Podemos considerar o conflito da sede provisória para a AMA-PM, que aconteceu na tentativa de recuperarmos uma casa abandonada, como o nosso batismo de Fé frente ao Pai. Deixamos os sentimentos de humildade, perdão, tolerância e amor lavarem as nossas cabeças, como as águas do Rio Jordão colocadas por João Batista sobre a cabeça de Jesus, que também com humildade se deixou batizar por uma pessoa mais simples, com o objetivo de cumprir a Lei. A partir daí o Pai viu a capacidade do filho Jesus em fazer a Sua vontade, da mesma forma que Ele nos viu capacitados para fazer aqui na Praia do Meio a Sua vontade, e assim, o que Ele disse para Jesus naquele momento, também se aplica a nós: ESTES SÃO MEUS FILHOS AMADOS NOS QUAIS ME COMPRAZO.
Mas existe um relato no meio do apostolado do Cristo que faz a gente entender o que o Mestre espera de nós. Vejamos...
As primeiras peregrinações do Cristo e de seus discípulos, em torno do lago de Genesaré, alcançou grande triunfo. Eram doentes atribulados que agradeciam o alívio, trabalhadores humildes que se enchiam de consolação.
Aquelas atividades começaram a despertar a reação de judeus que viam em Jesus um perigoso revolucionário. Foi assim que na viagem do Mestre a Nazaré, sua terra, houve grande dificuldade com os adversários que tentavam desmoralizá-lo e até apedreja-lo.
Jesus sentiu de perto a delicadeza da situação com esses inimigos gratuitos de sua doutrina, mas aproveitou todas as oportunidades para dar as melhores reflexões à base de ensinamentos, mas o mesmo não aconteceu com Filipe e Simão Pedro. Eles queriam que houvesse protestos, debates públicos, mostrar a superioridade do Messias em confronto com os velhos testamentos. Jesus compreendeu os acontecimentos e, calmamente, ordenou a retirada, afastando-se da cidade com tranquilo sorriso.
Passado alguns dias, aproveitando uma oportunidade Pedro e Filipe procuraram falar com o Senhor:
- Mestre, chamaram o senhor de servo de Satanás e reagimos prontamente. Observamos que o Senhor mesmo não fez nenhuma oposição à injúria, mas revidamos aos ataques com a maior força de nossas expressões.
Jesus percebeu o calor daquelas afirmativas e com doce placidez no olhar profundo, interrogou: - Acaso poderemos colher uvas nos espinheiros? De modo algum me empenharia numa contradita estéril aos meus opositores. Contudo, procurei ensinar que a melhor réplica é sempre a do nosso próprio trabalho, do esforço útil que nos seja possível. Nesse particular, não deixei de operar na minha esfera de ação, de modo a produzir resultados a nossa excursão à cidade vizinha, tornando-a proveitosa, sem evitar as palavras construtivas no momento oportuno. De que serviriam as longas discussões públicas cheias de injúrias e zombarias? Ao término de todas elas, teríamos apenas menores probabilidades para o triunfo glorioso do amor e maiores motivos para a separatividade e odiosas desavenças. Só devemos dizer aquilo que o coração pode testificar mediante atos sinceros, porque de outra forma, as afirmações são simples ruído sonoro de uma caixa vazia.
- Mestre – atalhou Filipe, quase com mágoa – a verdade é que a maioria de quantos compareceram às pregações de Nazaré falava mal de vós!
- Mas não será vaidade exigirmos que toda gente faça de nossa personalidade elevado conceito? – interrogou Jesus com energia e serenidade – Nas ilusões que as criaturas inventaram para a sua própria vida, nem sempre constitui bom atestado da nossa conduta o falarem todos bem de nós, indistintamente. Agradar a todos é marchar pelo caminho largo, onde estão as mentiras da convenção. Servir a Deus é tarefa que deve estar acima de tudo e, por vezes, nesse serviço divino, é natural que desagrademos aos mesquinhos interesses humanos. Filipe, sabes de algum emissário de Deus que fosse bem apreciado no seu tempo? Todos os portadores da Verdade do Céu são incompreendidos de seus contemporâneos. Portanto, é indispensável consideremos que o conceito justo é respeitável, mas, antes dele, necessitamos obter a aprovação legítima da consciência, dentro de nossa lealdade para com Deus. Em toda circunstância, convém que se diga o necessário, mas que não se perca tempo.
