Sempre entendi esse triângulo bíblico equivocado do ponto de vista da família universal. Sara, esposa de Abrão, o patriarca, era estéril, não podia ter filhos. Abrão se ressentia disso, teria que deixar sua herança para seus escravos.
Sarai tinha uma escrava egípcia chamada Agar. Como sua propriedade, Sara podia ofertar Agar ao marido para ela engravidar e assim dar o filho que Abrão queria e que por direito da tribo, seria o filho de Sarai também. Esse acordo foi cumprido, mas observamos um completo desrespeito a figura humana de Agar, de ser nossa irmã conforme filha do mesmo Pai que nos criou, de acordo com os ensinamentos de Jesus.
É nisso que consiste o equívoco que identifico na Bíblia, comparando o comportamento de Abrão e Sara no Antigo Testamento, com os ensinamentos de Jesus no Novo Testamento. Ainda entra na crítica da poligamia, como se essa fosse a responsável pela injustiça praticada.
Aplicando o Reino de Deus como ensinado por Jesus a esse triângulo bíblico do Antigo Testamento, teríamos uma outra forma de agir.
Primeiro, as três pessoas deveriam ser consideradas como irmãs, que ninguém deveria fazer ao outro o que não desejasse para si. Portanto, ninguém poderia fazer de Agar um mero útero para gerar filhos para terceiros. Com certeza isso não seria o desejo dela e portanto esse acordo não poderia ser feito dessa forma.
Mas o acordo poderia ser feito com os critérios do Reino de Deus. Agar trabalhava para Abrão e Sara, não como escrava, mas como uma funcionária que recebia com justiça o salário do seu trabalho. Surgindo esse dilema na vida de Abrão e Sara, por ela não poder gerar filhos, os dois podiam ter esse pensamento, de ser Agar a pessoa que gerasse o filho. Mas Agar deveria ser consultada quanto a proposta. Os três deveriam conversar juntos, sem nenhum tipo de maldade ou subterfúgio. Abrão poderia abrir a conversa:
- Agar, eu conversei com Sara sobre a impossibilidade dela ter filho e que isso poderia acontecer com você, se você assim aceitar. Sei que o filho gerado é de grande responsabilidade para os pais e, portanto, eles devem ter uma conexão especial, baseado no amor e nos desejos sexuais. Eu tenho amor por você como cidadão do Reino de Deus, também tenho desejos sexuais que aprendi a conter para não lhe prejudicar na essência. A essência que estou falando é que você deve ter também suas expectativas quanto o futuro de sua vida, de ter a sua família, um companheiro e filhos. A minha intromissão dentro do seu corpo poderá gerar um filho incoerente com suas perspectivas e isto não seria certo. Por isso estamos aqui discutindo isso com você. O que você acha dessa proposta?
Agar se mostra surpresa com o teor da conversa. Olha para Sara que se mostra impassível, como se concordasse com qualquer decisão que partisse dela. Após uns minutos de silêncio em que Agar processava sua resposta, todos pareciam alertas, para não se desviarem das leis do Reino de Deus. Agar responde:
- Patrão Abrão, sei que todos nós estamos dentro das leis do Reino de Deus, que ninguém deseja o mal de ninguém, e que sempre observamos a bússola comportamental, de fazermos ao outro aquilo que desejamos ser feito a nós. Aplicando essa bússola agora e eu ficando no seu lugar, vejo que é isso que eu desejaria ser feito, que eu tivesse um filho teu para te dar o sentimento de trabalhar com o prolongamento da tua carne. Vejo também a resignação de Sara em aceitar esses fatos sem nenhum constrangimento ou ressentimento. Portanto, a decisão que eu tomar não causará nenhum constrangimento ou revolta. Sinto que estou entre irmãos que desejam o melhor uns para os outros. Sinto que a bússola aponta para que eu gere o filho que complementará a vida de vocês. Eu posso gerar o filho, amamentar e depois deixa-lo com vocês como filho legítimo e sabendo de toda essa história. O preço que eu tenho de pagar é o de reformular os meus paradigmas. De dar a conhecer a meu futuro companheiro toda essa história que iremos passar. Estou pronta, mas Sara tem algo a dizer?
- Sim, Agar, tenho que lhe agradecer toda essa compreensão e capacidade de alterar os seus paradigmas para melhorar nossa vida. Não tenho nenhum tipo de ciúme por te deitares com meu marido, para gerar o filho que tanto ele e eu queremos. Garanto a você que ele será criado e educado por nós, quando você nos entregar, com todo o carinho, amor e dedicação como se fosse o nosso filho biológico. Talvez esse filho, Agar, tenha mais peso emocional por ser um filho espiritual, principalmente para mim, que sei que devo fazer a vontade do Pai acima de minha própria vontade.
Observamos assim que se a lei do Reino de Deus tivesse sido cumprida naquele triângulo do Antigo Testamento, nossa realidade atual seria outra bem diferente, os muçulmanos e cristãos de hoje teriam outra mentalidade.