segundo a história, Ele subiu fisicamente aos Céus. Diz a história que sua mãe, ainda viva, adormecida subiu aos Céus. Então, isso é uma metáfora. Não é preciso jogá-la fora. Mas apenas saber o que ela diz.
BM – E o que ela diz?
JC – Diz que Ele não subiu lá para cima, Ele entrou aqui dentro. Que é onde você também deve entrar. E subir ao Céu através do seu espaço interior até chegar à fonte de onde você veio, de onde veio toda a vida.
BM – É esse o sentido da história? Não estaria assim destruindo uma das grandes doutrinas cardeais da fé cristã clássica? A morte, o sepultamento e a ressurreição de Jesus prefigurando a nossa própria, e superando o corpo com uma verdade física superior?
JC – Eu chamaria isso de uma leitura errônea do símbolo. É uma leitura em termos de prosa, e não de poesia. Seria ler a metáfora em termos de sua denotação (forma de uso e manifestação da linguagem em seu sentido literal) e não conotação (forma de uso e manifestação da linguagem em seu sentido figurado), compreende? É um problema puramente literário.
Existe muitos símbolos ao nosso redor. Procuramos ver numa primeira análise o sentido denotativo, o que ele quer nos dizer literalmente. Passar um camelo por uma agulha é um símbolo de impossibilidade. Temos que alcançar o sentido figurado para gerar a compreensão do que estar sendo dito.
A bandeira nacional, símbolo da nação brasileira, deve ser visto com uma rara percepção da alma que reside em todos os conterrâneos.
Campbell propõe uma percepção ainda mais complexa, quando diz que a ascenção de Jesus para o Céu tem o significado dele entrar no espaço interior de cada um