Deixando transparecer que as elucidações não lhe satisfaziam plenamente, perguntou Filipe: - Senhor, vossos esclarecimentos são indiscutíveis, entretanto, preciso dizer que alguns dos companheiros se revelaram insuportáveis nessa viagem a Nazaré: uns me acusaram de brigão e desordeiro; outros de mal entendedor de vossos ensinamentos. Se os próprios irmãos da comunidade apresentam essas falhas, como há de ser o futuro do Evangelho?
O Mestre refletiu um momento e retrucou: - Estas são perguntas que cada discípulo deve fazer a si mesmo. Mas com respeito a comunidade, Filipe, pelo que me compete esclarecer, cumpre-me perguntar-te se já edificaste o Reino de Deus no íntimo do teu espírito.
- É verdade que ainda não – respondeu, hesitante, o apóstolo.
- De dentro dessa realidade, disse o Cristo, podes observar que se nosso colégio fosse constituído de irmãos perfeitos, não teria necessidade de repreensão pela adesão de um amigo que ainda não houvesse conquistado a divina edificação. O que é indispensável é nunca perdermos de vista o nosso trabalho, sabendo perdoar com verdadeira espontaneidade de coração. Se nos labores da vida um companheiro nos parece insuportável, é possível que também algumas vezes sejamos considerados assim. Temos de perdoar aos adversários, trabalhar pelo bem dos nossos inimigos, auxiliar os que zombam de nossa fé.
Nesse ponto de suas afirmativas, Pedro atalhou-o, dizendo: - Mas, para perdoar não devemos aguardar que o inimigo se arrependa? E que fazer, na hipótese de o malfeitor assumir a atitude dos lobos sob a pele da ovelha?
- Pedro, o perdão não exclui a necessidade da vigilância, como o amor não prescinde da verdade. A paz é um patrimônio que cada coração está obrigado a defender, para bem trabalhar no serviço divino que lhe foi confiado. Se nosso irmão se arrepende e procura o nosso auxílio fraterno, amparemo-lo com as energias que possamos despender, mas, em nenhuma circunstância cogites de saber se o teu irmão está arrependido. Esquece o mal e trabalha pelo bem. Quando ensinei que cada homem deve conciliar-se depressa com o adversário, busquei salientar que ninguém pode ir a Deus com um sentimento de odiosidade no coração. Não poderemos saber se o nosso adversário está disposto à reconciliação; todavia, podemos garantir que nada se fará sem a nossa boa vontade e pleno esquecimento dos males recebidos. Se o irmão infeliz se arrepender, estejamos sempre dispostos a ampará-lo e, a todo momento, precisamos e devemos esquecer o mal.
Foi quando Simão Pedro fez sua célebre pergunta: - Senhor, quantas vezes pecará meu irmão contra mim, que hei de perdoar? Será até sete vezes?
Jesus respondeu calmamente:- Não te digo sete vezes, mais setenta vezes sete.
Daí por diante, o Mestre sempre aproveitou as menores oportunidades para ensinar a necessidade do perdão recíproco entre os homens, na obra sublime da redenção. Acusado de feiticeiro, servo de Satanás, de conspirador, Jesus demonstrou em todas as ocasiões, o máximo de boa vontade com os espíritos mais rasteiros do seu tempo. Sem desprezar a boa palavra, no instante oportuno, trabalhou todas as horas pela vitória do amor, com o mais alto idealismo construtivo. E no dia inesquecível do Calvário, em frente dos seus perseguidores e verdugos, revelando aos homens ser indispensável a imediata reconciliação entre o espírito e a harmonia da vida, foram estas as suas últimas palavras – “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem!...”.