Uma nova modalidade de negócios começa a tomar corpo a partir dos Estados Unidos: o sistema de Marketing Multinível, uma forma de negócios baseado nos relacionamentos que a pessoa tenha ou que possa construir. O princípio é o de redução de custos, da fabricação do produto até o consumidor eliminando uma serie de intermediários. Os gastos com essa transferência passam a remunerar os agentes que participam do negócio, de forma meritocrática. Quem deseja crescer no negócio e alcançar os mais altos postos, deve mergulhar de cabeça no trabalho de construção da rede de relacionamentos, onde cada consumo patrocinado por essa pessoa retorna o determinado percentual que aumenta os seus rendimentos.
Não tenho interesse em ser milionário como os patrocinadores costumam dizer em suas apresentações, mas, como terapeuta que tem contato com muitas pessoas com dificuldades financeiras, até mesmo no círculo familiar, vejo como uma boa opção para quem está desempregado e espera uma oportunidade de emprego.
A forma de ingresso nesse tipo de trabalho não exige altos custos, com um pequeno esforço da família o cadastro pode ser feito e a pessoa já pode cair em campo. A nível familiar isso pode ser melhor desenvolvido, pela confiança que é melhor alcançada. À nível de pacientes isso fica mais complicado, pois apesar de possuírem algum tipo de transtorno mental, tem mais dificuldade de levantar o dinheiro necessário, mesmo que pouco.
Vencido essa primeira fase deve ser feito um bom acompanhamento. Mesmo que não haja de imediato um retorno financeiro, esse acompanhamento para ensinar o negócio e o esforço para criar novos relacionamentos, oferece um bom campo de terapia, que pode até substituir a parte farmacológica ou psicoterapêutica.
O que deve ser mais difícil para mim é a parte do tempo, pois já tenho diversos envolvimentos em outras ações que estão se desenvolvendo, a nível profissional, educativo e assistência psiquiátrica, a nível comunitário e à nível espiritual. Mas tudo pode estar no contexto espiritual, pois o Marketing Multinível tem a característica de ajudar ao outro, principalmente aquele que tem mais dificuldades. Essa tarefa tem sintonia com o trabalho que deveremos ter para a construção do Reino de Deus, pois aí teremos que ampliar os nossos relacionamentos com base no Amor Incondicional que estará acima dos interesses egoístas da nossa natureza animal.
No estudo espiritual realizado na Associação Médica, a discussão maior foi sobre o meu comportamento, se estava seguindo os critérios cristãos. Durante a leitura do texto foi encontrado o seguinte: “O espírito para trabalhar por sua depuração, deve reprimir as más tendências, vencer as paixões, vendo as vantagens no futuro; para se identificar com a vida futura, devemos para ela dirigir nossas aspirações e preferi-las à vida terrestre; é preciso não só nela crer, mas compreender; é preciso representa-la sob um aspecto satisfatório para a razão, em completo acordo com a lógica, o bom senso e a ideia que se faz da grandeza, da bondade e da justiça de Deus”.
Com a reflexão sobre o texto, coloquei como exemplo a minha decisão de mudar a minha forma de considerar o exclusivismo afetivo e sexual que caracteriza o casamento. Mostrei que apesar da minha firme decisão ao casar, de manter a fidelidade conjugal, passei a sofrer convites para envolvimento sexual fora do casamento. Era uma colega de trabalho, que durante os meus plantões enquanto acadêmico de medicina, fazia os seus convites para sairmos qualquer dia e realizar uma transa sexual. Ela era uma pessoa sensual, casada tanto quanto eu, e ambos sabíamos que seria uma ação que teria efeitos só para nós, iriamos ter um prazer sexual que não deveria importar a terceiros. Eu resistia, pois estava convicto que isso era um erro, eu estava comprometido com a promessa de fidelidade conjugal, eu deveria me envolver sexualmente apenas com minha esposa. Acontece que os constantes convites despertavam cada vez mais os meus desejos, ativava os meus instintos de reprodução, que eu poderia caracterizar como as “más tendências”. Porém, entrou nas minhas racionalizações os conceitos do Amor Incondicional, as lições do Mestre Jesus, de fazer ao próximo aquilo que desejaríamos para nós. Eu tinha ao lado o meu próximo mais próximo, uma mulher sensual que desejava fazer sexo comigo. Dentro desse contexto não haveria problema de sair com ela, pois eu também desejava que isso acontecesse. O impedimento para que isso acontecesse, era a existência da minha esposa e do marido da minha colega. Acontece, que pelo que ela relatava, o marido costumava ter suas experiências extraconjugais. Eu seria um elemento de trazer justiça para ela. Mas, com a minha esposa era diferente, ela nunca teve outra experiência sexual e seguia com rigidez o compromisso de fidelidade conjugal prometido diante do altar. A minha lógica dizia que eu não podia me permitir sair com minha colega, já que minha esposa cumpria a promessa feita e eu esperava isso dela. Foi essa amarração entre mim e minha esposa que constituía o obstáculo para eu sair com minha colega. Mas o desejo cada vez ficava mais forte e a racionalização apontava que a minha esposa era o obstáculo, pois representava o compromisso que assumimos.
