Francisco entendeu a ordem recebida por sua voz audível, que tinha de reconstruir a Igreja de São Damião. Passou a pedir pedras pela cidade a todas as pessoas, carregando uma carroça puxada por ele mesmo, em roupas andrajosas, com um perfil de mendigo. Para quem antes andava pela cidade em belos trajes, cercado de amigos em noitadas de boemia, era uma mudança radical demais, aproximava da loucura, como muitos já o começaram a ver assim.
Essa “loucura” de Francisco parecia ser contagiosa. Muitos se engajaram nessa tarefa de levar pedras para a construção da igreja, muitos deixaram seus afazeres de antes e até suas riquezas para seguir o propósito de Francisco.
Como uma atividade braçal dessa natureza, associada à loucura de um jovem, desertor da riqueza de um pai e das honras de um rei, pôde atrair tanta gente para se engajar no trabalho da mesma forma que ele? Somente posso explicar por uma forma de fagulha divina, energética, que todos possuímos no nosso espírito, criada pelo próprio Deus. Essa fagulha energética que todos possuímos, mas que a pessoa de melhor sensibilidade é quem tem mais facilidade em deixa-la se incendiar.
Francisco ouviu a voz que incendiou o seu espírito, dominou a sua mente e fez com que a sua vontade fizesse o que Deus queria, mesmo que não entendesse no momento que a meta não seria simplesmente erguer uma igreja de pedra, mas reerguer a igreja que o Cristo havia construído com suas ações e agora estava dominada pela pompa, luxo e mordomias, impregnada pelo poder mundano, longe do poder espiritual.
Foi o trabalho inicial de juntar pedras que sinalizou os primeiros passos da vontade que Deus queria que Francisco realizasse. As pessoas mais sensíveis, de mais fácil combustão, com esse ato de Francisco, logo se aproximaram e começaram o trabalho que até hoje persiste no mundo todo, não somente na cidade de Assis onde teve início.
Francisco teve a coragem de deixar suas riquezas paternas, abdicar dos dotes e honras que podia conquistar para carregar as pedras pela cidade como um louco.
Eis um ponto determinante: coragem! Nada teria acontecido se Francisco, mesmo tendo ouvido a voz, não tivesse a coragem de fazer aquilo que ela orientava.
Esta é a minha dificuldade, igual aquela do jovem rico que perguntou a Jesus o que fazer para obedecer a Deus. Ele também não conseguiu vender o que tinha, doar aos pobres e seguir o Cristo. O mundo material ainda exercia sobre ele uma forte influência.
Assim também acontece comigo. Sofro forte influencia, ainda, do mundo material. Sei o caminho que minha Voz Silenciosa já apontou. Apesar de fazer de forma discreta o que é coerente com a tarefa, pouquíssimos percebem a dimensão espiritual que ela traz. Estou ainda muito longe do trabalho explícito que Francisco passou a fazer em obediência a sua voz.
O meu “juntar de pedras” dentro da tarefa que minha Voz me traz, é aproximar as pessoas fraternalmente, acima de qualquer preconceito de qualquer natureza, desde que esteja em obediência ao Amor Incondicional. Isso implica em deixar a família nuclear em segundo plano e privilegiar a família universal, construindo com essas pedras, as aproximações das pessoas, o Reino de Deus.