Meu Diário
26/11/2023 00h01
CE 12 – BASE DA CRÍTICA HISTÓRICA

            Continuamos com a reprodução comentada da Carta Encíclica do Papa São Pio X, publicada em 08-09-1907. Esta é a quinta parte da primeira parte, onde o Papa faz a “Exposição do Sistema e sua Divisão” começando pelo “O Modernista Filósofo”.



            Entretanto, em todo este processo (do incognoscível gerando sentimentos) donde, segundo os modernistas, resultam a fé e a revelação, deve atender-se principalmente a uma coisa de não pequena importância, pelas consequências histórico-críticas, que daí fazem derivar. Aquele incognoscível, de que falam, não se apresenta a fé como que nu e isolado; mas ao contrário, intimamente ligado a algum fenômeno que, embora pertença ao campo da ciência ou da história, assim mesmo, de certo modo, transpõe os seus limites.



            Este fenômeno pode ser um fato qualquer da natureza, contendo em si algum quê de misterioso, ou poderá também ser um homem, cujo talento, cujos atos, cujas palavras parecem nada ter de comum com as leis ordinárias da história. A fé, pois, atraída pelo incognoscível unido ao fenômeno, apodera-se de todo o mesmo fenômeno e de certo modo o penetra da sua vida. Donde se seguem as duas coisas.



            A primeira é uma certa transfiguração do fenômeno, por uma espécie de elevação das suas próprias condições, que o torna mais apto, qual matéria para receber o divino.



            A segunda é uma certa desfiguração, resultante de que, tendo a fé subtraído ao fenômeno os seus adjuntos de tempo e de lugar, facilmente lhe atribui aquilo que em realidade não tem; o que particularmente se dá em se tratando de fenômenos de antigas datas, e isto tanto mais quanto mais remotas são elas. Destes dois pressupostos, os modernistas deduzem outros tantos cânones que unidos a um terceiro já deduzido de agnosticismos, constituem a base da crítica histórica. Esclareçamos o fato com um exemplo tirado da pessoa de Jesus Cristo. Na pessoa de Cristo, dizem, a ciência e a história não acham mais do que um homem. Portanto, em virtude do primeiro cânon deduzido do agnosticismo, da história dessa pessoa se deve riscar tudo o que sabe de divino. Ainda mais, por força do segundo cânon, a pessoa histórica de Jesus Cristo foi transfigurada pela fé; logo, convém despojá-la de tudo o que a eleva acima das condições históricas.



            Finalmente, a mesma foi desfigurada pela fé, em virtude do terceiro cânon; logo, se devem remover dela as falas, as ações, tudo enfim que não corresponde ao seu caráter, condição e educação, lugar e tempo em que viveu. É em verdade estranho tal modo de raciocinar; contudo é esta a crítica dos modernistas.



            A forma de pensar dos modernistas pretende anular uma forma aceita de raciocínio onde o transcendental foi incluído com forte protagonismo. O malabarismo racional dos modernistas termina por criar uma narrativa com fortes incoerências. Eles defendem que o inconsciente incognoscível que emerge na consciência na forma de fé, de revelação é o que deu origem aos pensamentos divorciados da realidade do passado. Então, os modernistas, sabedores desse mecanismo mental, passam a julgar esses erros a partir da figura material de Jesus. Ele era simplesmente um ser humano, conforme sustenta a ciência e a história, sem nenhuma divindade delirante. Portanto, ele não pode ser colocado acima da história, da ciência. Nada que não sintonize com o humano pode ser aceito, como o seu caráter incorruptível, sua condição de pobreza e de nobreza ao mesmo tempo, sua educação tão simplória no interior da Galiléia e no entanto tão douta na Capital junto aos sacerdotes do Templo de Jerusalém, situado numa cidade tão acanhada quanto Nazaré, num tempo com pouca ciência mas que conseguiu dividir as épocas históricas de antes e depois dEle. Estes são os argumentos propostos pelos modernistas para alcançarmos de imediato a sociedade perfeita com base nos movimentos revolucionários, e deixarmos a idiotice de construir um Reino de Deus com base na solidariedade humana. Confesso que observando os dois argumentos, o que a história produziu até hoje com base nesses “enganos” do Cristianismo, não vejo muita coerência neles, mas, por outro lado, vejo que essas colocações trouxeram convicções em muitas pessoas que conseguiram construir movimentos revolucionários com bandeiras infiltradas com palavras do Cristianismo, como Liberdade, Igualdade e Fraternidade, da Revolução Francesa. Estes argumentos continuam a se infiltrar até hoje nas sociedades, inclusive na própria Igreja Católica, defensora da fé no Cristianismo. Não importa mostrarmos os desastres que acontecem nas sociedades que adotam o pensamento modernista, nas bandeiras socialistas e comunistas, a forma de agir dos novos acadêmicos, juristas, parlamentares e até eclesiásticos, como acontece no Brasil.



            Podemos entender essa distorção do pensamento em busca de uma sociedade ideal, que ao invés de trazer paz e evolução material e espiritual, traz guerras, escravidão e destruição dos valores éticos e morais, tudo isso pela existência de nossos dois cérebros. O primeiro o cérebro localizado na caixa craniana, o mais conhecido, o que trabalha com os dados racionais, da verdade e produz os diagnósticos corretos; o segundo cérebro, recém descoberto pela ciência, é o intestino, o órgão responsável por captar os elementos básicos para a sobrevivência, alimentos que irão nutrir todo o corpo, incluindo o próprio cérebro. Passamos a entender, dessa forma, porque o primeiro cérebro fica ameaçado de sobreviver e termina por fazer diagnósticos incorretos para quem ver de fora, mas corretos para ele, primeiro cérebro, que quer sobreviver. Portanto, podemos imaginar que é quase impossível um irmão nosso que vive na ignorância, na pobreza, ameaçado pela fome, não ver naquele que lhe traz uma esmola, uma bolsa, como um pai, um santo, um salvador. Essa é a grande estratégia dos modernistas, socialistas e comunistas, defender a pobreza, a ignorância e não deixar nunca ela acabar.



Publicado por Sióstio de Lapa em 26/11/2023 às 00h01


Imagem de cabeçalho: Sergiu Bacioiu/flickr