Fiquei me sentindo prisioneiro dentro de uma gaiola que eu mesmo construíra e que a minha esposa era a carcereira dessa condição. Senti que o meu sentimento de adaptação e harmonia conjugal ia se deteriorando cada vez mais. Eu procurava manter as aparências de uma vida tranquila, mas cada vez o esforço era maior. Previa que isso estava deteriorando o meu casamento, e que não bastava eu renegar esse desejo que foi formado. Isso iria ficar na minha memória, outros desejos iriam surgir, outras lutas iriam ser feitas e o meu sonho de viver feliz com minha esposa até o fim da vida, estava ruindo. Não era culpa dela nem minha, eu concluía. Tudo surgiu dentro de uma naturalidade, dentro de uma constituição biológica que o Pai construiu para nós.
Percebi que, para manter o meu casamento com a mesma qualidade afetiva, eu teria que quebrar os meus preconceitos machistas e dar a minha esposa o mesmo direito que eu desejava ter agora, experiências extraconjugais. Se eu desse esse direito a ela, então quebraria a barreira que impedia de sair com minha colega. O desejo tão forte que eu passei a ter por ela fez com que eu quebrasse na minha consciência o impedimento que minha esposa nutria da fidelidade e exclusivismo sexual. Pensando assim, sai com a minha colega algumas vezes, o que me trouxe muito prazer. Não havia culpa nem para mim, nem para ela. Ela estava fazendo justamente o que seu marido fazia; eu estava fazendo o que minha esposa também teria o direito de fazer quando a ocasião chegasse e ela assim desejasse.
Mesmo sem ninguém saber disso, inclusive a minha esposa, o meu casamento deixava de ser fechado, exclusivista, para ser aberto. Voltei a ter a mesma alegria de antes no casamento, mesmo sabendo que um dia teria que dizer a minha esposa da minha transformação.
Nesse ponto fica colocada a questão: sofri o arrastamento das más tendências e pequei contra a lei de Deus? Ou obedeci a Lei do Amor, deixando fluir afetos íntimos com o próximo, abrindo a perspectiva da inclusão de um amor mais especial?
Essa retomada de posição fez uma reviravolta na minha vida, passei a viver em sociedade dentro de uma cultura que defende o amor exclusivo nas relações conjugais, mas que na verdade praticam as relações extraconjugais de forma escondida, se mantem sobre o manto da mentira. A minha forma de viver, apesar de tão destoante da cultura está envolta no manto da verdade. Vivo assim até hoje, mesmo sendo criticado por tantos que dizem que estou equivocado, que não estou fazendo a vontade de Deus como eu imagino estar fazendo. Não tenho como provar com minhas pobres argumentações que eu estou certo, mesmo porque eu posso realmente estar errado, e todos os críticos estarem certos. Mas estou pronto para ser julgado pela justiça divina, que sei que é incorruptível e que estou pronto para reparar o mal que eu sem querer possa ter causado, como é dito no sentido final das críticas.
Estou afundando, perdendo a consciência num copo de bebida alcoólica. Sinto que vou morrer afogado, não tenho mais forças para resistir a tamanha atração que arrebata a minha alma sob os desejos da carne, a compulsão por mais um gole que anestesie os meus tormentos. Quando a minha consciência sobe à superfície por um momento, que vejo a destruição ao meu redor, tudo que fiz e continuo fazendo de errado, vem uma vontade de deixar essa existência tão triste, onde me vejo algemado a uma garrafa de bebida alcoólica. Passo a pensar no suicídio, não vejo outra solução. Sei que muitas pessoas como eu encontraram essa solução para sair desse aperto.
Fui na sala de Alcoólicos Anônimos, os colegas que foram falar na cabeceira de mesa mostraram que eram impotentes frente ao álcool. Reconheci que não era diferente deles, também sou impotente frente ao álcool. É ele que está me levando cada vez mais ao fundo do poço. Não tenho forças para resistir a esse arrastamento que consome o meu corpo e minha alma como areia movediça: quanto mais me debato querendo sair, mas afundo na lama. Não tenho nenhum ponto de apoio no qual possa me sustentar, possa fazer força e sair. Minha família não acredita em mim, meus colegas de trabalho se afastaram, restam apenas os amigos de copo, que como eu, também estão sendo arrastados na mesma areia movediça.
