Mikail Naaimé, pensador e escritor das letras árabes, escreveu certa vez: “Para os burros, a voz mais melodiosa é ornejo do burro”.
Fiquei a refletir sobre a aplicação dessa frase para a situação que vivemos no Brasil. Qual o significado de “burro” quando aplicado às nossas relações sociais? “Indivíduo ignorante, estúpido, sem inteligência, de natureza obstinada, símbolo da estupidez”.
Verificamos com bastante clareza a ação perversa de um gestor público que dirige a nossa nação, que se orgulha de não gostar de livros e que menospreza quem fez carreira acadêmica, e prefere jogar toda sua energia na carreira política.
Dentro desse perfil, podemos considera-lo como “burro”? Se considerarmos sua ignorância em uma carreira acadêmica por mínima que seja, sim!
Mas se considerarmos a estupidez, a falta de inteligência, de discernimento, não!
Ele tem a inteligência bem aguçada para perseguir os seus ideais, com um bom discernimento de quem pode ajudar para ele atingir as suas metas. Este é o ponto de grande sucesso dele. Saber discernir do comportamento das pessoas ao redor quem não possui bons critérios éticos e morais e que podem ser cooptados para os seus interesses à custa de uma boa recompensa ou promessa disso.
Aqui observamos a “queda-de-braço” que ele fazia desde os tempos de sindicalista, travando com sua inteligência o embate com a inteligência de todos ao redor, conseguindo ampliar cada vez mais o seu campo de atuação, colocando sempre argumentos corretos para vencer a disputa, mesmo que a narrativa que construísse não correspondesse à realidade. Conseguia discernir naquelas pessoas mais próximas quais tinham o menor critério ético, a maior sanha egoísta e que tivessem coragem de assumir como delas as falsas narrativas, consciente ou inconscientemente.
Nesse embate de inteligência teve um sucesso tão estrondoso que chegou a ocupar por três vezes a presidência da República. Podemos chamar uma pessoa dessa de “burro”, baseado na inteligência? Uma pessoa que colocou sob sua liderança outras pessoas de alta expressão acadêmica, jurista, parlamentar e até eclesiástica? Uma pessoa que aparelhou instituições e dilapidou os recursos financeiros da nação? Uma pessoa que emergiu da pobreza de forma meteórica se tornando milionário com sua parentela, com presentes e outras fontes de renda lícitas e ilícitas? Não é um “burro” e sim um gênio!
O que devemos considerar agora é a nossa condição: será que neste contexto os “burros” somos nós? Que colaboramos com nossas atitudes, suor e lágrimas para esse enriquecimento ilícito e poderio sem ética? Será que não conseguimos fazer o correto discernimento do que acontece e rejeitar as falsas narrativas?
Este é o nosso grande teste cognitivo, individual e coletivo. Isso extrapola o campo da inteligência e vai até os princípios éticos e morais que possuímos dentro da personalidade, das intenções e motivações. Se este cabedal cognitivo sintoniza com as falsas narrativas e com o que elas podem oferecer, não vai haver mudança.
Acontece que fomos criados por Deus com uma natureza animal, mas que foi animada pelo Seu hálito, para que essa espiritualidade divina consiga superar a animalidade egoísta.
Assim, observamos que hoje, a grande maioria de nossa gente desperta da hipnose das falsas narrativas e enche as ruas de todo o país, de forma pacífica, pedindo e exigindo para que os princípios éticos sejam respeitados, mesmo com todo tipo de ameaças, perseguições e punições que somos submetidos. Esta é a prova de que também não somos “burros”.
Mas existem muitas pessoas que não conseguem fazer o correto discernimento ou que evitam confrontar a realidade com suas crenças e gerar a dissonância cognitiva, que a iria fazer sofrer. São essas pessoas que ainda continuam a perceber a voz melodiosa, o ornejo do que hoje consideramos “burro”, não com base em sua inteligência, mas com base na incapacidade de discernir a importância do caminho da verdade, da justiça, da solidariedade, que leva à família universal, ao Reino de Deus.