Sióstio de Lapa
Pensamentos e Sentimentos
Meu Diário
06/07/2025 00h01
KARL MARX – 2a. PARTE

            Seguindo neste a segunda parte da resenha que foi iniciada no dia anterior.



Marx, na acepção de Johnson, “é um escritor escatológico do começo ao fim. É digno de nota, por exemplo, que no projeto original de ‘A Ideologia Alemã’ (1845-1846) ele tenha incluído uma passagem que lembra bastante seus poemas a respeito do ‘Dia do Juízo’: ‘Quando os reflexos das cidades em chamas forem vistos nos céus (…) e quando as harmonias celestiais consistirem das melodias da ‘Marseillaise’ e da ‘Carmagnole’, tendo como acompanhamento canhões ribombantes, enquanto a guilhotina marca o tempo e as massas inflamadas gritam ‘Ça ira, ça ira’, e a autoconsciência está pendurada no poste de luz’”.



O que importa reter, segundo Johnson, “é que a ideia de Marx de um ‘dia do juízo’, tanto em sua lúgubre versão poética quanto, por fim, em sua versão econômica, representa uma visão artística, e não científica. Essa ideia sempre esteve na cabeça de Marx e, como um economista político, ele trabalhou a partir dela mas voltado para a frente, partindo de dados examinados objetivamente. E é claro que é o elemento poético que empresta à projeção histórica de Marx seu efeito dramático e de fascinação sobre os leitores radicais, que querem acreditar que a morte e o julgamento do capitalismo se aproximam. O talento poético se manifesta de forma intermitente nas páginas de Marx, criando algumas passagens memoráveis. No sentido de que ele intuía mais do que deduzia ou calculava, Marx até o fim continuou sendo um poeta”.



Mas, além de poeta, rico em formular imagens, Marx foi jornalista. E dos bons, reconhece Johnson. “Marx achava não apenas difícil mas impossível planejar um livro grande — quanto mais escrevê-lo: mesmo ‘O Capital’ se constitui de uma série de ensaios aglutinados sem nenhuma ordem real. Porém, ele se sentia bem escrevendo textos curtos, penetrantes, reações opinativas no momento em que os acontecimentos se davam.”



Para Johnson, o maior talento de Marx era como jornalista polêmico. “Utilizava epigramas e aforismos de forma brilhante, embora muitos não tivessem sido inventados por ele. Marat criou as frases: ‘Os trabalhadores não possuem uma pátria’ e ‘Os proletários não têm nada a perder a não ser suas correntes’. A famosa piada da burguesia usando brasões feudais em seus traseiros se deve a Heine, assim como ‘A religião é o ópio do povo’. Louis Blanc inventou: ‘De cada um, segundo sua capacidade, para cada um, segundo sua necessidade’. De Karl Schapper, tirou: ‘Trabalhadores de todo o mundo, uni-vos!’, e de Blanqui: ‘A ditadura do proletariado’.”



Johnson defende a tese de que “foi o olho jornalístico de Marx para o texto lacônico, para a frase incisiva que, mais do que qualquer outra coisa, salvou do esquecimento toda a sua filosofia no último quarto do século 19”.



O crítico examina também o Marx moralista: “Do mesmo modo que a origem da filosofia marxista se assenta numa visão poética, a elaboração dessa filosofia foi um exercício de retórica acadêmica. Entretanto, o que Marx necessitava para pôr em movimento sua maquinaria intelectual era de um estímulo moral. Ele o encontrou, em seu ódio à usura e aos agiotas, um sentimento violento relacionado diretamente com suas próprias dificuldades financeiras”. Parte dos discípulos de Marx era antissemita — como ele próprio, mesmo sendo de origem judaica.



Como pesquisador, segundo Johnson, Marx não gostava de examinar problemas reais diretamente. “O tipo de informação que não interessava a Marx era aquele a ser obtido a partir do exame, com seus próprios olhos e ouvidos, do mundo e das pessoas que nele vivem. Ele era, total e incorrigivelmente, restrito a sua escrivaninha. (…) Marx escreveu sobre finanças e indústria durante toda a vida, mas só conheceu duas pessoas ligadas aos sistemas financeiro e industrial, seu tio Lion Philips e Engels. (…) Mas Marx recusou um convite de Engels para acompanhá-lo na visita a uma fiação, e, até onde sabemos, Marx nunca esteve, durante toda a sua vida, numa manufatura, numa fábrica, numa mina ou em qualquer outro local de trabalho industrial.”



Marx não gostava de trabalhadores, segundo Johnson. “Marx sempre preferiu se ligar a intelectuais da classe média como ele próprio. Quando ele e Engels fundaram a Liga Comunista e, de novo, quando formaram a Internacional, Marx se certificou de que os socialistas que eram da classe trabalhadora fossem afastados de qualquer posto de influência e fizessem parte de comissões meramente como proletários regidos por um estatuto. A razão para isso era, em parte, um esnobismo intelectual e, em parte, porque os homens com experiência real das condições numa fábrica costumavam ser contra o uso da violência e a favor das melhorias simples e progressivas: eles eram inteligentemente incrédulos quanto à revolução apocalíptica que ele afirmava ser não apenas necessária mas inevitável.”



Certamente a grande maioria dos marxistas não conhece esses detalhes ligados à vida real que o seu ídolo levava. Poderiam cultuá-lo como ídolo se soubessem da realidade? Somente o desenvolver da resolução com a dissonância cognitiva será capaz de mostrar.


Publicado por Sióstio de Lapa
em 06/07/2025 às 00h01