Mas alguém me fala de um Poder Superior, uma forma de encontro com Deus da maneira que eu possa imaginar. Dizem que somente um Poder Superior poderá me livrar dessa obsessão que torna minha vida ingovernável. Não acredito que exista um Deus capaz de tamanho milagre. Recuso-me a ser enganado. Mas, eu vivo dentro de um engano. Vivo dentro de um redemoinho que eu mesmo construí e que suga a minha vida. Agora chega perto de minha consciência uma ajuda que poderá me livrar dessa agonia, e eu recuso pois tem um nome que nunca respeitei, nunca dei crédito na sua existência.
Por que não me agarro a esse tipo de salva-vidas que alguém me atirou? Só porque tem o nome de um Poder Superior que eu não consigo ver, medir ou pesar? Mas também não consigo ver, medir ou pesar essa obsessão pelo álcool e que destrói a minha vida. Porque não posso aceitar essa sugestão, mesmo que seja só para experimentar um pouquinho de sua realidade? Porque não deixo à minha mente aberta para a possibilidade de um milagre acontecer na minha vida? Afinal, a ciência aceita a existência dos milagres, dos fatos que acontecem e que ela não consegue provar ou explicar.
Vejo ao redor, na sala de AA, tantos exemplos desse milagre, e todos tiveram a ajuda desse Poder Superior. Porque somente eu deva ser melhor ou pior do que eles e não ser alcançado por esse milagre? Devo parar de lutar com a minha descrença. Não posso acreditar em Deus e desafiá-lo ao mesmo tempo. Acreditar significa confiar e não desafiar. Porque não considerar nos companheiros abençoados pelo milagre da abstinência o refúgio da minha fé? Talvez dentro dessa sala, frequentando, aprendendo e servindo, a minha fé se amplie. Talvez eu chegue a ver o rosto de Deus, algum dia quando cansado de servir ao próximo, quando muitas almas eu tiver ajudado a sair do desespero contando a minha história e estendendo a minha mão, quando eu fitar com meus olhos umedecidos pela fé, o meu próprio espelho.
Bom dia amigos.
Quero agradecer ao Poder Superior mais um dia de existência e a oportunidade estar aqui, no meio de vocês, sendo convidado para dizer algumas poucas palavras neste importante evento comemorativo de 43 anos de existência de AA no Rio Grande do Norte. Agradeço a acolhida de vocês à minha participação enquanto técnico, pois muito aprendi sobre uma das doenças mais terríveis da humanidade: o alcoolismo. Uma doença que os bancos da academia não ensinam como melhor abordar a questão, como melhor orientar ao alcoólico que se encontra mergulhado nos miasmas da embriagues.
Confesso que o AA me ensinou a descobrir o ser humano que existe sob a pele do famigerado alcoólico, ser desprezível que não escuta nem respeita amigos ou parentes, que abandona o trabalho e as responsabilidades do lar, da ética e do respeito ao Criador, e destrói a cada dia o melhor presente que o seu espírito recebeu: um corpo físico.
Este ser humano que se tornou alcoólico, pode chegar ao meu consultório ou receber minha visita dentro de uma enfermaria de hospital psiquiátrico, mas sem reconhecer que é portador dessa doença, não ver o prejuízo que está causando a sua vida e de quem esteja por perto na convivência. A minha fala, os comprimidos que eu possa prescrever para conter os sintomas que afetam a sua existência, não conseguem chegar ao núcleo da sua mente e dissolver o forte desejo que impede o juízo crítico de perceber o dramático de sua situação. Sou uma figura apenas paliativa, um médico que diz palavras de orientação, de advertência, às vezes com palavras duras, mas que não conseguem deter a atenção do alcoólico no ponto que ele mais está comprometido: a intenção de continuar bebendo da forma que ele deseja.
Fiquei muitas vezes frustrado, sentindo-me incompetente por não conseguir retirar o paciente dos laços dessa doença, nem mesmo de faze-lo reconhecer que é portador de tal patologia mental. Uma patologia que matava lentamente o meu paciente, ou as vezes de forma imediata, através do suicídio, de um acidente, de uma briga, de um acometimento fatal num órgão vital como o fígado, coração ou pâncreas.
Foi em tais circunstâncias que vim a conhecer a Irmandade de Alcoólicos Anônimos. Estudei a sua literatura e vi a importância da sua existência para o enfrentamento do alcoolismo, a doença invisível que mata lentamente a pessoa, destruindo todos os seus valores éticos e morais, atingindo inclusive seus familiares. Aprendi a falar, a convite, na cabeceira de mesa, sobre os meus conhecimentos técnicos, como médico psiquiatra, e como é importante o trabalho de AA para ajudar o alcoólico na ativa. Reconheci algo que na academia não ensinaram, da importância do Poder Superior, de Deus da forma que o entendemos, em nossa vida e principalmente na nossa recuperação. É ele que nos dá a força, conforme diz o segundo passo, para resistir ao forte desejo que habita dentro da minha mente, que está sedento pelo primeiro gole, pois é daí que vem tantos outros goles.
