Meu Diário
22/11/2023 01h01
CE 10 – INCOGNOSCÍVEL

            Continuamos com a reprodução comentada da Carta Encíclica do Papa São Pio X, publicada em 08-09-1907. Esta é a terceira parte da primeira parte, onde o Papa faz a “Exposição do Sistema e sua Divisão” começando pelo “O Modernista Filósofo”.



            Esta necessidade das causas divinas não se fazendo sentir no homem senão em certas e especiais circunstâncias, não pode de per si pertencer ao âmbito da consciência; oculta-se (porém), primeiro abaixo da consciência, ou, como dizem com vocábulo tirado da filosofia moderna, na subconsciência, onde a sua raiz fica também oculta e incompreensível. Se alguém, contudo lhes perguntar de que modo essa necessidade da divindade, que o homem sente em si mesmo, torna-se religião, será esta a resposta dos modernistas: a ciência e a história, dizem eles, acham-se fechadas entre dois termos: um externo, que é o mundo visível; outro interno, que é a consciência. Chegados a um ou outro destes dois termos, não se pode ir mais adiante; além destes dois limites acha-se o incognoscível. Diante deste incognoscível, seja que ele se ache fora do homem e fora de todas as coisas visíveis, seja que ele se ache oculto na subconsciência do homem, a necessidade de um quê divino, sem nenhum ato prévio da inteligência, como o quer o fideísmo (doutrina teológica que, desprezando a razão, preconiza a existência de verdades absolutas fundamentadas na revelação e na fé), gera no ânimo já inclinado um certo sentimento particular, e este, seja como objeto seja como causa interna, tem envolvida em si a mesma realidade divina e assim, de certa maneira, une o homem com Deus. É precisamente a este sentimento que os modernistas dão o nome de fé e tem-no como princípio de religião.  



            Os modernistas têm como princípio da religião o incognoscível, aquilo que está além do mundo visível e além da consciência. O incognoscível quando alcançado, gera no ânimo do homem um sentimento particular do divino, cria uma realidade divina na consciência que funciona como objeto ou causa interna. A geração dessa realidade a partir do incognoscível, os modernistas chamam de fé e como princípio de religião.



            Essa moderna forma de pensar anula toda história transcendental que acompanha a humanidade, que criou ideologias e civilizações. A Bíblia é um bom exemplo disso, a história de um povo acompanhado por Deus dentro da história, que de um homem (Abraão) se projeta para toda a humanidade (Cristianismo). Os fatos criam uma narrativa que orienta na criação e manutenção de sociedades.



            Agora os modernistas descobriram que tudo isso vem do incognoscível e que toda essa criação do divino não tem nada de externo, de transcendental, tudo vem do próprio homem, como os gregos já defendiam em suas cidades cheias de sábios. Porém, a sociedade ideal, construída na base da fraternidade, da família universal, nenhuma conseguiu criar, nem ao menos idealizar.



            Foi somente com o Cristo que chegou como enviado do mundo transcendental, sem nenhuma citação ao seu incognoscível, que foram criadas as bases dessa sociedade ideal que ele chamava de Reino de Deus, onde no topo da pirâmide hierárquica estava o Pai, o Criador de todos e de tudo.



            Mas agora, os modernistas com os recursos da ciência e da sabedoria intrínseca querem anular tudo isso, pois tudo foi criado de forma irracional a partir do princípio de religião que vem do incognoscível.



            Vale a pena destruir todo o arcabouço civilizacional que construímos com base no Cristianismo para refazer tudo a partir de agora com a domesticação do incognoscível, colocando dentro da consciência, quando ele se manifestar, a nossa razão apoiada na ciência? Conseguiremos vencer os instintos que parecem estar presentes no incognoscível mais do que na consciência? Talvez as civilizações criadas pelos movimentos revolucionários que levam consigo os ideais modernistas nos apontem essa resposta.



Publicado por Sióstio de Lapa em 22/11/2023 às 01h01


Imagem de cabeçalho: Sergiu Bacioiu/flickr