Hoje estou muito feliz, por ver este auditório cheio de doentes saudáveis. Pessoas que mantém a sua doença sob o controle dado por essa consciência coletiva que se manifesta aqui e agora e que se replica a cada momento, a cada dia, em praticamente todos os bairros da capital, todos os municípios do estado, todos os estados do pais, todos os países do nosso planeta.
Não sou alcoólico, mas quero agradecer profundamente a todos vocês, à Irmandade, por me reconhecer como membro, por ter me dado uma opção de vida que posso oferecer aos meus pacientes, a ser um profissional mais competente naquilo que digo e que faço, e por saber que o meu paciente pode encontrar bem perto dele, uma sala aberta que o receberá de braços afetuosos, sem preconceitos, que oferecerá um cafezinho, um local acolhedor para sentar e ouvirá de cada um que for à cabeceira da mesa histórias muito parecidas com a sua. Sentirá que naquele dia, naquele local, com aquelas pessoas, ele é a pessoa mais importante.
Muito obrigado pela atenção.
Hoje, domingo, é o dia que a Igreja Católica comemora como sendo da Assunção de Nossa Senhora. Chegou à minha mente mais uma intuição de fazer mais um trabalho: diário do pastoreio. Tenho a firme convicção de fazer a vontade do Pai, assim como Ele a coloca em minha consciência, seguindo as orientações de Jesus Cristo, o filho mais evoluído do Pai, que serve como modelo para nosso comportamento. Nossa Senhora, a Sua mãe e a nossa, deve ter influenciado para que essa intuição chegasse até minha consciência, pois este é um dia dedicado a ela.
Como estou cercado de pessoas que passam por muitas dificuldades, de todos os níveis de gravidade, como tenho uma formação técnica capacitada para ajudar como profissional e como irmão, sinto que o Pai me enche de tarefas das quais não posso dizer “não”, apenas tendo o cuidado de manter as ideias em funcionamento, mesmo que seja com a ajuda de outras pessoas.
Esta intuição que veio agora foi a de organizar as ideias em outro bloco de anotações, com as atividades práticas que devo realizar em torno das diversas necessidades que forem surgindo à minha frente. Tive a visão de um pastor que tem a obrigação de cuidar de suas ovelhas, lembrando da lição que Jesus nos deixou. Sei que sou uma das ovelhas sob os cuidados do Bom Pastor, que é o Cristo. Sei que de suas ovelhas, algumas seguem suas orientações e se tornam mais aptas a cuidarem de suas irmãs. Considero-me uma dessas ovelhas mais estudiosas e que se capacitou a cuidar agora de suas irmãs, assumindo o papel de um monitor, uma característica de um pastor, seguindo os passos do Mestre. Espero que das ovelhas sob meus cuidados diretos, surjam aquelas mais capacitadas a desempenhar o mesmo papel que eu agora estou tentando desempenhar.
Lanço um olhar pelo campo onde se espalham as minhas ovelhas e distingo alguns setores em particular, onde uns podem se desdobrar dentro de outros. O setor da minha família nuclear caracterizada pelas mulheres com as quais tive relacionamentos íntimos, principalmente com aquelas que germinaram sementes; o setor da família consanguínea; o setor da família Vital; o setor da comunidade; o setor da psiquiatria; o setor da espiritualidade; o setor da mútua ajuda. É bom lembrar que essa indicação de Pastor, não quer dizer que eu esteja num patamar muito superior ao das ovelhas. Eu também sou uma ovelha e também necessitado de ajuda, de compreensão, de perdão para meus erros. Porém, como muito já me foi ofertado, e como muito eu já absorvi, então tenho que ter a responsabilidade de muito ter de colaborar, pois o que de graça se recebe do Pai, de graça devo devolver aos meus irmãos mais necessitados, não importa as motivações de natureza animal que possam existir. Os valores espirituais sempre devem ter a primazia, ser hierarquicamente superior e comandar as ações no cotidiano.
Hoje fui ao setor da Mútua Ajuda, fui ao Seminário de Alcoólicos Anônimos que comemora 43 anos de existência em nosso estado, Rio Grande do Norte. Encontrei muitos alcoólicos em recuperação, velhos conhecidos, que me cumprimentaram com grande alegria. Expliquei a alguns que estava trabalhando no grupo de alcoólicos de Ceará-Mirim, que estava na companhia de José Maria que ingressou no AA e se encontra em abstinência há 2 meses. Conversei com duas senhoras, Conceição e Socorro, que fazem parte do Al-Anon de Ceará-Mirim, funcionando na mesma sala do AA nas quintas feiras, e disse que estaria encaminhado familiares de alcoólicos.